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OPINIÃO ECONÔMICA
Orçamento: corrupção, desinformação e sensacionalismo
MAILSON DA NÓBREGA
O caso das obras do TRT de
São Paulo mostra como estamos longe de uma percepção
adequada sobre o funcionamento
do processo orçamentário brasileiro.
Isso é reflexo da pouca seriedade que se devota no Brasil às finanças públicas. Aprovar um Orçamento impositivo é a principal
função do Parlamento, mas aqui
o Executivo e o Legislativo aceitam que se trata de uma peça autorizativa.
Há menos de 15 anos, havia
quatro Orçamentos e somente um
passava pelo Congresso. O mais
importante, o Orçamento Monetário, OM, era aprovado pelo
Conselho Monetário Nacional,
CMN, que também decidia sobre
a expansão da dívida pública.
A demanda por assentos no
CMN era proporcional aos seus
poderes. O Conselho, que hoje tem
três membros, chegou a abrigar
cerca de 30, com representantes
dos trabalhadores, do comércio,
da indústria etc. Até parlamentares, pasmem, pediram para participar. Recentemente, foi a vez de
um procurador.
Entre 1986 e 1988, o Orçamento
foi unificado. A expansão da dívida passou a depender do Congresso. Desapareceram os canais
por onde fluíam os recursos do
OM: a "conta de movimento" do
Banco do Brasil e a área de fomento do Banco Central.
Apesar desses avanços institucionais, ainda é grande a desinformação sobre o Orçamento.
Muitos ainda se pautam pela visão do primitivismo institucional
anterior. Acredita-se que o Poder
Executivo -que mandou e desmandou na matéria- tem ilimitada capacidade de perceber irregularidades.
Por isso, pareceu fácil inquinar
de suspeito o encaminhamento de
um projeto de suplementação orçamentária para a obra do TRT,
que dificilmente poderia merecer
reparos sob o ângulo técnico e formal.
O governo esclareceu como funciona o processo. Invocou a Constituição e exibiu decisão do STF,
que fixa critérios para encaminhamento de projetos do Judiciário. Em vão, como se viu. Houve
até quem se vangloriasse de ter
desmontado a "ficção" do Planalto.
Corrupção e fisiologismo existem em todo lugar. Nos EUA, pátria de um dos mais transparentes
processos orçamentários, é comum o exercício aberto do
"lobby" e a aprovação de emendas para atender a interesses eleitorais dos parlamentares.
O governo japonês aumentou
substancialmente a dívida pública para o equivalente a US$ 6 trilhões, 130% do PIB, com o objetivo, entre outros, de executar
obras públicas para retirar a economia da depressão.
É voz corrente que certas obras
beneficiaram pequenos e médios
empreiteiros, enquanto os grandes ficaram com a duvidosa expansão do trem-bala para zonas
menos populosas, como as de Tohuko e Kyushi. Todos apóiam o
PDL, o partido no poder.
Esses casos não costumam gerar
superfaturamento nem roubalheira, como se tem visto infelizmente no Brasil. Por quê?
A explicação está nos serviços
de controle interno e auditoria.
Um deputado americano, um ministro inglês ou um burocrata japonês podem contribuir para
criar ou suplementar uma verba
orçamentária, de acordo com seu
próprio interesse ou com o de grupos de pressão.
Ainda que muitas dessas ações
possam ser condenáveis sob o
prisma social e ético, elas raramente resvalam para a corrupção. A fiscalização do uso dos recursos é rigorosa e eficaz.
Esse é o nó da questão no Brasil.
Os anões do Orçamento não passariam de políticos sem cultura de
responsabilidade fiscal se os recursos gerados por suas emendas
tivessem sua aplicação adequadamente controlada e auditada.
No caso das obras do TRT, mesmo que as verbas tivessem sido
aprovadas sob a pressão de interesses escusos -o que não está
provado-, sua utilização desonesta não resistiria a um bom serviço de fiscalização.
O controle interno no setor público evoluiu quase nada no Brasil. Apesar do esforço de alguns,
esse serviço ainda se move por
uma visão essencialmente formal.
A auditoria padece do mesmo
mal. Passaram-se seis anos entre
os indícios de irregularidade nas
obras do TRT e a denúncia do
Tribunal de Contas da União.
A corrupção existe no setor público e no setor privado. O que
distingue um do outro é a capacidade dos respectivos serviços de
controle interno e de auditoria
externa para investigar, descobrir
e punir desvios de comportamento.
Um duvidoso ímpeto investigativo tem gerado denúncias até
aqui improcedentes. Poder-se-ia
fazer mais para combater a corrupção se, em vez do sensacionalismo, houvesse uma preocupação séria em questionar a maneira como se fiscaliza a execução
orçamentária.
Seria o caso de questionar também como o Judiciário tem utilizado a autonomia orçamentária
que a Constituição de 1988 lhe garantiu.
Mailson da Nóbrega, 58, ex-ministro da
Fazenda (governo José Sarney), sócio da
Tendências Consultoria Integrada, escreve às sextas-feiras nesta coluna.
E-mail - mailson@palavra.inf.br
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