São Paulo, domingo, 28 de agosto de 2005

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"RISCO-MENSALÃO"

Levantamento mostra que apenas 3,7% dos textos trataram de "contaminação" nas economias vizinhas

Mídia internacional ainda vê crise como problema interno

MAELI PRADO
DE BUENOS AIRES

A crise gerada pelas denúncias de corrupção no Brasil ainda é apresentada pelos maiores jornais de todo o mundo principalmente como um fenômeno com efeitos apenas sobre a política e economia internas.
Começam a aparecer nas últimas semanas, porém, mais textos e editoriais expressando preocupação com o impacto que a conjuntura brasileira pode ter na economia regional.
Essa é a conclusão de um levantamento realizado a pedido da Folha à Global News, empresa argentina que monitora meios de comunicação de 47 países.
Segundo a pesquisa, feita por amostragem em 23 jornais da América Latina, da Europa, dos EUA e do Canadá, entre os dias 1º e 23 de agosto, apenas 3,7% dos textos sobre a crise política brasileira nesse período trataram da possível "contaminação" das economias da América Latina.
A maior parte, 68,7% dos textos, apresentou as denúncias como algo restrito à política interna. O restante, cerca de 28%, foi sobre a crise e a economia brasileira, sem mencionar os possíveis impactos em outros países.
Mesmo as reportagens falando sobre os possíveis efeitos da crise no Brasil sobre a economia da América Latina começaram a surgir a partir do dia 19 deste mês, quando o advogado Rogério Tadeu Buratti, 42, ex-assessor de Antonio Palocci Filho na Prefeitura de Ribeirão Preto, afirmou que o atual ministro da Fazenda recebia R$ 50 mil por mês de uma empreiteira privada quando era prefeito, entre 2001 e 2002.
Das 11 reportagens que relacionam a crise brasileira à economia da região analisadas pela Global News, 9 foram publicadas após as denúncias envolvendo Palocci.
"Nos primeiros textos, observa-se o tratamento da crise política no Brasil como um fato de corrupção, com efeitos sobre a política interna. Depois começa a se dizer que afeta a economia interna, e posteriormente, nos últimos textos, um pouco mais sobre o possível impacto sobre a economia regional", diz Laura Garcia, presidente da empresa Global News.
No último domingo, o jornal espanhol liberal "La Vanguardia", por exemplo, publicou um texto intitulado "Brasil põe em alerta a América Latina". "A brilhante trajetória que estão desenvolvendo nos últimos anos as economias latino-americanas, em geral, e a brasileira em particular, poderia experimentar algum tropeço se a instabilidade política se apoderar do Brasil", afirma o texto.
Segundo o levantamento da empresa, os jornais "Financial Times", do Reino Unido, e o argentino "Clarín" foram os que publicaram mais textos sobre o impacto nas economias de países latino-americanos: dois cada um.

Vizinho
Na Argentina, a preocupação com os efeitos da conjuntura brasileira já apareceu até no último informe trimestral do Ministério da Economia. A crise política brasileira é colocada como um dos riscos atuais à economia do país vizinho.
O efeito imediato da crise sobre a economia da Argentina, entretanto, vem sendo positivo, pelo menos no curto prazo.
Isso porque a turbulência no Brasil vem ajudando o governo argentino a manter o peso desvalorizado ante o dólar, o principal objetivo da política econômica da Argentina atualmente. Nas últimas semanas, o banco central do país reduziu suas intervenções no mercado em parte por causa da turbulência no Brasil. Com menor oferta de dólares, a moeda americana se valorizou e o governo comprou menos no mercado.

Alertas
O britânico "Financial Times", importante formador de opinião em todo o mundo, foi o único jornal, entre os pesquisados pela Global News, que deu uma conotação negativa à crise no Brasil em todas as matérias pesquisadas pela Global News.
Na edição do dia 23 de agosto, o diário publicou um editorial alertando, entre outras coisas, para o fato de que dentro do PT o apoio a uma política econômica conservadora diminuiu.
"Os investidores deveriam se preocupar mais com o impacto a longo prazo sobre a governabilidade. As reformas econômicas estancaram. As investigações do escândalo estão ocupando totalmente as duas casas do Congresso e dificultando para o governo levar adiante até mesmo reformas modestas, como iniciativas para simplificar o sistema fiscal para as empresas", diz o texto.
No mesmo dia, quando o dólar no Brasil subiu mais de 1%, outro importante formador de opinião, o americano "Wall Street Journal", afirmou em sua versão na internet que a crise política no Brasil determinou a baixa das Bolsas latino-americanas.

Neutralidade
De todos os textos sobre a crise política no Brasil publicados nesse período nos 23 jornais analisados -somando os textos sobre política interna, economia interna e efeitos sobre a economia regional-, a maior parte, 70,2%, deu um tratamento neutro para o assunto.
Em 25,3% dos textos, o tom foi negativo, e, em 4,4% deles, o tom foi positivo.
No período analisado pela Global News, os jornais que publicaram a maior quantidade de textos sobre a crise foram os mexicanos, respectivamente o "Milenio" e o "Reforma".


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