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Banco Central e
Fazenda divergem na turbulência
Recompra de papéis pelo Tesouro e falta de ação da autoridade monetária para conter dólar são contestadas
Críticos dizem que governo não tem que atenuar risco de investidores com resgate de títulos e que papel do BC é evitar volatilidade
SHEILA D"AMORIM
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
O primeiro teste da nova
equipe econômica diante da
mudança de humor no cenário
internacional foi marcado por
um descompasso entre as atuações do Ministério da Fazenda
e do Banco Central. A preocupação em não deixar na mão investidores estrangeiros que
vieram ao país aplicar em títulos prefixados de longo prazo
levou o Tesouro Nacional a recomprar os papéis daqueles
que queriam deixar o Brasil.
Essa atuação acabou pressionando a cotação do dólar, o que,
na avaliação de analistas, deveria ter sido atenuado pelo BC
-o que não ocorreu. Resultado:
a moeda chegou a R$ 2,40 na
quarta, e a semana foi marcada
por perdas na rentabilidade de
muitas aplicações financeiras.
Um dos técnicos envolvidos
na avaliação do que foi feito disse à Folha que o prejuízo doeu
fundo em muita gente, mas que
não houve, na atuação do Tesouro, o objetivo de evitar perda para o investidor. Foi apenas para atender uma procura
pela troca de títulos públicos.
Questionado sobre a operação, Carlos Kawall, secretário
do Tesouro, disse que foi feita
porque "o mercado perdeu a
referência de preço com a volatilidade [no preço dos títulos],
causada pela baixa liquidez".
A atuação do Tesouro dividiu
opiniões dentro e fora do governo. Enquanto uns defendiam que os investidores sabem o risco que correm e, portanto, o governo não tem que
atenuar prováveis prejuízos em
momentos de turbulência, outros argumentam que o papel
do BC é evitar uma volatilidade
excessiva, que só prejudica a
credibilidade do país.
De um lado, a grande preocupação dentro do governo era
não comprometer um mercado
novo que começou a se desenvolver neste ano, após a equipe
econômica isentar do pagamento do IR (Imposto de Renda) os estrangeiros que aplicarem em títulos públicos. Como
são investidores com perfil diferente dos nacionais -eles demandam papéis mais longos-,
os estrangeiros são importantes para mudar o perfil de financiamento da dívida pública
brasileira, que ainda é muito
concentrada no curto prazo.
Do outro lado, segundo a Folha apurou, havia uma interpretação de que uma atuação
mais forte do BC no câmbio na
semana passada dificultaria a
definição dos juros na reunião
do Copom (Comitê de Política
Monetária do BC), marcada para começar na terça. Isso porque o BC ficaria mais inseguro
em relação ao patamar que o
câmbio se estabilizará diante
das mudanças de humor no cenário internacional.
Os investidores estrangeiros
são fortes compradores de títulos corrigidos pelo IPCA com
prazo de vencimento até 2045.
Quanto mais longo o título,
mais difícil é repassá-lo em período de estresse e, portanto,
maior o prejuízo. Como esse
mercado de longo prazo está
começando no Brasil, os papéis
são pouco negociados fora dos
leilões tradicionais que o Tesouro faz semanalmente.
Diante da falta de liquidez,
em momentos de crise, o dono
do papel tem que aceitar um
preço desfavorável se quiser se
desfazer do título e sair do Brasil. Foi isso o que aconteceu.
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