São Paulo, domingo, 28 de fevereiro de 1999

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Recessão corta ganhos do Real

da Reportagem Local

Antes mesmo da desvalorização da moeda em janeiro deste ano, o grau de pobreza, o número de pobres e a concentração de renda já haviam crescido no Brasil em 1998, revertendo a tendência de diminuição do fosso social no país iniciada com o Plano Real.
O mais grave, entretanto, está por vir. Uma projeção feita por Marcio Pochmann, professor do Instituto de Economia da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), mostra que esses indicadores de exclusão social tendem a voltar aos patamares pré-real.
Esse cenário ocorrerá na hipótese de a recessão brasileira implicar uma queda da atividade econômica da ordem de 3,5% do PIB.
Em 1993, um ano após o impeachment de Fernando Collor, o Brasil tinha 44,2% de pobres na sua População Economicamente Ativa com rendimento. O real foi implantado em julho do ano seguinte, e essa proporção caiu para 39,9%.
Os efeitos positivos do controle da inflação se intensificaram ao longo de 1995 e, em 1996, o percentual de pobres na PEA chegou a 31,3% -o mais baixo desde o Plano Cruzado.
A partir de 1997, entretanto, a retração da economia e o aumento do desemprego interromperam esse processo. O resultado é que, em 1998, os pobres já voltavam a ser 33,2% da PEA com rendimentos, totalizando 20,2 milhões de pessoas.
A mesma trajetória foi reproduzida com o grau de desigualdade. A renda dos 10% mais ricos, que era 3,96 vezes maior do que a dos 50% mais pobres em 1994, caiu para 3,61 vezes em 1996. Mas voltou a subir em 1997, chegando a 3,81 vezes em 1998. No cenário de queda de 3,5% do PIB em 1999, a concentração de renda na mão dos 10% mais ricos pode chegar a 4,01 vezes a dos 50% mais pobres -nível comparável ao da recessão de 90 do Plano Collor.
Do mesmo modo, o percentual de pobres deve alcançar o patamar de 43,8% (maior do que o de 1994). Se isso se confirmar, 6 milhões de pobres terão caído abaixo da linha de pobreza ao final deste ano, totalizando 26,2 milhões de pobres.
Em outras palavras, os ganhos sociais do Plano Real terão sido perdidos.
"O programa de ajuste do Fundo é decorrência das políticas de liberalização econômica que o próprio FMI apoiava", critica Pochmann. "Até a crise, o Fundo apoiava o déficit em contas correntes".
Esses impactos sociais poderiam ser diminuídos se o FMI incentivar políticas compensatórias no Brasil -como fez na Coréia, Tailândia e Indonésia. O receituário variou de país para país, mas incluiu incentivos à manutenção de empregos e subsídios para evitar aumentos de preços de tarifas públicas e produtos de largo consumo pelos pobres.
Num documento escrito para as Nações Unidas, dois economistas coreanos -Jong-Wha Lee e Changyong Rhee- afirmam que as medidas sociais devem mirar o grupo de pobres, em vez de maximizar os beneficiários. Os autores se referem aos países asiáticos, mas sua conclusão também se aplica ao Brasil. Afinal, foi devido em grande parte ao voto dessas pessoas que Fernando Henrique Cardoso conseguiu se reeleger. (JRT)


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