São Paulo, domingo, 26 de setembro de 2004

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COMPROMISSO

Ações que movimentam até R$ 4,7 bilhões ao ano poderiam ser deduzidas, mas viram despesas nos balanços

Empresas investem no social mesmo sem incentivos

SANDRA BALBI
DA REPORTAGEM LOCAL

A ação social das empresas vem crescendo nos últimos anos à margem dos incentivos fiscais -que são raros. É a doação pura e simples, à base do investimento privado em projetos sociais, que movimenta cerca de R$ 4,7 bilhões por ano, segundo dados colhidos em 462 mil empresas pelo Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada).
Hoje, apenas a Lei Rouanet -voltada para a área cultural- e o Estatuto da Criança e do Adolescente permitem que investimentos sociais sejam abatidos do IR. Poucas empresas, entretanto, recorrem a esses incentivos.
Os gastos com o social entram, em sua maioria, na coluna de despesas dos balanços e não são descontadas dos impostos a pagar, segundo pesquisa do Gife (Grupo de Institutos, Fundações e Empresas) - que reúne 71 empresas que desenvolvem projetos sociais.
É esse tipo de recurso que vem alimentando o prazer da leitura em pequenas cidades do interior de São Paulo, por exemplo. Um projeto da Secretaria de Estado da Cultura, iniciado em abril deste ano, visava conseguir "padrinhos" para 84 bibliotecas públicas. Já coleciona 80.
"Instalamos 24 bibliotecas em municípios com até 5.000 habitantes e as demais estão em processo", diz a secretária estadual de Cultura, Cláudia Costin.
Apesar de ser uma iniciativa na cultura, única onde há lei federal de incentivo, o projeto é feito na base da doação.
As empresas oferecem os livros, de acordo com uma lista sugerida pela secretaria, um computador e o programa para gerenciar o acervo; a prefeitura cede o local e um funcionário, e a Secretaria da Cultura treina o bibliotecário.

Crescimento
Pesquisas mostram que investimentos em projetos como esse, voltados para fora dos muros das corporações, têm crescido no país. O gasto médio anual em projetos sociais, por empresa, totaliza R$ 388,9 mil, segundo Lívio Giosa, vice-presidente do Instituto ADVB (Associação dos Dirigentes de Vendas do Brasil). O dado foi colhido nos balanços de 2.500 empresas, em pesquisa divulgada no mês passado pelo instituto.
O valor é 61% superior ao desembolsado no ano anterior.
Outro estudo do Gife constatou que menos de 6% das pessoas jurídicas que podem deduzir doações do IR o fazem. No Brasil, as empresas, para utilizar incentivos fiscais, no caso de doações, têm de optar por ser tributadas pelo regime de lucro real.
O Gife utilizou a base de dados da Receita Federal e constatou a existência de 188.828 empresas enquadradas nesse regime, das quais apenas 80.310 eram doadoras potenciais, pois não tiveram prejuízo no ano analisado.
Do total, só 4.349 (5,41%) usaram os incentivos. Segundo o estudo, a falta de conhecimento da legislação é o principal motivo para o pouco uso do instrumento.

Inclusão
Para Giosa, o movimento das empresas não se confunde com filantropia. "A responsabilidade social gera inclusão social", diz. Na sua opinião, esse tipo de prática valoriza as empresas diante da comunidade e dos públicos com os quais elas se relacionam.
No entanto, 83% das empresas ouvidas pelo Instituto ADVB declararam-se favoráveis à criação de leis de incentivos fiscais às empresas que investem em projetos de responsabilidade social.
"A empresa deve ser socialmente responsável não para usar incentivo fiscal, e, sim, porque precisamos que ela tenha um novo papel social", defende Paulo Itacarambi, diretor do Instituto Ethos.
O Ethos é uma organização não-governamental com 922 associados que visa mobilizar as empresas a gerir seus negócios de forma socialmente responsável.
O grupo Pão de Açúcar está entre as dez maiores empresas associadas ao Instituto Ethos e destina, anualmente, R$ 11,8 milhões a projetos sociais - 5% do faturamento líquido de 2003-, segundo Rosangela Bacima Quilici, diretora do Instituto Pão de Açúcar.
De acordo com Quilici, algumas leis municipais também dão incentivo fiscal aos investimentos sociais. É o caso da "Lei Mendonça", em São Paulo, que permite abater do ISS os investimentos culturais. "Mas nem 5% do que o instituto investe tem o benefício da "Lei Mendonça'", informa a diretora da instituição.


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