São Paulo, domingo, 26 de novembro de 2006

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Lula sinaliza com menor rigor fiscal

Na busca dos 5% de expansão, presidente ouve menos a Fazenda e mais ministérios "gastadores" como Transportes e Energia

Acuada, equipe econômica tem de estudar medidas que antes conseguia barrar em busca de permanência no segundo mandato

VALDO CRUZ
SHEILA D'AMORIM

LEANDRA PERES
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

A pressão do presidente Luiz Inácio Lula da Silva por medidas que façam o país crescer 5% ao ano dividiu o governo e enfraqueceu a equipe econômica no debate da formulação da política para o segundo mandato. Lula mudou de atitude em relação aos primeiros anos da sua gestão e se mostra mais disposto a buscar fora do Ministério da Fazenda idéias para destravar a economia.
Essa nova atitude do presidente preocupa os técnicos da área econômica, que alertam reservadamente para o risco de descontrole fiscal. Por outro lado, é comemorada por ministros como os de Minas e Energia, Trabalho, Transportes, Desenvolvimento e Cidades.
Eles costumavam sair de pires vazio dos encontros para pressionar a área econômica por medidas que implicavam mais gastos. Agora, avaliam ser o momento, depois de quatro anos de restrições orçamentárias, de colocar em prática planos ambiciosos.
Na semana passada, depois de ouvir exposições sobre entraves para investimentos nos setores de energia, transportes, saneamento e habitação, o presidente, segundo a Folha apurou, dirigiu-se à área econômica e determinou que fossem feitas "todas as propostas para alterar esse quadro".
Acuada diante das cobranças de Lula, a área econômica está sendo obrigada a estudar medidas que antes conseguia barrar. Entre os técnicos da área, a avaliação é que o ministro Guido Mantega tornou-se o ponto fraco do processo, já que terá de contentar o chefe de olho na permanência do governo.
Um diálogo entre Lula e Mantega ao final de uma das reuniões realizadas na semana passada para tratar do crescimento econômico ilustra bem a situação defensiva em que se encontra a equipe econômica.
Lula, insatisfeito com o baixo nível de investimento no setor de saneamento e habitação, cobrou propostas para driblar o limite de endividamento de Estados e municípios, que vem impedindo governadores e prefeitos de investir na área.
Mantega respondeu ao presidente Lula que apresentará "as propostas, mas também as conseqüências", numa referência ao risco de desequilibrar as contas públicas.
Irritado com a ponderação, o presidente disparou: "Isso [as conseqüências] deixa que eu cuido, isso é comigo", o que foi entendido por ministros presentes que Lula quer uma solução de qualquer jeito.
A área econômica, representada no encontro pelos ministros Guido Mantega (Fazenda) e Paulo Bernardo (Planejamento), não teve muito o que fazer, a não ser conseguir de 15 a 20 dias para apresentar as soluções exigidas. Até lá, eles se reunirão com os ministros Dilma Rousseff (Casa Civil), Márcio Fortes (Cidades) e a presidente da Caixa Econômica Federal, Maria Fernanda Ramos Coelho, para tratar de detalhes.

Ministério
Segundo auxiliares, Lula tem dito que não quer ouvir ressalvas de seus ministros, mas saídas para gerar crescimento. Em conversas reservadas, o presidente sinalizou até que a elaboração de seu plano de segundo mandato pode influenciar na escolha de seu novo ministério.
Segundo ele, se for para continuar ouvindo o mesmo discurso do primeiro mandato, de que certas medidas são impossíveis de serem adotadas, melhor buscar novas idéias.
Tradução, na visão de um interlocutor de Lula: ele se cansou de ministros que só levam restrições e pode substituí-los para fazer um segundo mandato melhor que o primeiro.
Esse tipo de pressão preocupa técnicos e o mercado financeiro, já que reduziu a capacidade de resistência dos ministros da área econômica.
Um exemplo é o uso do PPI (Projeto Piloto de Investimentos) para aumentar investimentos públicos, o que divide o governo, inclusive a própria equipe econômica.
Lula já autorizou um aumento de 0,2% para 0,5% do PIB dos projetos incluídos no PPI, programa acertado com o FMI que desconta esse valor do cálculo do superávit primário.
Até aqui, o governo nunca utilizou o mecanismo para reduzir o superávit primário na busca de sinalizar ao mercado seu comprometimento com o ajuste fiscal.
Agora, os ministros da área de infra-estrutura dão a medida como certa para conseguir recursos para obras, já que o total do PPI passará de R$ 4,6 bilhões a mais de R$ 10 bilhões.
Na equipe econômica, Tesouro e Secretaria de Política Econômica são contra. Aceitam até que seja feito um desconto, mas não de 0,5% do PIB. Já Mantega está propenso a acatar a medida para atender às demandas do presidente.


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