São Paulo, domingo, 28 de maio de 2006

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TAM tem interesse pela Varig, mas não quer riscos

Companhia vê como "dever de ofício" olhar para oportunidades de crescimento

Marco Antônio Bologna diz que faltam informações sobre a aérea a poucos dias do seu leilão e que governo deve assumir posição oficial

MAELI PRADO
DA REPORTAGEM LOCAL

Uma série de questões ainda em aberto dificultaria hoje a venda da Varig para a TAM, uma das interessadas em potencial no negócio: a pouco mais de uma semana do leilão, ainda não foram divulgados detalhes sobre as condições da venda e não houve uma manifestação formal do governo sobre os riscos de um comprador ser acionado no futuro para pagar as dívidas da companhia. "O que posso garantir é: a TAM não fará nada que tenha risco sucessório. Você entrar em um risco "quarto escuro" é complicado. Mas, se houver um risco quantificável e dentro da precificação, é outra a análise", afirma Marco Antônio Bologna, presidente da TAM. Em conversa com a Folha, ele ressaltou que a companhia tem interesse na Varig pelo "dever de ofício" de olhar oportunidades de crescimento. Líder de mercado -neste mês a TAM ultrapassou a Varig em número de passageiros transportados somados os vôos domésticos e internacionais-, a companhia tem como desafio enfrentar a concorrência da Gol em um mercado de demanda crescente. Esta, segundo Bologna, só ultrapassará a empresa em participação de mercado "se a TAM entrar em férias coletivas". Acompanhe abaixo trechos da entrevista.  

FOLHA - A TAM se tornou neste mês a maior companhia do Brasil. A posição de líder é confortável? MARCO ANTÔNIO BOLOGNA - A situação do líder nunca é confortável. A única certeza que você pode ter é que alguém quer o seu lugar. Pelo contrário, é posição de muito mais responsabilidade, do ponto de vista de atitude da companhia, de muito mais responsabilidade, de muito mais humildade, dentro do que o Rolim [comandante Rolim Amaro, ex-presidente da TAM] nos deixou e também por ser uma companhia aberta. Isso significa o que já fazemos há alguns anos, que é busca por eficiência e aumento contínuo e obsessivo por redução de custos. Nossa estratégia é ser uma companhia de custo o mais baixo possível e de oferecer um serviço diferencial para o passageiro TAM, que é formado por 70% de executivos.

FOLHA - O fato de a Gol ser a principal concorrente da TAM reforça a redução de custos? BOLOGNA - Com certeza. O concorrente que temos hoje é saudável, ambas as companhias têm administrações que perseguem resultados. É um concorrente que tem um modelo diferente do nosso, a proposta da Gol é mais baseada no "low cost, low fare" [baixo custo, baixa tarifa], que leva a um custo inferior, pelo modelo, e é o que nos faz acordar mais cedo. Usando o 7º mandamento da TAM, a gente aprende que, se não tem capacidade para criar, tem que ter capacidade para copiar. Existe um referencial hoje publicado, auditado, de qual o menor custo possível de uma companhia brasileira para operar. E você vê o diferencial de acordo com o seu modelo de negócio, para manter fidelidade ao seu modelo de negócios.

FOLHA - Os números da Anac [Agência Nacional de Aviação Civil] deste ano mostram que o que a Varig perdeu de demanda foi proporcionalmente o que a Gol, que tem mais oferta disponível, ganhou. Faltou ousadia para a TAM no planejamento de frota? BOLOGNA - A TAM deu um pulo de dez pontos percentuais de 2004 para 2005. No jogo de "market share" ao longo de 2004 e 2005, você teve perdas de "market share" de duas companhias: da Vasp, que saiu do mercado, e da própria Varig, que já estava perdendo "share". Nesse período, a TAM levou dois terços dessa perda de "market share", e a Gol levou um terço. Isso porque ambas, tanto TAM quanto Gol, estavam ofertando, e continuam ofertando. Não é verdade que só a Gol planejou, nós também planejamos. Tanto que neste ano estamos trazendo 13 aviões e aumentamos a utilização dos aviões. A Gol está trazendo neste ano 13 aviões. O crescimento deles relativamente é maior. Quando você olha a base de comparação deste ano, ou seja, até maio de 2005, a TAM estava em um "code share" [compartilhamento de vôos], quando saiu do "code share" demos um salto na oferta.

FOLHA - Quando se olha o planejamento de frota da TAM e o da Gol e a utilização das duas companhias, a Gol vai passar a TAM em dois anos em participação de mercado. BOLOGNA - Isso se a TAM não fizer nada. A resposta que eu dou é que isso só é possível se a TAM entrar em férias coletivas. A TAM não abre mão da liderança. Só damos informação quando os fatos são concretos. A frota da TAM em 2006 no mínimo será de 90 aviões, não significa que não podemos mudar isso em razão das flexibilidades que temos na nossa frota. Temos, além do que está divulgado, 20 opções e 20 vencimentos que podem ser renovados.

FOLHA - A TAM negocia hoje com a Embraer a aquisição do avião 190, mas a companhia tem uma frota de Airbus. O que adquirir o 190 pode ter de vantagem, já que ter frota do mesmo fabricante é mais barato? BOLOGNA - A estratégia da TAM é ter uma frota moderna, que aliás é a mais moderna do Brasil, apesar de a empresa ter 30 anos de existência. Agora estamos em processo de renovação, vamos terminar 2006 com 18 Fokkers-100, de 50 que já tivemos, e chegou o momento de substituí-los até final de 2008. Ainda estamos em processo de avaliação, que leva em conta para a própria definição dessa malha o custo operacional, o custo de logística e de tripulação desses equipamentos. O quarto item que é importante é o financiamento e o preço. É a combinação de todos esses fatores que vai nos dar a melhor solução para substituição desse avião. Vamos anunciar a escolha até o final do mês que vem.

FOLHA - A Varig está à venda. A TAM está interessada em comprar? BOLOGNA - A estratégia da TAM em seus 30 anos é crescer. Saímos de uma pequena regional e hoje somos líder do mercado. Nossa estratégia é de crescimento, baseada na nossa proposta de produto. Quando você tem uma oportunidade, qualquer que ela seja, é nosso dever de ofício avaliar essa oportunidade e ver se você antecipa seu crescimento de alguma forma. Isso obviamente tem que ser feito com muito juízo, com muita responsabilidade. Temos que ter, do ponto de vista jurídico, uma solidez suficiente nos aspectos sucessórios. Isso é muito importante, principalmente para uma companhia como a nossa, aberta. Outro ponto é comprar a preço justo. Temos que ter uma opinião de terceiros que nos cubram e que nos digam se estão cobrando um preço justo.

FOLHA - E o preço está justo [o preço mínimo pelas operações domésticas é US$ 700 milhões]? BOLOGNA - Não foi divulgado o edital de licitação, portanto não conseguimos saber as condições de pré-qualificação para esse edital, e não foi aberto o data room [disponibilização de informações confidenciais sobre a empresa] para a gente fazer uma avaliação. Então é prematuro dizer se o preço está certo ou errado. Precisaríamos ter acesso ao data room e às condições do edital para poder tomar um posicionamento do leilão. Não sei se a Varig vem sem dívidas, com dívidas, quais os compromissos contratuais que têm que ser mantidos em relação a dívidas passadas, os compromissos operacionais, os compromissos do ponto de vista de empregabilidade. Oficialmente ainda não tivemos acesso a nada.

FOLHA - Há risco de sucessão? BOLOGNA - A lei é nova. Está se buscando uma blindagem, e o grande fator de blindagem é um chapter 11 [concordata] diferente dos de outros países. Normalmente ocorre quando o credor é privado, mas aqui estamos falar que o principal credor é o credor público, que tem que se manifestar se tem ou não sucessão.


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