São Paulo, domingo, 27 de outubro de 2002

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EM TRANSE

Para Amaury Bier, secretário da Fazenda, maior carga fiscal também não é solução para elevar o superávit primário

Governo vê pouco espaço para cortar gastos

ANDRÉ SOLIANI
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

O espaço para aumentar o superávit primário do governo é limitado, avalia o principal negociador brasileiro no FMI (Fundo Monetário Internacional), o secretário-executivo do Ministério da Fazenda, Amaury Bier. O superávit primário é quanto o governo economiza de suas receitas para o pagamento de juros da dívida pública.
Só existem duas maneiras de elevar a meta de superávit primário: ou o governo corta gastos ou aumenta a arrecadação, normalmente via mais impostos.
Em entrevista à Folha, Bier diz que "o espaço para se fazer cortes não é muito grande". Por outro lado, segundo o secretário-executivo da Fazenda, "não é desejável aumentar a carga tributária".
Apontar os limites de um maior arrocho fiscal não significa que uma elevação da meta de superávit primário esteja descartada. "Não estou dizendo que é impossível", afirmou Bier.
Em novembro, a equipe econômica do governo Fernando Henrique Cardoso e a equipe de transição do presidente eleito farão uma revisão do atual acordo com o FMI. Um dos temas centrais é se a meta de superávit fiscal deverá ou não ser elevada. O acordo vigente prevê economia de 3,75% para pagar juros em 2003, equivalente a R$ 53 bilhões.
O principal negociador brasileiro no Fundo ainda não se decidiu sobre a questão. "Eu particularmente tenho dúvidas se o nosso superávit é adequado ou se precisa ser aumentado", diz Bier.
Ele, no entanto, argumenta que um aumento da meta poderia ter efeito positivo. Os investidores melhorariam suas expectativas sobre os rumos da economia. Em consequência, as taxas de juros e de câmbio poderiam cair.
A queda dos juros e a valorização do real, por sua vez, permitiriam ao país crescer mais rápido. Com a maior atividade econômica, a arrecadação de impostos cresceria, e o cumprimento da meta de superávit seria facilitado.

Meta maior
Para o economista Sérgio Werlang, diretor do banco Itaú, o próximo governo deveria aumentar a meta de superávit para 5%. O argumento de Werlang é parecido com o de Bier. O maior arrocho fiscal daria um choque de confiança e permitiria a queda dos juros reais (juros menos a inflação) para 8%, o que aumentaria a capacidade do país crescer.
Bier se recusa a falar qual seria o aumento necessário e possível do superávit fiscal, caso as perspectivas do Brasil não melhorem após as eleições presidenciais. Segundo ele, é preciso avaliar com cuidado de quanto seria um eventual aumento da meta de superávit primário, para não se comprometer com um número inatingível.
Se o governo anuncia um meta que não é cumprida ou que é percebida como irrealista, a confiança dos investidores nos rumos da economia despenca e a situação só se complica.
Bier só entrou em detalhes sobre uma forma de elevar a meta de maneira responsável. Segundo ele, os Estados e os municípios poderão contribuir um pouco mais com o arrocho fiscal no próximo ano. Atualmente, eles são responsáveis por um superávit de 0,95% do Produto Interno Bruto, do total de 3,75% previsto para o próximo ano.
Para Bier, se os compromissos de renegociação das dívidas de Estados e municípios forem mantidos inalterados, seria possível atingir uma economia entre 1,05% e 1,10% do PIB. Ou seja, seria viável aumentar o superávit entre 0,05 e 0,10 ponto percentual sem grandes dificuldades.

Temeridade
Geraldo Biasoto, professor da Unicamp e assessor econômico do candidato José Serra (PSDB), e o professor de economia da USP Paulo Nogueira Batista Jr. consideram 5% uma temeridade. Para eles, um aumento dessa magnitude só agravaria a atual crise e seria difícil de ser cumprido.
Bier prefere esperar o resultado das eleições de hoje e a reação do mercado para avaliar se será realmente necessário aumentar a meta de superávit primário. "A avaliação se é necessário e desejável vai depender muito da reação do mercado às primeiras declarações e às primeiras indicações do presidente eleito."


Colaborou Leonardo Souza, da Sucursal de Brasília


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