São Paulo, quarta-feira, 28 de abril de 2010

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ALEXANDRE SCHWARTSMAN

Importação do B


Pode parecer paradoxal, mas as importações crescem muito porque o Brasil importa pouco


EM 2010 (até a semana passada), as importações brasileiras aumentaram quase 40% relativamente ao mesmo período de 2009. Na verdade, sempre que a economia brasileira passa por um período de expansão acelerada, as importações aumentam por um múltiplo da taxa de crescimento, motivando um dos 17 leitores do meu blog (que espero não serem os mesmos 17 leitores desta Folha) a me perguntar a razão desse comportamento. Refletiria isso uma incapacidade congênita do país, associada às dificuldades da estrutura produtiva, de responder ao crescimento da economia? Acredito, porém, que a resposta seja bem mais simples. Pode parecer paradoxal, mas as importações crescem muito porque o Brasil importa pouco.
Caso reste algum leitor depois dessa afirmação, eu explico. Imagine duas economias (B e C) idênticas em tudo, exceto em seu volume de comércio internacional. Em ambas, o PIB vale 100 unidades e a demanda doméstica equivale às mesmas 100 unidades. Só que na economia B as exportações e as importações são de 10 unidades, enquanto na economia C atingem, cada uma, 50 unidades.
Suponha agora que a demanda doméstica em ambos os países aumente 5%, de 100 para 105 (por enquanto manteremos o PIB constante). Para equilibrar demanda e oferta, B precisa importar 15 (um aumento de 50%!), enquanto C importará 55, ou seja, apenas 10% a mais. Embora nos dois casos a resposta absoluta das importações à demanda doméstica seja a mesma, o crescimento percentual das importações na economia mais fechada ao comércio internacional é muito maior.
Uma conta simples mostraria que a elasticidade da importação (a reação percentual da importação à demanda doméstica) no país B seria 10 (50% de aumento das importações para 5% de expansão da demanda), enquanto no país C seria apenas 2 (10% ante os mesmos 5%). Assim, um economista pouco atento poderia até concluir (erradamente, como se vê) que a economia B sofreria de sérias "deficiências estruturais" e recomendar um tanto a mais de proteção à indústria local para que possa resistir à "invasão das importações".
Parece que o argumento depende crucialmente da suposição de um PIB constante, mas é fácil ver que não se trata disso. Imagine, por exemplo, que nos dois países apenas 30% do crescimento da demanda seja atendido por importações (ou seja, 1,5 unidade), enquanto os 70% restantes vêm da produção local. Sob essa suposição, o PIB nos dois países passaria a 103,5, enquanto as importações no país B atingiriam 11,5 (crescimento de 15%), e, no país C, 51,5 (3% a mais).
As respectivas elasticidades seriam 3 (15% de importações ante 5% de demanda) e 0,6 (3% ante 5%), ou seja, ainda seria quatro vezes maior em B do que em C, provavelmente o bastante para "justificar" os pedidos de proteção.
No entanto, acredito que o exemplo simples explorado nos parágrafos seja suficiente para que o escasso leitor se convença do cerne do argumento. Mesmo que uma fração relativamente reduzida do aumento da demanda doméstica seja destinada às importações, no caso de uma economia pouco aberta ao comércio internacional isso se traduzirá num enorme crescimento proporcional das importações, necessário para cobrir a diferença entre a demanda interna e a produção local.
Vale dizer, quanto mais fechada for uma economia, maior é a necessidade de apreciação cambial quando a demanda doméstica cresce a taxas muito superiores às do produto. Com a demanda crescendo a 10% ao ano e meros 11% do PIB em importações, parece-me que o comportamento da taxa de câmbio no Brasil faz bastante sentido.

ALEXANDRE SCHWARTSMAN, 47, é economista-chefe do Grupo Santander Brasil, doutor em economia pela Universidade da Califórnia (Berkeley) e ex-diretor de Assuntos Internacionais do Banco Central.

Internet: http://www.maovisivel.blogspot.com/

alexandre.schwartsman@hotmail.com



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