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Funcionário "vira" sócio para empresa driblar fisco
Companhias mascaram vínculo de emprego oferecendo pequena participação na sociedade
Procuradora diz que prática é comum com profissionais liberais, mas ocorre também em outras áreas, como
em salões de cabeleireiro
VERENA FORNETTI
DA REDAÇÃO
Assim que saiu da faculdade,
a bacharel em direito C.B. começou a carreira como sócia
minoritária de um escritório
paulista de advocacia. No papel,
era uma das donas da empresa.
Na prática, batia o cartão de
ponto todo dia às 8h30, não tinha autorização para assinar as
análises jurídicas que produzia
e ganhava R$ 1.500 por mês.
Essa forma de contratação,
em que os empresários mascaram o vínculo de emprego, tem
se generalizado no país segundo relatos de representantes do
Ministério do Trabalho, dos tribunais do trabalho e de sindicatos. De acordo com a legislação
brasileira, quando as tarefas do
sócio se configuram da mesma
maneira que o de um empregado, a prática é fraudulenta.
O governo intensificou a fiscalização sobre empresas que
caracterizam os funcionários
como sócios e pagam menos
tributos e contribuições trabalhistas. Depois de autuá-las, o
Ministério do Trabalho cobra
os depósitos do FGTS sonegados no período e comunica à
Receita Federal, que demanda
o Imposto de Renda devido.
De acordo com a lei, existe
vínculo de emprego -e, portanto, a contratação deve ser
feita com registro em carteira-
quando o trabalhador se submete a um chefe e atua de modo
não eventual, com horários fixos e mediante salário.
Luís Alexandre de Faria,
coordenador do grupo de combate a fraudes e à terceirização
irregular da Superintendência
Regional do Trabalho de São
Paulo, diz que a fraude é recorrente no Estado. "São Paulo é o
balão de ensaio de experiências
ilegais. As empresas estão cada
vez mais inventivas. E testam
os modelos aqui para depois exportar para outros lugares."
O grupo de Faria, que mira
grandes sonegadores, fiscalizou, nos últimos 18 meses, 156
empresas que contrataram irregularmente 7.279 pessoas. Os
números incluem tanto a fraude do falso sócio quanto outros
tipos de contratação irregular,
principalmente a terceirização
ilegal. O valor sonegado por essas companhias em depósitos
de FGTS atingiu R$ 24 milhões.
Segundo Faria, a fiscalização
em pequenas e médias empresas, realizada por auditores que
não integram esse grupo, também tem sido intensificada.
Ministério Público
O Ministério Público do Trabalho ampliou a sua atuação
nessa área, com mais investigações de casos semelhantes. Nos
últimos meses, os procuradores firmaram Termos de Ajustamento de Conduta com escritórios, centros médicos, escolas
e outras empresas para pedir a
contratação dos funcionários.
Em um dos documentos, um
escritório "compromete-se a
abster-se de desvirtuar a verdadeira relação de emprego". Em
outro, um centro de estudo
aceita "não utilizar qualquer
instrumento para encobrir o
pagamento de salário "por fora",
inclusive sob o argumento de
participação nos resultados".
Além da assinatura dos termos de ajustamento, o Ministério Público conduz 14 procedimentos de investigação contra
escritórios de advocacia. Não
há levantamento disponível sobre casos em andamento em
todas as áreas.
A procuradora regional do
trabalho Sandra Lia Simón afirma que, embora a descaracterização da figura do sócio minoritário seja comum com profissionais liberais, a prática é frequente em outras áreas -como
em empresas de entrega e mesmo em salões de cabeleireiro.
No Tribunal Regional de São
Paulo, há mais de 250 ações judiciais contra um grupo de estética paulistano. Trabalhadores contratados como sócios, da
zona leste à região dos Jardins
da capital, pedem o reconhecimento do vínculo de emprego.
Em sentença favorável a um
deles, o desembargador federal
do trabalho Rovirso Boldo escreve que "erigir à condição de
"sócias de serviços" [veja quadro
explicativo nesta página] a profissionais especializadas nos
serviços de manicuro, pedicuro
e depilação, foi a forma sub-reptícia encontrada para fraudar a legislação".
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