São Paulo, sexta-feira, 26 de outubro de 2001

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VIZINHO EM CRISE

Presença de ministro em encontro de governadores provoca troca de insultos; acordo segue em impasse

Reunião com Cavallo quase acaba em briga

ROGERIO WASSERMANN
DE BUENOS AIRES

O impasse nas negociações do pacto fiscal entre o governo argentino e as Províncias permanecia ontem após mais de uma semana de reuniões. Com posições inconciliáveis de ambas as partes, houve ontem trocas de insultos, ameaças de agressões físicas e mais um adiamento na definição das negociações. A falta de um acordo atrasa mais uma vez o esperado pacote econômico, que tem o pacto fiscal como uma de suas precondições.
"Não conseguimos chegar a nenhum acordo. Após uma semana na capital, temos que voltar a nossas Províncias para cuidar dos problemas de nossa gente", anunciou o governador de San Luis, Adolfo Rodríguez Saá, ao anunciar a retirada dos governadores do Partido Justicialista (PJ, oposição) das negociações após mais de seis horas de reunião.
Os governadores do PJ disseram que deixariam seus secretários de Economia em Buenos Aires para aguardar uma contraproposta do governo federal. Os governadores da Aliança (a coalizão governista) permaneciam em negociações. O PJ comanda 14 das 23 Províncias argentinas.
O ministro da Economia, Domingo Cavallo, que retornou ontem pela manhã de uma viagem-surpresa de dois dias a Nova York, participou pela primeira vez pessoalmente das negociações, até então a cargo somente do chefe de Gabinete de Ministros, Chrystian Colombo.
A presença de Cavallo, a quem os governadores acusam de atrasar os pagamentos dos repasses devidos às Províncias, acirrou os ânimos na reunião de ontem à tarde, iniciada por volta das 14h.

Soco na mesa
Durante a exposição verbal de Cavallo, o governador de Santa Cruz, Nestor Kirchner, também do PJ, interrompeu-o para reclamar de que não trazia nenhuma proposta nova, e, segundo os presentes, seguiram-se insultos mútuos e socos na mesa. Os dois tiveram que ser contidos pelos outros governadores presentes.
"Cavallo está acostumado a faltar com o respeito com as pessoas. Ele precisa aprender a discutir as idéias democraticamente", disse Kirchner na saída da reunião.
Ele acusa a intransigência do governo, que pretende cortar os repasses às Províncias, pela impossibilidade de um acordo. "Viemos com toda a vontade do mundo para fechar um acordo, que não chegou por intransigência do governo, que quer manter a política de déficit zero à custa das Províncias", disse Kirchner.
O governo conseguiu fechar suas contas no mês passado com um superávit de US$ 124,7 milhões graças aos atrasos de mais de US$ 500 milhões nos repasses devidos às Províncias. Os governadores reclamam a manutenção de um piso de US$ 1,364 bilhão mensais, negociado em 2000.

Mistério
Cavallo manteve ontem o mistério sobre a razão de sua visita aos EUA. Ele desembarcou pela manhã, sem dar declarações à imprensa, e reuniu-se rapidamente com o presidente Fernando de la Rúa, antes de seguir para a reunião com os governadores.
A possibilidade de ele ter ido discutir uma possível dolarização da economia argentina começou a perder força ontem. Para muitos analistas, a dolarização não faz parte dos planos atuais do governo. Ela só seria um caminho em caso de um agravamento da crise, como opção à desvalorização, como já admitiram membros do próprio governo.

Instrumento de pressão
Alguns membros da equipe econômica são defensores da dolarização imediata, mas Cavallo não é um deles. Os recentes rumores sobre medidas que possam incentivar uma dolarização teriam dois objetivos básicos: reduzir a pressão do mercado por uma desvalorização e servir como instrumento de pressão por uma ajuda por parte dos governos dos Estados Unidos e do Brasil.


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