São Paulo, quarta-feira, 28 de maio de 2008

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VINICIUS TORRES FREIRE

Lula e o vaivém dos impostos


Patrocínio mal disfarçado da recriação da CPMF mostra como funciona a política fiscal de Lula: é pura política

O PRESIDENTE reclamou que os empresários não repassaram para os preços a redução de custo decorrente do fim da CPMF.
Lula desconfia do destino que o mercado dá a isenções fiscais, planejadas ou não. O que pensa sobre isenções de impostos concedidas voluntariamente por seu governo?
Lula acaba de baixar sua nova política industrial, que em boa parte consiste de desconto de impostos. Empresas podem comprar máquinas novas sem pagar alguns tributos.
O objetivo não é, claro, levar o empresário que investiu a cobrar menos pelos produtos que virá a produzir, dado que seu investimento saiu mais em conta. A intenção é baratear o investimento, é criar um incentivo adicional para a compra de máquinas e equipamentos.
Mas como o governo sabe que o empresário deixaria de fazer o investimento caso não obtivesse a isenção fiscal? Não tem como saber muito bem. Como não teria condição de saber se empresários baixariam preços caso tivesse promovido uma isenção setorial de impostos, CPMF ou outro, com esse fim. A redução de preços dependeria da demanda, do grau de concorrência em cada mercado, de como o setor é afetado pelo comércio exterior etc.
"Na margem", como dizem os economistas, algum investimento novo será realizado devido à isenção fiscal. Uma certa quantidade de investimentos ocorreria de qualquer modo, dadas as condições de demanda, câmbio e outros preços etc. (e o empresário poderia embolsar o ganho com a isenção fiscal). Mas outros investimentos poderiam estar na marca do pênalti: não seriam rentáveis e, pois, viáveis, sem a isenção fiscal.
Mas esse é apenas o início do problema. Ao longo de décadas de confusão e excessos tributários, centenas de leis criaram um incentivo fiscal aqui, outro ali, para setores diferentes. Já não se sabe quem está sendo incentivado, com quais objetivos e efeitos. Para piorar, a depender da variação das condições macroeconômicas e setoriais, os incentivos podem estar no lugar errado.
Sim, seria ingenuidade cretina e/ ou maluca imaginar que é possível controlar todos os efeitos de políticas públicas. Mas é mais fácil avaliar o resultado da isenção de impostos se a política é mais localizada, se seus objetivos são específicos.
De resto, além das condições macroeconômicas e de cada mercado, o investimento depende de regulação, de custos em outras partes da economia (inclusive impostos), da infra-estrutura etc. Enfim, se o governo aumenta tributos em geral, pode anular o efeito da isenção setorial.
Ou pode redistribuir renda, de quem paga um imposto para os isentos, sem atingir objetivos de interesse geral, como acelerar o investimento.
Lula ainda não digeriu a derrota do fim da CPMF. Uma semana após renegar a paternidade do projeto de recriação do imposto sobre movimentação financeira, queixa-se em público de que a oposição lhe tirou a CPMF. Deixa rolar a articulação de sua coalizão partidária para criar um sucedâneo do imposto. Há gente, como este colunista, que era contra o fim da CPMF (desde que o excesso de arrecadação abatesse dívida pública). Mas falta coerência fiscal e tributária a esse governo que cancela impostos num dia e que quer inventar um novo noutra semana.

vinit@uol.com.br


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