|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
LUIZ CARLOS MENDONÇA DE BARROS
E ponto final.
Estatais privatizadas viraram empresas fortes e competitivas, contribuindo
para o desenvolvimento
NA COLUNA de hoje, faço uma
última reflexão sobre o processo de privatização. Não
tenho dúvida de que, após o segundo turno das eleições, esse tema deixará de ter uma presença maior nas
discussões sobre os destinos do
Brasil. E por que digo isso? Porque o
objetivo do presidente Lula, com
sua violenta campanha contra a
venda das principais estatais brasileiras, já terá sido atingido: ganhar
os votos da parte da esquerda que
não votou nele no primeiro turno.
Mas meu objetivo não é denunciar a mais nova esperteza eleitoral
de nosso presidente, mas deixar
plantadas algumas sementes de racionalidade. O Brasil, ao longo de 50
anos, soube utilizar-se de forma eficiente da presença do Estado na
economia. Entre 1940 e 1950, as
empresas estatais foram responsáveis por tirar o Brasil de um subdesenvolvimento clássico. Vale do Rio
Doce, Fábrica Nacional de Motores,
Companhia Siderúrgica Nacional e
Petrobras foram instrumentos para
o Brasil entrar na era industrial.
Posteriormente, com Juscelino,
esse processo foi reforçado com a
presença do setor privado, nacional
e internacional, chamado para tornar mais eficiente e intenso esse
movimento em direção a uma economia moderna. Naquele momento, o Estado não tinha capacidade financeira para levar seus investimentos além das fronteiras já desbravadas, e Juscelino percebeu isso.
Homem de visão foi esse mineiro de
Diamantina.
Sob a ditadura, a presença do Estado na economia voltou a crescer,
dessa vez a partir dos sonhos de potência mundial dos militares da Escola Superior de Guerra. Foi um desastre de proporções amazônicas, e
bilhões de dólares de dinheiro público foram enterrados em projetos
megalomaníacos e sem sentido econômico. Pior ainda, nossas fronteiras foram fechadas para viabilizá-los e o Brasil atrasou-se décadas no
processo de integração com a economia mundial. A aventura culminou com a crise da dívida externa e a
paralisia dos investimentos estatais
nos anos 80.
Nos anos 90, houve uma reversão
desse processo, com a privatização
de um grande número de empresas
públicas, acelerada a partir de 1995,
no governo FHC. Com a economia
brasileira sendo vista como uma das
que mais poderiam aproveitar-se
do processo de globalização, foi possível chamar o setor privado para
assumir o controle de empresas como a Vale, a Telebrás, as grandes siderúrgicas, as empresas petroquímicas, a Embraer e outras menores.
O objetivo principal desse movimento estratégico era dotar as empresas de capacidade financeira e
gerencial para expandir suas atividades e enfrentar a crescente competição mundial, com benefícios
para o país.
Como subproduto desse programa, o governo poderia obter uma
redução da dívida pública do governo federal, parte dela criada no passado para sustentar os grandes prejuízos dessas mesmas empresas. Cito como exemplo o aporte de mais
de US$ 20 bilhões, feito nas empresas siderúrgicas antes da privatização, para compensar seu patrimônio líquido negativo em razão dos
prejuízos altíssimos do passado.
Eram os chamados esqueletos, a
maioria deles criada ainda na época
dos militares e escondida em câmaras frigoríficas no Tesouro. O governo FHC teve a coragem de trazê-los
à luz.
Mas não poderia terminar estas
minhas reflexões sem citar um
exemplo exitoso de uma ex-estatal
brasileira: a Embraer. A empresa
tem hoje mais de 18 mil empregados (mais que antes da privatização), exporta bilhões de dólares e é
uma das líderes mundiais desse setor de alto conteúdo tecnológico.
Como isso é possível em um país
pobre como o Brasil?, perguntou-me um economista inglês recentemente. Minha resposta foi simples e
direta. Isso é possível porque o governo fez inicialmente uma escola
de qualidade -o ITA- para criar
uma inteligência na área de aeronáutica. Muitos anos depois, quando já havia massa crítica de conhecimento, foi criada uma empresa estatal para acumular conhecimento no
campo da produção de aviões. E, finalmente, quando a empresa já produzia aviões, foi privatizada para
que tivesse condições de enfrentar
seus concorrentes estrangeiros.
Essa é a receita de bolo que serviu
para que antigas estatais, criadas
quando não havia condições para
uma empresa privada assumir essa
responsabilidade, transformassem-se em empresas fortes e competitivas, mudando o rumo de nossa economia e contribuindo para o desenvolvimento nacional. A privatização
foi a última e crucial etapa desse
ciclo.
LUIZ CARLOS MENDONÇA DE BARROS, 63, engenheiro e
economista, é economista-chefe da Quest Investimentos.
Foi presidente do BNDES e ministro das Comunicações
(governo FHC).
lcmb2@terra.com.br
Texto Anterior: Foco: Metalúrgicos param 46 empresas de SP por 2 horas em "greve canguru" Próximo Texto: Vinicius Torres Freire: Doutor Alckmin e Mister Geraldo Índice
|