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Sistema tributário "bizantino" prejudica empreendedores, diz "Financial Times"
JONATHAN WHEATLEY
DO "FINANCIAL TIMES"
Por diversos anos, Valdir
Soares trabalhou como motorista para dois médicos em São
Paulo. Depois, teve a chance de
realizar um sonho: a loja na
qual adquiria peças para a moto
que usava para ir trabalhar a cada dia foi colocada à venda. Soares e sua mulher decidiram
comprar e se tornaram pequenos empresários.
Mas, passado apenas um ano,
ele está de volta ao volante. "Os
negócios iam bem. Mas o aluguel da loja subiu e precisávamos faturar mais. Isso queria
dizer contratar um mecânico
para fazer consertos. Quando
estudamos os impostos e os demais custos, percebemos que
era impossível. Apareceu um
comprador interessado na loja,
e nós vendemos," conta.
O bizantino sistema tributário brasileiro é um grande obstáculo aos negócios no país.
Um recente estudo do Banco
Mundial constatou que uma
empresa típica brasileira precisava de 2.600 horas ao ano para
pagar seus impostos, o que coloca o país em último lugar entre as 177 nações pesquisadas.
Na Irlanda, o prazo para a mesma tarefa é de 76 horas.
As grandes empresas empregam exércitos de advogados
que ajudam a conduzi-las pelo
labirinto de regulamentos.
Mas, diante de tanta complexidade, muitas pequenas empresas naufragam ou submergem
deliberadamente na "informalidade", termo bastante usado
no Brasil como eufemismo para sonegação de impostos.
Além das contribuições sociais e trabalhistas, as empresas
enfrentam os impostos estaduais de vendas governados
por 27 conjuntos de legislações
diferentes nos 27 Estados do
país -e uma série de outros impostos municipais, estaduais e
federais sobre vendas, lucros e
folhas de pagamento.
A carga tributária do país
vem crescendo firmemente nos
últimos anos, e agora atingiu
37% do PIB (Produto Interno
Bruto), tão elevada quanto a de
muitos países desenvolvidos
mas sem oferecer aos cidadãos
serviços de qualidade semelhante ao dessas nações.
Fábio Pina, da Fecomercio,
uma organização setorial de varejo sediada em São Paulo que
está lutando pela reforma tributária, diz que "alguns impostos são pagos à União (governo
federal) e repassados aos Estados, outros passam dos Estados
aos municípios, outros dos Estados à União e de volta a outros Estados".
"É uma movimentação
monstruosa e desnecessária, o
legado de cem anos de aprovação de novos impostos de maneira improvisada", afirma.
E está crescendo a pressão
sobre o governo para que corrija a confusão. Na semana passada, o ministro da Fazenda,
Guido Mantega, disse que o pacote da reforma tributária seria
enviado ao Congresso até amanhã.
Essa reforma vem sendo prometida desde que o presidente
Luiz Inácio Lula da Silva assumiu, em 2003. Mas agora tem
um incentivo a mais: em dezembro, o governo sofreu um
severo revés quando o Senado
rejeitou um projeto de lei que
tornaria permanente a CPMF,
uma taxa sobre transações financeiras que rendeu R$ 40 bilhões ao governo no ano.
O sistema atual depende pesadamente dos impostos sobre
as vendas, que ficam ocultos
dos consumidores nos pontos-de-venda, de modo que os pobres terminam dedicando proporção maior de sua renda a pagá-los do que os ricos.
As alíquotas tributárias variam amplamente. No Estado
de São Paulo, por exemplo, o
preço da galinha inclui 18% em
impostos. No caso de uma lata
de refrigerante, o imposto é de
47%, e no de uma lata de cerveja é de 56%, de acordo com o
Feirão do Imposto, um site que
menciona esses exemplos.
Uma reforma tributária
abrangente unificaria os 27 impostos estaduais de vendas diferentes, bem como unificaria e
simplificaria outros impostos e
encargos sociais. Os maiores
Estados, os mais prejudicados
por quaisquer reformas, são governados pela oposição, por isso uma mudança como essa será muito difícil politicamente.
A proposta do governo deve
simplificar os impostos estaduais de venda em alguma medida, mas ficará longe de criar
um imposto de valor adicionado unificado. Outros impostos
locais devem permanecer inalterados.
Tradução de PAULO MIGLIACCI
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