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VINICIUS TORRES FREIRE
Doutor Alckmin e Mister Geraldo
Tucano torna-se barata tonta da esquerda, ataca "elites" do seu palanque e afunda na mixórdia política da eleição
O QUE SE PASSOU com Geraldo
Alckmin nas derradeiras semanas da campanha eleitoral? O que houve com esse político
um dia ungido pelos homens de empresa, que sempre viveu em odor de
santidade privada? O que sucedeu
ao herói do contribuinte escorchado, o predileto da elite branca?
O leitor, que é perspicaz, terá notado a estranha metamorfose do
doutor Alckmin em mister Geraldo.
Terá percebido que, em uma certa
manhã da campanha eleitoral, ao
despertar de sonhos inquietantes de
derrota, o doutor Alckmin havia se
transformado em uma imensa barata tonta da esquerda de fancaria.
Num populista de segunda. Num representante, real ou de fantasia, da
ira pequeno-burguesa contra ricos e
elites. Num praticante enfim assumido da mixórdia no debate público.
Na noite de quinta-feira, mister
Geraldo despediu-se dos comícios
para entrar na história da demagogia. Mister Geraldo censurou o amor
de Lula por luxos. O renegado Lula
tornou-se o "homem dos banqueiros, parceiro das oligarquias". Mais
alguns dias de campanha e mister
Geraldo faria de seu palanque o patíbulo dos coronéis, o cadafalso dos
pefelistas de proa. ACM e Jorge Bornhausen seriam pendurados nas
cordas. E o que seria feito dos banqueiros filiados ao PSDB? Logo eles,
dos financistas mais esclarecidos.
Doutor Alckmin era o homem do
mercado. Mister Geraldo não privatiza mais. Mister Geraldo não reforma. Não corta gasto. Compromete-se com subsídios irracionais (Zona
Franca). Alckmin poderia dizer cinicamente que se comporta como
guelfo para os gibelinos e como gibelino para os guelfos, se tivesse a graça intelectual do falecido José Guilherme Merquior. Mas nada. "O que
não se parece com nada não existe",
escreveu Valéry, o poeta. Alckmin
não existe, assim como sua campanha ou suas idéias.
No comício, FHC e mister Geraldo ainda apontaram o dedo para
Delfim Netto, o novo "mentor de
Lula". Anátema! Homem da ditadura militar! Sim! Ele e o PFL inteirinho! O PFL, esteio da ditadura, esteio de Fernando Collor, museu vivo
da oligarquia, cúmplice do PSDB no
maior aumento de impostos da história do Brasil desde os tempos da
derrama mineira. O PFL, ninho de
fabricantes e consumidores de dossiês (como ACM), de violadores de
sigilos (como o da votação secreta do
Senado, obra de ACM e José Roberto Arruda, ex-tucano, pefelê eleito
para governar a capital federal). Ficou difícil saber o que é pior: comprar carro usado de Lula ou tomar
anestesia do doutor Alckmin.
O Brasil ora é uma sociedade que
parece agregar identidades e interesses políticos apenas em categorias difusas como "pobres" e "ricos/
elites", embora tais categorias englobem uma enormidade de nichos
de interesses e identidades políticas
e sociais, bem vivas e diferentes.
Muito pouco desses interesses têm
voz no Estado, e cada vez menos por
meio da política partidária, ainda
mais desfigurada nessa eleição.
O embate de Alckmin e Lula foi
outro ato da pantomima do "fim das
ideologias", apesar de a votação ser
socialmente polarizada. As candidaturas convergiram para a burra e
horrenda conservação da ordem,
que inclui tanto o Bolsa Família como a economia "tout court".
vinit@uol.com.br
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