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País não terá risco eleitoral em 2010, diz presidente do Itaú
Para Setubal, Brasil adquiriu nível alto de maturidade política e de equilíbrio econômico e não há hipótese de reviver 2002
Banqueiro afirma que
sucesso de ações na Justiça
contra planos econômicos
poderia criar uma caixa de
Pandora para a economia
DA REPORTAGEM LOCAL
Para o banqueiro Roberto
Setubal, presidente-executivo
do Itau Unibanco, o mercado financeiro não vê nenhum risco
nas eleições presidenciais do
ano que vem.
"O Brasil adquiriu um nível
alto de maturidade política e de
equilíbrio econômico."
Sobre uma eventual disputa
para a Presidência entre o governador José Serra e a ministra Dilma Rousseff, afirmou:
"Os dois têm a mesma qualidade de serem firmes em suas
convicções e seus credos".
Leia a seguir continuação da
entrevista:
FOLHA - O crédito vai voltar?
ROBERTO SETUBAL - Este tem sido
um ano muito ruim para o crédito em todos os aspectos. Os
volumes não estão crescendo
como anteriormente, o que não
é bom para o mercado financeiro, para os bancos e para o crescimento. A inadimplência está
muito alta. Estamos batendo os
picos históricos de inadimplência. Já há algum sinal de melhoria, mas as perdas são grandes.
FOLHA - O índice de cheques sem
fundos caiu 20% em junho. A inadimplência está em queda?
SETUBAL - Cheques são hoje
pouco representativos dos
meios de pagamento. Quando
nos baseamos nos volumes de
provisões dos bancos, nos índices de atraso e nos dados da Serasa, consideramos os indicadores muito altos e negativos. O
lado positivo é que, à medida
que a economia começa a se recuperar, esse problema todo
tende a reverter.
FOLHA - O pior já passou?
SETUBAL - Estamos provavelmente passando pelo pico da
inadimplência neste momento.
O nível deve cair daqui para a
frente. Todos os fatores são favoráveis: a Selic está mais baixa, há normalmente mais atividade econômica no segundo semestre e o nível de demanda de
crédito, outro fator importante
da ativação da economia, já começa a subir.
FOLHA - O BC chegou ao piso no
movimento de redução da Selic?
SETUBAL - Eu diria que está perto do piso neste momento. Mas,
mais para a frente, em se mantendo as mesmas políticas que
nos trouxeram até aqui, acho
que iremos ver uma Selic mais
baixa. Não imediatamente. Talvez no ano que vem ou em 2011.
FOLHA - Se a Selic chegou ao piso,
as taxas finais cobradas pelos bancos não vão mais cair?
SETUBAL - Elas podem ser reduzidas muito mais à medida que
a inadimplência se reduza.
Neste momento, o maior componente do "spread" bancário é
exatamente o nível de perda. A
tendência é que os "spreads"
caiam bastante. Então as taxas
de empréstimos podem cair
mesmo tendo a taxa básica da
economia chegado ao piso.
FOLHA - O Itaú Unibanco engavetou o plano de internacionalização?
SETUBAL - No momento, estamos focados na integração dos
dois bancos [Itaú e Unibanco].
É uma operação bastante complexa, que exige uma energia
interna muito grande. Nestes
primeiros dois anos, até 2010
ou 2011, estaremos muito focados nisso. Esse período vai
combinar exatamente com o ciclo da economia mundial, que
está se recuperando. Mas temos aspirações internacionais.
O Itaú Unibanco é o candidato
natural para ser o banco mais
internacionalizado do país.
FOLHA - Houve alguma decisão
com relação ao uso das marcas Itaú
e Unibanco?
SETUBAL - Ainda estamos estudando os detalhes. Posso adiantar que vamos usar marcas
existentes nos dois conglomerados, com modificações.
FOLHA - Há no Brasil apenas seis
grandes bancos de varejo. Não é
pouco banco para tanto cliente?
SETUBAL - A tendência mundial
é grandes bancos terem uma
participação expressiva de
mercado. Isso não impede a
competição. Muito pelo contrário. Em outras indústrias, há
concentrações ainda maiores.
FOLHA - Como o senhor vê a maior
agressividade dos bancos públicos?
SETUBAL - Preocupado com a
crise, o governo procurou usar
os bancos públicos como mais
um elemento para estimular a
economia. Entendo isso como
uma medida contracíclica válida por um período. No entanto,
a longo prazo o ideal é que tudo
se faça pelas condições de mercado. É impossível imaginar
que eles possam operar de forma sustentável em condições
muito abaixo daquelas em que
o mercado opera.
FOLHA - O senhor acha que o Brasil
vive uma crise ética?
SETUBAL - O lado positivo de todos esses problemas é que eles
estão aparecendo. Ao escandalizarem a sociedade, certamente vão surtir efeito nas urnas.
FOLHA - Como o senhor vê uma
eventual disputa para a Presidência
entre o governador José Serra e a
ministra Dilma Rousseff?
SETUBAL - O Itaú sempre procurou apoiar a democracia contribuindo de forma equilibrada
para os vários candidatos. Evidentemente procuramos contribuir mais para os partidos
que partilhavam nossos ideais.
Mas de forma muito equilibrada. E exclusivamente dentro
das regras. Nunca pedimos nada em troca de contribuições.
FOLHA - Há algum risco eleitoral na
campanha de 2010?
SETUBAL - O Brasil adquiriu um
nível alto de maturidade política e de equilíbrio econômico.
Houve uma institucionalização
das políticas econômicas. Na
campanha, iremos ver algumas
diferenças mais claras. Vai ser
interessante analisar as propostas de um e de outro, mas
não há risco de revermos 2002.
FOLHA - Serra ou Dilma?
SETUBAL - Só vou dizer uma coisa: Os dois têm a mesma qualidade de serem firmes em suas
convicções e seus credos, de serem administradores com objetivos claros e muito pragmáticos em função dos benefícios
pretendidos para a população.
FOLHA - O senhor é favorável ao financiamento público de campanhas eleitorais?
SETUBAL - O problema não está
no financiamento legal de campanhas, mas no ilegal. Isso gera
os problemas a que assistimos
no Brasil nos últimos anos. É
preciso coibir a doação ilegal.
FOLHA - Bancos enfrentam mais de
700 mil ações por alegadas perdas
de correntistas com planos econômicos. Por que não ressarci-los?
SETUBAL - Questiona-se agora
se os bancos deveriam ter aplicado as regras que o governo
estipulou. Como poderíamos
ter nos recusado a cumprir ordens do governo? Poderíamos
ter sabotado o Plano Cruzado
ou o Plano Real? Além disso, os
bancos não levaram vantagem
nenhuma com os planos econômicos. Eles reduziram não
apenas o rendimento dos depósitos mas também as obrigações dos tomadores.
FOLHA - Se os bancos têm razão,
por que perderam a maioria das
ações até agora?
SETUBAL - Os bancos não souberam se comunicar com a sociedade para explicar que não
ganharam nada com os planos
econômicos e que esse equilíbrio dos balanços, entre passivo e ativo, era necessário. Confesso que não dei importância a
isso. Errei. Achava que, como
não fizemos as regras, como
não levamos vantagem, não havia nenhuma razão para que
pagássemos indenizações pelas
diretrizes dos governos. Mas isso tomou uma dimensão enorme. Estamos agora, no STF,
com uma situação delicada para o sistema financeiro como
um todo. O sucesso dessas
ações abriria uma caixa de Pandora para a economia brasileira, que lutou por tanto tempo
para se estabilizar.
FOLHA - Por quê?
SETUBAL - A questão dos poupadores vai gerar outras demandas. Os processos não vão parar
aí. Vão atingir outros tipos de
depósito. Os bancos também
vão querer cobrar de seus antigos devedores, cobrar do governo. Trabalhadores vão querer
questionar redutores salariais.
E assim por diante.
FOLHA - Os bancos não estão criando um falso risco de crise financeira
só para ganhar o processo no STF?
SETUBAL - A briga é da magnitude de R$ 200 bilhões. O cálculo
tem certa complexidade porque o Judiciário aplica regras
um pouco diferentes para cada
Estado. Dizem que os bancos
estão pagando muito menos.
Por enquanto, é verdade. Mas
unicamente porque há muitas
ações que ainda não foram julgadas. Especialmente, e aqui
vem o mais relevante, porque
as ações coletivas ainda não foram decididas. Os bancos foram condenados em ações individuais. Mas as ações coletivas
abrangem todos os poupadores
de vários Estados. Se somarmos as ações coletivas, a conta
vai ser esta: R$ 200 bilhões.
FOLHA - Como o senhor vê o banco
em dez anos?
SETUBAL - Crescendo. Sempre
que o Itaú fazia associações,
aquisições, meu pai [Olavo Setubal, patriarca da família controladora do grupo Itaú, morto
em 2008] dizia: "Qual é o limite
para o Itaú?". Eu não sabia. Dizia apenas que, enquanto tivéssemos espaço para crescer,
cresceríamos. Tenho certeza de
que o banco será maior e muito
mais internacional do que é hoje. Estará entre os maiores bancos do mundo.
(MARCIO AITH)
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