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LUÍS NASSIF
O BC e a espiral da inadimplência
A espiral da inadimplência
na economia é fruto de uma
inconsistência sistêmica, que
não vai ser refreada enquanto
o Banco Central não assumir
seu papel e convocar o sistema
de crédito -bancos, financeiras, redes de lojas- para uma
discussão aberta sobre a questão.
A ciranda da inadimplência
é fruto da seguinte (i)lógica:
1) Um agente financiador
identifica uma taxa de inadimplência de, digamos, 5%
na sua carteira. Ele registra o
prejuízo e repassa para os demais clientes, de maneira a
preservar sua receita.
2) Ao repassar, há um aumento nas taxas de juros dos
financiamentos novos ou renovados, gerando uma segunda rodada de inadimplência.
3) Procede-se a um novo
ajuste nas taxas, levando a
uma terceira rodada da inadimplência entre os sobreviventes. Até que o jogo se esgota e as Arapuãs da vida começam a estourar e a crise se
estende para o país como um
todo.
Os números não são de brincar, e explicam essa indecência de cheque especial cobrando taxas superiores a 10% ao
mês.
1) Suponha uma carteira de
financiamentos, com mil
clientes, a um prazo médio de
seis meses, rodada a 3% ao
mês ou 42,6% ao ano.
2) Na primeira rodada, há
uma inadimplência de 5%.
Para compensar a inadimplência, a instituição passa a
dividir a receita anterior não
por mil, mas por 950 clientes.
Resulta daí um aumento imediato da taxa de juros para
5,2% ao mês, ou 83,7% ao ano
-quase o dobro.
3) Com taxas mais altas, aumenta a inadimplência. Se ela
subir para 15%, as taxas mensais têm que saltar para 10,5%
(231% ao ano) apenas para o
banco manter a mesma receita.
Autofagia
É uma lógica autofágica, mas
previsível, que não vai ser interrompida individualmente por
nenhuma instituição -daí a importância da coordenação do BC.
Sempre que ocorrem crises de
inadimplência, nenhum banco
quer ser o primeiro a reduzir as
taxas. A lógica é que se um banco
afrouxa os juros, os reais a mais
que ficarem com o cliente serão
utilizados para quitar a fatura
do banco que não negociou.
Isso fica claro nas grandes concordatas. Só se chega a um acordo quando ocorre a mediação e
todos os bancos concordam em
reduzir os juros simultaneamente, para que nenhum espertalhão
se aproveite.
Nessa grande concordata que se
instaurou na economia, ninguém
cuida desse processo. Não existe
um Banco Pactual para juntar os
credores e buscar uma solução
global para os devedores. Esse
papel tem que ser desempenhado
pelo BC. É responsabilidade intransferível.
Se o presidente da República
quiser tratar de frente um dos
maiores problemas da economia,
e fatores de desgaste de seu governo, basta ordenar ao BC que
se esqueça alguns momentos dos
grandes agregados econômicos e
assuma sua responsabilidade de
cortar esse nó górdio das taxas
escorchantes de juros.
Universidade e privilégios
Se depender da Andifes (Associação Nacional dos Dirigentes
das Instituições de Ensino Superior) ou da Andes (Associação
Nacional dos Docentes de Ensino
Superior) não se vai chegar a um
consenso sobre o acordo com o
governo.
Sucessivos planos econômicos
permitiram que muitos docentes
ingressassem na Justiça, solicitando aumentos por supostas
perdas salariais.
Nessa caminhada, houve dois
tipos de comportamento das universidades. Nas universidades sérias, os procuradores defenderam
adequadamente o setor público e
os aumentos não se consumaram. Nas universidades irresponsáveis, correu o conluio entre as
partes, o Estado não foi defendido adequadamente, resultando
daí distorções salariais enormes.
Já existem propostas que visam
acabar com a crise, surgidas do
próprio movimento. Mas a Andifes não está disposta a esclarecer
esse jogo: pretende que os prejudicados sirvam de álibi para a
manutenção dos privilégios.
E-mail: lnassif@uol.com.br
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