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OPINIÃO ECONÔMICA
Os riscos do crescimento econômico
LUIZ CARLOS MENDONÇA DE BARROS
Um dos debates mais intrigantes sobre a economia
mundial, neste ano da volta da
Olimpíada à Grécia, é aquele que
envolve a questão dos desajustes
macroeconômicos dos EUA. De
um lado, estão os defensores de
uma catástrofe inevitável envolvendo a moeda americana; do
outro, os que acreditam que os
crescentes déficits comerciais da
maior economia do mundo não
trarão problemas maiores e o dólar continuará a ser a moeda internacional dominante. Os membros do primeiro grupo são chamados de catastrofistas; seus
opositores gostam de ser chamados de realistas.
Os catastrofistas argumentam
que a sociedade americana habituou-se a manter um nível de
consumo muito elevado, e as empresas que atendem aos seus desejos estão, há muito tempo, migrando para países com custos de
produção menores, em razão de
salários mais baixos. Esse processo de migração das empresas para fora dos Estados Unidos acelerou-se a partir das últimas décadas do século passado em razão
da revolução tecnológica, como
as telecomunicações e a informática.
Mais recentemente, a emergência da China, como o grande pólo
de produção de bens de consumo
de baixos preços, aprofundou esse fosso entre o que os americanos
consomem e sua produção doméstica de bens e serviços. Entre
1996 e 2004, a demanda real cresceu a uma taxa de 3,6% ao ano,
enquanto o PIB cresceu a uma
taxa de 3,5%. Esse movimento
acelerou-se neste novo século em
que vivemos: entre o último trimestre de 2001 e o último de 2003,
o descompasso entre produção e
consumo chegou a 1% ao ano.
O déficit comercial dos Estados
Unidos é hoje superior ao déficit
fiscal do Tesouro, outro indicador importante dessa tendência,
na medida em que não são apenas os gastos do governo que explicam o desequilíbrio do seu comércio exterior. Os gastos dos
consumidores já fazem parte do
déficit estrutural da maior economia do mundo.
Trata-se, portanto, de uma tendência de longo prazo, o que faz o
aumento do déficit comercial,
mantido esse comportamento do
consumidor americano, continuar. Por outro lado, os juros e os
dividendos recebidos pelos investidores estrangeiros, por suas
aplicações em ativos financeiros
nos Estados Unidos, também aumentam a uma velocidade crescente, fazendo com que o volume
de dólares que acabam nas mãos
de não-residentes não pare de
crescer.
A teoria econômica nos ensina
que as economias de mercado
têm uma racionalidade implícita
em seu funcionamento e que, em
situações como essa, criam seu
próprio mecanismo de correção.
Países que, como os Estados Unidos, apresentam desequilíbrios
externos continuados acabam
sofrendo desvalorização de sua
moeda. Com isso, dois fenômenos
simultâneos ocorrem: de um lado, diminui a demanda por bens
importados e incrementam as exportações; de outro, ocorre um
aumento da inflação, o que leva
o banco central a elevar os juros,
a diminuir o consumo e, portanto, a reduzir as importações.
Com o tempo, há um processo
de ajuste nas contas externas do
país deficitário e um reequilíbrio
nos mercados. Mas isso ocorre
nos livros, porém não em um
mundo no qual existem políticas
econômicas nacionais que agem
para evitar uma queda em suas
vendas externas. É o que está
acontecendo hoje com os países
asiáticos, principalmente Japão e
China. Em um mundo com superoferta de recursos para investimentos, que é aquilo a que estamos assistindo, o bem escasso é o
consumo, e não o investimento.
Portanto ninguém quer perder o
consumo quase maníaco do cidadão que mora na terra do Tio
Sam.
Por isso os bancos centrais asiáticos compram os dólares que sobram nas mãos de seus exportadores e evitam a valorização de
sua moeda. O ajuste previsto nos
livros-texto não ocorre, e o desequilíbrio externo americano se
eterniza. Em uma democracia
populista, como a que existe hoje
nos Estados Unidos, nenhum político tem condições de propor
um ajuste apenas interno, que,
por meio de um aumento brutal
dos juros e dos impostos, promova uma recessão forte por um período longo. Mesmo porque corre-se o risco de que uma recessão
no maior centro de consumo do
mundo acabe se espalhando
mundialmente e reproduza o que
ocorreu na década de 30.
Por isso estamos em uma verdadeira armadilha, como defendem os catastrofistas. Nessa situação, ocorre uma espécie de
aliança mundial para evitar esse
cenário, postergando um ajuste
que terá de ocorrer de qualquer
modo. Em e-mail recente, o jornalista Milton da Graça me pergunta o que eu faria se fosse guindado, por algum tipo de mágica,
à condição de presidente do Federal Reserve. Minha resposta é
simples: devemos começar derrotando o presidente George W.
Bush nas eleições de novembro e
abrir espaço para um acordo internacional do tipo que ocorreu
em Paris alguns anos atrás.
Luiz Carlos Mendonça de Barros, 61,
engenheiro e economista, é sócio e editor do site de economia e política Primeira Leitura. Foi presidente do BNDES e
ministro das Comunicações (governo
FHC).
Internet: www.primeiraleitura.com.br
E-mail - lcmb2@terra.com.br
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