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OPINIÃO ECONÔMICA
Guerra fiscal: quem vence, afinal?
DAGOBERTO LIMA GODOY
O que os investidores procuram e valorizam, quando buscam um local adequado para
seu empreendimento, além de
outros fatores estratégicos, como localização, "capital humano" e cultura de valorização do
trabalho, todos esses fora do alcance das administrações estaduais do momento? O que, afinal, um governo, interessado
em atrair (e reter) investimentos geradores de empregos e de
desenvolvimento, pode oferecer como política eficaz de atrativos?
A resposta decerto é pacífica
em um ponto: infra-estrutura
econômica e social provedora
de facilidades logísticas, apoio
operacional e qualidade de vida.
Estranhamente, há muita dificuldade em aceitar que a outra
oferta decisiva esteja no campo
tributário, donde toda a polêmica sobre a chamada "guerra fiscal" entre Estados. Mas será tão
difícil compreender que, diante
da voracidade arrecadadora dos
governos e de um sistema tributário vulnerável à sonegação, os
incentivos tributários adquiram
até preponderância, como diferencial competitivo? Tanto é assim que a oferta de vantagens
tributárias é uma prática corrente mundo afora, inclusive
nos Estados Unidos, na disputa
por investimentos produtivos.
A questão fica confusa pela
forma como geralmente é posta,
como se apenas as empresas
fossem beneficiadas, em detrimento da população. Mas esta,
além de ter o maior interesse no
impulso que os investimentos
dão à atividade econômica e ao
mercado de trabalho locais, deve também preferir os governos
que se esforçam por oferecer
mais, cobrando menos impostos. Pois, para estimular essa desejada produtividade governamental, nada como estabelecer
a comparação entre as administrações estaduais, isto é, estender também ao setor público o
estímulo salutar da competição,
que todos aprenderam a exigir
das atividades privadas, sejam
elas das empresas ou dos profissionais liberais, dos esportistas
ou até dos artistas.
Assim, a solução para os malefícios atribuídos à "guerra fiscal" entre Estados brasileiros
não virá do Confaz, que tem todo o jeito de um cartel de cobradores de impostos, mas só será
obtida com uma verdadeira reforma tributária, que, de forma
estrutural, impeça que o governo de um Estado, ao conceder
incentivos, "faça cumprimentos
com os chapéus dos outros".
Nas últimas semanas, a polêmica concentrou-se em torno
dos incentivos concedidos pela
União para a instalação da planta da Ford na Bahia. Creio que,
por detrás das críticas a casuísmos e exageros que estariam
contidos na medida, estão duas
razões que devem ser repelidas,
por não interessar ao país.
A primeira é a dos governantes comodistas, que pretendem
entrincheirar-se no Confaz, para cartelizar sua sanha arrecadatória e uniformizar a derrama,
que já sangra quase um terço de
tudo o que se produz no Brasil.
Se os incentivos forem proibidos, os empreendedores não terão como escapar da sangria,
pelo menos dentro do território
nacional. Por exemplo, o atual
governo gaúcho -depois de
romper o contrato que trouxera
a Ford para o Rio Grande do
Sul, contestando os incentivos
contratados pelo governo anterior- apostava que a montadora não instalaria a planta em
nenhum outro Estado brasileiro. Parecia até torcer por isso.
A segunda vem das regiões
hegemônicas, equivocadamente aferradas à centralização econômica que as privilegiou, em
detrimento das áreas periféricas
e do desenvolvimento harmônico do país. Veja o caso de São
Paulo, beneficiado há mais de
quatro décadas pelo atual sistema tributário por uma perversa
transferência de renda, propiciada pelo mecanismo do ICMS
na origem, ou seja, arrecadado
majoritariamente no local da
produção dos bens, não importa se consumidos em outro Estado. Soam mal, assim, aos ouvidos de quem tem um verdadeiro sentimento nacional, as
críticas vindas dos paulistas, toda vez que um Estado da periferia industrial apela para uma
política mais agressiva de incentivos, na luta por sua industrialização (como faz agora a Bahia).
Enquanto isso São Paulo fecha-se em si mesmo. Feitas bem as
contas, a verdade é que São Paulo está vencendo de goleada a tal
"guerra fiscal".
O que temos a fazer é lutar por
uma verdadeira reforma tributária -como a proposta pelo
deputado Luiz Roberto Ponte-, que impeça a concorrência predatória e as retaliações
entre os Estados, os quais devem ser parceiros na promoção
do desenvolvimento nacional.
Mas que, ao mesmo tempo, permita a salutar competição entre
governos, para que se destaquem aqueles mais capazes de,
com seus próprios recursos,
construir um ambiente atrativo
e promissor para os investimentos produtivos, sem os quais o
desenvolvimento não será possível, se o quisermos harmônico
e abrangente a todo o povo brasileiro.
Dagoberto Lima Godoy, 61, engenheiro,
é vice-presidente da CNI
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