São Paulo, sexta-feira, 26 de setembro de 2008

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LUIZ CARLOS MENDONÇA DE BARROS

Apesar da crise, o emprego cresce


Os dados atuais mostram que a economia ainda passa longe da crise que atinge o mundo desenvolvido

OS ÍNDICES de emprego e renda continuam a crescer apesar da tormenta financeira.
Os números divulgados ontem pelo IBGE mostram um mercado de trabalho ainda em forte expansão. O desemprego nas regiões metropolitanas acompanhadas foi de 7,6% da população economicamente ativa em agosto. Um ano atrás, era de 9,5% e, há dois, de 10,6%, segundo os números coletados pela equipe de economistas da Quest. Uma seqüência impressionante para um país que viveu as últimas décadas com a maldição do desemprego elevado e imóvel.
A ocupação segue com expansão de quase 4% ao ano, contra o aumento anual de 2% da população economicamente ativa. O emprego formal cresce a taxas maiores do que a do emprego total. Em 12 meses, o emprego com carteira assinada cresceu 7,5%, contra 4% do emprego total. Já o salário médio real aumentou 4% ao ano depois dos ajustes estatísticos do número divulgado pelo IBGE. Com isso, a massa total de salários pagos aumentou 6,6% nos últimos 12 meses e 10,5% quando comparada com o mês de agosto do ano passado.
Esses dados são suficientes para mostrar que a economia brasileira ainda passa muito longe da crise que atinge o mundo desenvolvido. Não por outra razão, as vendas no varejo -melhor indicação de como se sente o cidadão consumidor em relação à economia- crescem há mais de dois anos a taxas superiores a 15% ao ano. Precisamos de outra explicação para entender os 70% de aprovação do presidente Lula? Acho que não...
Mas é importante lembrar ao leitor da Folha que o mercado de trabalho é o último elo da cadeia de eventos em uma economia de mercado. Para ter um quadro mais claro sobre seu estado em um prazo mais longo, é preciso olhar para os indicadores econômicos antecedentes, como os juros e o crédito.
Nesse caso, o quadro de hoje é bem mais sombrio. O Banco Central vem aumentando os juros já há bastante tempo, e seus efeitos sobre o consumo devem começar a aparecer mais à frente.
Recentemente, a liquidez da economia começou a ser afetada pela crise bancária americana pelo canal do crédito em dólares. Nos últimos meses, ocorreu uma elevação importante dos juros pagos pelas empresas brasileiras nas suas operações internacionais. Agora, uma interrupção quase total dessas operações obriga as empresas a buscar nos mercados locais os recursos de que necessitam para financiar suas operações. O Banco Central foi forçado recentemente a disponibilizar dólares de suas reservas para atender à demanda do mercado de câmbio.
Vai ter de voltar ao mercado de forma mais agressiva nas próximas semanas. Em um segundo movimento, o Banco Central adiou o recolhimento do compulsório sobre as operações de leasing para aliviar a pressão. Os bancos brasileiros foram obrigados, nesta situação de recursos escassos, a travar as operações de crédito de forma violenta. Os reflexos desse movimento sobre a economia serão fortes nos próximos meses e, certamente, chegarão ao consumidor e ao mercado de trabalho.
Não acredito em nada dramático se o Banco Central entender que o ciclo de aperto dos juros deve terminar já. Os focos de inflação que ainda existem na economia serão extintos naturalmente pelo desaquecimento já contratado. Mas, se mantiver uma posição de esperar por mais sinais de que a demanda está sendo contida, muito sangue vai rolar.


LUIZ CARLOS MENDONÇA DE BARROS, 65, engenheiro e economista, é economista-chefe da Quest Investimentos. Foi presidente do BNDES e ministro das Comunicações (governo Fernando Henrique Cardoso).

lcmb2@terra.com.br


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