São Paulo, quinta-feira, 27 de março de 2008

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VINICIUS TORRES FREIRE

Águas de março vão levar o apagão?


Chuvas, mais gás e gasoduto novo fazem curativo eficaz na crise, que ainda custa caro e pode voltar no final do ano

PASSOU A CRISE de energia? Passou, a deste ano, pelo menos, e em termos, pois o preço da eletricidade disparou, entre outros estragos. Choveu bem a partir de fevereiro. Cresceu a produção de gás e sua oferta para o consumidor privado, embora a Petrobras continue a tropeçar na produção de outros combustíveis -vide o aumento das importações. A estatal energética, porém, concluiu no prazo o crucial gasoduto entre Espírito Santo e Rio.
A direção de gás da estatal, sob Maria das Graças Foster, fez malabarismos e conseguiu racionalizar a distribuição de gás disponível (não adianta apenas ter gás, é preciso ter tubos para distribuí-lo onde há carência; é preciso "otimizar" a produção das termelétricas, cuja produtividade e confiabilidade variam bastante etc.). Apesar dos muitos problemas restantes, apenas a má vontade biliosa dirá que o mutirão da emergência elétrica não funcionou -da emergência, ressalte-se.
A Petrobras afirma que tem gás liqüefeito, importado em navios, contratado para chegar a partir de agosto e diz que, talvez, não precise adquirir todo o contrato neste ano. Os terminais de regaseificação do combustível devem ficar prontos nos prazos -o do Ceará em junho; o do Rio talvez em setembro. Nesta semana, deve ser tomada a decisão de desligar as térmicas a óleo.
Segundo apuração da Abegás (Associação Brasileira das Empresas Distribuidoras de Gás Canalizado), a oferta adicional do combustível em janeiro permitiu o aumento do consumo das indústrias (10%) e também o das termelétricas (mais que dobrou) em relação a janeiro de 2007. Depois de um período de inércia, erros e encrencas, aos 40 minutos do segundo tempo a Petrobras acordou para o problema do gás, não sem antes levar safanões do governo federal a partir de meados de 2007.
Tudo rosa, azul? Nem de longe. A ameaça de apagão e o racionamento de gás ainda vão custar muito caro.
O preço de curto prazo da energia afeta grandes consumidores (indústrias, shoppings) que negociam eletricidade no mercado livre e/ou que precisam fazer compras adicionais.
Ficou em R$ 200 o MWh em fevereiro, no Sudeste -havia sido de R$ 18 em fevereiro de 2007. Em janeiro tinha batido em R$ 500, preço em nível de apagão (contra R$ 23 em 2007). Em março, a média ainda fica nuns R$ 125 o MWh. De resto, continuam sérios os problemas de licenciamento e a burocracia que seguram obras de usinas. As metas de aumento de oferta de eletricidade deste ano estão ameaçadas e, para piorar, muita energia extra virá de térmicas, mais caras e mais sujas.
O nível dos reservatórios se recuperou bem. No Sudeste, está em 77%. No domingo passado, havia até usina descarregando excesso d'água, embora a situação dos reservatórios pelo país ainda seja, no geral, a pior desde 2003. As águas de março vão levando o apagão, mas entraremos no período seco, de abril a novembro, em situação pouco confortável.
O risco pode ser atenuado pelo aumento da oferta de gás e pela construção de gasodutos. Mas isso é, em parte, um grande esparadrapo. Oferta de energia não se resolve com mágicas e milagres temporários, tais como a dança da chuva. Não dá para acelerar o ritmo de investimentos sob uma ameaça dessas.

vinit@uol.com.br


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