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LUÍS NASSIF
O paradoxo do ajuste fiscal
Há componentes políticos
atrapalhando, há dúvidas sobre
a aprovação das reformas constitucionais, mas seguramente o
que está monitorando as expectativas dos investidores internacionais em relação ao Brasil é a
percepção cada vez maior de
que será impossível gerar superávits fiscais continuados para
conter o crescimento da dívida
pública. E não é por conta de
déficits da Previdência e quetais. É pela simples análise do
custo financeiro da dívida pública.
Esta vai ser a grande discussão econômica do próximo ano:
as metas fiscais exigidas por essa dívida maluca, produzida
pela antiga política cambial e
monetária, são incompatíveis
com a agenda política e econômica do país.
O que está ocorrendo neste
ano, talvez no próximo, é apenas o esperneio, uma luta insana para gerar superávits fiscais,
à custa do prolongamento da
recessão, de pressões de custos
por conta da escalada fiscal, e
adiar por mais algum tempo a
hora da verdade em relação à
dívida pública.
Aliás, louvem-se o governo,
consultores e analistas que defenderam até a morte a manutenção da política cambial anterior: conseguiram quebrar o
país.
É curioso que se venha agora
depositar na reforma da Previdência a responsabilidade pelo
saneamento das contas públicas. É evidente que o equilíbrio
da Previdência é uma meta a
ser perseguida. Só que a premissa de que o equilíbrio da Previdência permitiria o equilíbrio
orçamentário foi por água
abaixo porque existe agora
uma conta de juros que tornou
inviável qualquer ajuste fiscal.
Em seu depoimento ao Congresso, aliás, Gustavo Franco
sustentou que repetiria de novo
sua atuação à frente do BC. Como é possível, se toda sua resistência à mudança cambial baseava-se em uma premissa que
os fatos se encarregaram de demonstrar que era falsa: a de que
a inflação explodiria? Se mesmo
com a mudança cambial e a redução dos juros não se conseguiu estabelecer um cenário
confiável de reversão da trajetória de crescimento da dívida
pública, como julgar que seria
possível persistir no quadro anterior, onde a âncora básica
eram taxas de juros inacreditavelmente elevadas?
Em grandes desastres, o que se
procura salvar do incêndio são
pelo menos lições. Parece que
nem isso se aprendeu. A realidade continua a ser analisada
topicamente, em pedaços, tomando-se a parte pelo todo, não
se estabelecendo relações de
causalidade.
No período anterior, a cada
mês que passava a dívida pública ia aumentando, o serviço da
dívida ampliando, e esse povo
na história de que "enquanto
não obtiver superávit fiscal não
pode reduzir os juros", e os juros
aumentando e a dívida pública
aumentando e o serviço da dívida aumentando, e se falando
que não poderia reduzir juros
enquanto não se obtivesse superávit fiscal. E toca a inviabilizar
o ajuste fiscal por conta da manutenção dos juros elevados,
que não podiam ser reduzidos
enquanto não se acertasse o
ajuste fiscal que os juros inviabilizaram. Entendeu? Nem eu.
É a neociência econômica.
Agora, repete-se o mesmo
pensamento monofásico da primeira etapa. A cada mês que
passa, o superávit fiscal pretendido prolonga a recessão e derruba a credibilidade do governo, enfraquecendo-o para a
aprovação de medidas que são
fundamentais para se obter o
superávit fiscal, e não se reverte
o descrédito internacional em
relação à trajetória da dívida. E
esse pessoal trabalhando em cima de um cenário único porque
é inimaginável analisar qualquer outra hipótese -como,
por exemplo, a de que essas metas de superávit fiscal continuado podem ser política e economicamente inviáveis.
E-mail: lnassif@uol.com.br
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