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ANÁLISE
Crise no mercado de crédito atinge ações
JOHN AUTHERS
DO "FINANCIAL TIMES"
AS DIFICULDADES no
mercado imobiliário
americano são evidentes há ao menos um ano, e dados desta semana mostram que
o excedente de casas não vendidas é o mais alto desde 1992, o
ano em que acabou a última recessão do setor nos EUA.
E em segmento algum as dificuldades são mais evidentes do
que no mercado "subprime", de
crédito imobiliário para clientes com históricos ruins, cujos
prejuízos podem atingir US$
100 bilhões, de acordo com o
Fed (o banco central dos EUA).
Uma série de concordatas no
mercado "subprime" gerou oscilações no mercado em fevereiro e março, mas os operadores decidiram rapidamente que
o problema estava contido. As
ações pelo mundo continuaram em alta, enquanto o mercado de crédito se mantinha em
patamar muito elevado. Isso
gerou otimismo quanto à possibilidade de distribuir o risco de
modo mais fácil, o que justificava que até mesmo as empresas
de maior risco tivessem crédito
a baixo preço.
Esse clima otimista desapareceu. Agora, o medo governa
os mercados de crédito, nos
quais o custo efetivo de proteção contra inadimplência, tanto na Europa quanto nos EUA,
cresceu em mais de 50% em um
mês. Um fluxo constante de
más notícias provocou temores
de que o fiasco no setor "subprime" deflagrasse uma compressão de crédito, elevando o
custo mundial de financiamento à medida em que os investidores se vêem forçados a vender investimentos saudáveis a
fim de cobrir seus prejuízos.
Pode-se acrescentar a isso
provas de que o mercado de hipotecas "prime" dos EUA também começa a sentir o abalo. O
Countrywide, um dos maiores
bancos do país de crédito imobiliário, informou que era esse
o caso ao anunciar resultados
desfavoráveis nesta semana. Isso poderia transferir os problemas a um mercado imensamente maior e afetar os investidores convencionais.
Essas preocupações também
geraram temores com relação
às ações, que nos últimos anos
vêm recebendo forte sustentação da tendência de redução no
número de ações circulantes,
por meio do uso de reservas de
caixa das empresas para recomprar ações ou de aquisições
alavancadas ou bancadas pelo
setor de capital privado. Tudo
isso elevava os preços das ações
ao reduzir seu volume em circulação, e essas tendências dependiam da disponibilidade de
crédito a custo baixo.
Foi só ontem que as ações pareceram se inteirar das sombrias conseqüências da crise.
Existem duas explicações
contrastantes para a reação
tardia dos mercados de ações.
Alguns alegam que o crédito
barato forneceu sustentação
crucial às ações, e que as avaliações atuais dos papéis não podem mais ser sustentadas.
Uma visão mais positiva é a
de que o mercado de crédito está passando por uma saudável
correção e que a divergência
entre os mercados de crédito e
ações é natural. Os investidores
no setor de capital privado, e
muitas empresas, estão obtendo crédito a baixo custo e usando-os para recomprar ações. Isso favorece diretamente os investidores em ações, à custa
dos investidores em crédito,
aos quais resta emprestar dinheiro a companhias com
maior endividamento em seus
balanços, e, portanto, os expõe
a maior risco de inadimplência.
Marc Chandler, da Brown
Brothers Harriman, de Nova
York, diz que "embora a compressão de crédito seja causa de
preocupação, nossa suposição é
de que as condições estão simplesmente voltando a um nível
mais normal". Já as autoridades regulatórias parecem crer
que o problema não causará
uma crise sistêmica.
"Aqueles que erraram em
suas ações e avaliações terminaram punidos", disse William
Poole, presidente do Fed de St.
Louis, na semana passada. "Estamos recebendo bons indícios
de que as empresas e fundos de
hedge que estão sofrendo mais
são os que o merecem".
Isso pode justificar a confiança dos investidores. Mas os
mercados de ações estavam enviando alguns sinais de alerta
antes da queda de ontem. As
ações do setor financeiro vinham tendo fraco desempenho, e as grandes empresas estavam se saindo melhor que as
pequenas. Esse "estreitamento" do mercado em favor dos
grandes tipicamente surge ao
final de longos períodos de alta.
Mas as ações também dispõem de outros meios de sustentação. Os lucros das empresas americanas parecem caminhar para um crescimento
anualizado superior a 5% no segundo trimestre, impressionante depois de quatro anos de
alta ininterrupta. Seu endividamento é baixo, e por isso a alta
nos custos de crédito não prejudicará demais os seus lucros.
Até as quedas de ontem, os
papéis dos mercados emergentes como o Brasil continuavam
a cerca de 1,5% de seus picos
históricos, enquanto os preços
dos títulos de dívida emergente
caíram muito menos que os papéis das empresas americanas
nas últimas semanas. Isso sugere que a confiança no crescimento secular dos grandes
emergentes continua intacta.
E o mercado de crédito não é
a única fonte de liquidez. Os
grandes fundos dos países ricos
em petróleo e de economias
asiáticas têm enormes recursos
e precisam investi-los. A aquisição pela China de uma participação acionária no grupo de capital privado Blackstone sugere
que essas reservas seguirão
sustentando o mercado.
Assim, mesmo alguns dos observadores mais pessimistas
sugerem que as ações podem
evitar uma queda decisiva por
pelo menos mais um ano.
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