São Paulo, terça-feira, 27 de abril de 2004

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OPINIÃO ECONÔMICA

A responsabilidade do CMN

BENJAMIN STEINBRUCH

Vamos direto ao assunto: o senador Aloizio Mercadante (PT-SP) está certo em sua pregação para que o governo altere a meta de inflação de 2005 de 4,5% para 5,5%. Não faz sentido, diante das mudanças previstas no cenário externo, manter essa meta exageradamente rigorosa, que exigirá enorme sacrifício para ser alcançada. Mais sensato é substituí-la por outra um pouco mais realista, também difícil de alcançar, mas que ofereça melhores condições para o crescimento da economia.
Retomar o crescimento é fundamental não só para criar empregos -demanda número um dos brasileiros- mas também para melhorar a credibilidade internacional do Brasil. Há duas semanas, quando o JP Morgan rebaixou a recomendação sobre os papéis da dívida brasileira, incluiu pelo menos uma frase sensata em suas justificativas para a desastrada decisão: "As perspectivas de crescimento [da economia brasileira] continuam incertas".
Traduzindo, isso quer dizer que, para os olhos gulosos dos credores externos, nada valem a política monetária conservadora e a política fiscal restritiva quando a economia não cresce. Quem duvidar disso pode perguntar a qualquer executivo de empresa estrangeira qual é a principal razão que leva uma multinacional a fazer investimentos diretos em um país. A resposta invariavelmente será: a perspectiva de crescimento do mercado. Não é por outra razão que a China atrai bilhões e bilhões de dólares de capital estrangeiro de risco. A despeito das complicações burocrático-regulatórias do regime político comunista, a estabilidade da economia e seu crescimento contínuo são garantias de que haverá expansão de demanda. E isso basta.
O raciocínio que fundamenta a proposta de redução da meta de inflação é simples. Para perseguir a meta de 4,5% prevista para 2005, o Banco Central terá espaço muito limitado para reduzir a taxa de juros, e isso vai acentuar a tendência de estagnação da economia.
O senador Mercadante tem usado freqüentemente o exemplo do Chile para mostrar a importância da flexibilização das metas de inflação e seu impacto no crescimento. O Chile adotou o sistema de metas em 1989, quando a inflação atingia 26% ao ano, e levou oito anos para reduzi-la para 6,1%. Esse tratamento gradual permitiu ao país desfrutar de altas taxas de crescimento -de 8,2%, em média, no período.
De 1998 a 2003, a inflação continuou em queda (até 2,5%), mas o crescimento médio anual do PIB chileno caiu para 2,5%. O exemplo consagra evidências de que os picos de expansão econômica em países emergentes ocorrem quando a inflação oscila entre 5% e 10% ao ano. Fora desses limites, tanto para baixo quanto para cima, a inflação em geral prejudica o crescimento.
Cabe ao CMN (Conselho Monetário Nacional) a responsabilidade de alterar a meta da inflação. Aí começam os problemas. O CMN, um órgão criado em dezembro de 1964 para ser o formulador das políticas econômicas, é formado hoje apenas por três pessoas: o ministro da Fazenda, o ministro do Planejamento e o presidente do Banco Central. Com essa formação, a decisão representa apenas a opinião do governo, sem nenhuma influência direta daquilo que pensam os diferentes setores da economia brasileira. Seria útil discutir a idéia de que o CMN, dada a sua importante função, pudesse ter também outros ministros mais ligados ao setor real da economia, como o do Desenvolvimento e o da Agricultura. E por que não incluir ainda representantes de trabalhadores, empresários e do meio acadêmico, de modo que suas decisões possam espelhar melhor as prioridades escolhidas pela sociedade? É custoso admitir que, em tempos menos democráticos da história recente, o CMN já foi muito mais transparente e representativo do que é hoje.
Ao ser indagado sobre a proposta de Mercadante, o ministro da Fazenda, Antonio Palocci Filho, disse estar aberto ao debate do tema, mas acrescentou que o assunto "não está na pauta" do governo. Com todo o respeito, acho que é hora, então, de colocá-lo na pauta. Nada é mais importante do que a adoção de medidas que possam acelerar o crescimento, para combater o desemprego, principal angústia brasileira.


Benjamin Steinbruch, 50, empresário, é diretor-presidente da Companhia Siderúrgica Nacional e presidente do conselho de administração da empresa.

E-mail - bvictoria@psi.com.br


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