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EXPORTAÇÕES
Consumo mundial de carne bovina é crescente e o rebanho vem se reduzindo, o que já começa a elevar preços
Pecuária vai virar "filé" do agronegócio
MAURO ZAFALON
DA REDAÇÃO
O período de glória da soja tem
os dias contados e o produto já
tem substituto: a pecuária. Não
que a produção de soja vá sofrer
um revés. Vai continuar crescendo, mas deve entrar em uma fase
de preços bem menores do que os
atuais nos próximos anos, assim
que os estoques mundiais forem
repostos e a produção voltar a ficar equilibrada com o consumo.
Já a carne bovina vai começar a
ter uma fase de forte demanda,
coincidindo com um período de
redução dos rebanhos nos principais países produtores devido ao
aumento no abate de fêmeas. Vai
ganhar dinheiro quem conseguir
uma integração entre a produção
de soja e a pecuária.
Esse é o cenário mostrado no estudo do "Anualpec 2004", uma
publicação da FNP Consultoria
Agroinformativos, especializada
em pecuária.
Victor Abou Nehmi Filho, diretor da FNP, diz que, após 20 anos
de estabilidade e, em alguns anos,
até de queda, o consumo de carne
se recupera e volta a crescer. De
1994 a 2001, o comércio mundial
de carne bovina girou à média
anual de 5,72 milhões de toneladas. Neste ano já deve chegar próximo dos -talvez até superar-
7 milhões de toneladas.
Esse aumento de demanda
ocorre em um período em que todos os principais rebanhos mundiais estão com redução. O brasileiro, o maior do mundo em termos comerciais, fecha o ano em
165,9 milhões de cabeças. No ano
passado estava em 168,1 milhões.
Outra importante queda de rebanho ocorre nos Estados Unidos, onde o número de animais é
de 95,1 milhões de cabeças, quase
7,7 milhões a menos do que o de
há dez anos.
Preços sobem
Essa redução nos principais rebanhos mundiais já começa a influenciar os preços, que mostram
forte elevação.
No início do ano passado, a tonelada de contrafilé, um dos cortes carro-chefe na exportação brasileira, estava em US$ 1.800. Já subiu para US$ 4.200 no mercado
externo. No mesmo período, uma
tonelada de alcatra subiu de US$
1.600 para US$ 3.700.
Com a escassez mundial de carne, o Brasil passou a ser a solução
para o mercado internacional, diz
Nehmi. O país ficou isento de problemas sanitários como o mal da
vaca louca ou novos focos de febre aftosa. Com isso, o volume de
carne brasileira exportada subiu
de 376 mil toneladas há dez anos
para o atual 1,5 milhão de toneladas. A participação nacional no
mercado externo subiu de 6,7%
para 21,4% no período.
Nehmi diz que essa inserção do
Brasil no mercado externo vai fazer com que os preços internos,
hoje abaixo dos externos, sigam
um padrão internacional nos próximos anos.
A carne é uma das poucas commodities brasileiras cujos preços
internos não seguem os do mercado externo. "Essa situação vai
mudar", diz Nehmi.
Até 2000, o Brasil não aumentava as exportações por um problema de logística. O produto brasileiro, que atingia apenas 40 países,
hoje chega a 120 e não se exporta
mais porque não há bois dentro
dos padrões de exportação. Prevendo dificuldades de abastecimento na entressafra, alguns frigoríficos já oferecem R$ 70 por arroba de boi rastreado para outubro.
Nehmi diz que a soja vive momento diferente do da carne. A
oferta é constante, com ampliações de áreas no Brasil e na Argentina. Os preços, hoje próximos
de US$ 9,50 por bushel (27,2 quilos) na Bolsa de Chicago, devem
recuar para US$ 6 por bushel assim que os estoques internacionais voltarem aos níveis normais.
Atualmente, os estoques representam apenas 13% do consumo
mundial, a quarta pior relação na
história dessa commodity. Um
número aceitável é de 20%, segundo estimativas do mercado.
Evolução necessária
Nehmi reconhece, no entanto,
que a pecuária precisa evoluir para competir com a soja. Hoje o
rendimento líquido da pecuária é
o equivalente a cinco sacas de soja
por hectare. Já o produtor de soja
que produz 50 sacas por hectare
tem rendimento líquido de 20 sacas. Com o retorno da soja aos
preços históricos -e o aumento
dos custos-, o rendimento do
sojicultor deve recuar para 10 a 15
sacas, um patamar que vai ser facilmente atingido por uma pecuária mais tecnificada -a que utiliza mais animais por hectare.
O estudo da Anualpec, que está
sendo divulgado nesta semana no
Agrishow de Ribeirão Preto (SP),
diz que, para elevar a rentabilidade, o produtor deve associar o cultivo de soja com a pecuária. Manter um terço de pastagens e dois
terços de agricultura e fazer a rotação a cada dois anos.
Nehmi diz que os custos das lavouras de soja serão crescentes,
com aumento de fretes e dos insumos. A margem de ganho deverá
cair. Isso não deverá acontecer
com a pecuária, que tem, inclusive, um perigo menor na ocorrência de climas desfavoráveis.
Para o diretor da FNP, os pecuaristas que ainda não foram atraídos pela soja não devem fazê-lo
agora. Os animais ainda estarão
com preços baixos nos próximos
90 dias e este é o momento para a
formação de rebanho. "Essa relação nunca esteve tão favorável",
acrescenta.
Por outro lado, o analista afirma
que, para o sojicultor, este é o momento ideal para a compra de boi.
A partir de agora, cada vez mais o
boi deve subir e a soja cair, ficando mais onerosa a integração soja-pecuária.
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