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OPINIÃO ECONÔMICA
"A esperança venceu o medo"
BENJAMIN STEINBRUCH
Faz exatamente um ano.
Passava da meia-noite e já
era segunda-feira, 28 de outubro
de 2002. Em seu primeiro discurso
público pós-eleitoral, na avenida
Paulista, em São Paulo, Lula fez
demorados agradecimentos a todos os que o haviam ajudado a
chegar à Presidência da República.
Cerca de 50 mil pessoas ouviram o então presidente eleito citar um companheiro atrás do outro, vivos e mortos, com a cabeça
"virando um parafuso", de tantos
nomes que lembrava, como ele
mesmo definiu. Muitos choraram
no fim da manifestação, quando
a multidão cantou o Hino Nacional.
Uma hora antes, em breves palavras aos jornalistas no Hotel Intercontinental, Lula havia dito a
frase que ficou famosa: "A esperança venceu o medo".
Foi uma frase cuidadosamente
pensada pelos marqueteiros da
campanha, mas Lula estava certo. Nessa história toda, os brasileiros tiveram mesmo de superar
alguns medos. Na campanha eleitoral, como disse o próprio Lula
na avenida Paulista, o medo das
bandeiras vermelhas do PT e da
barba dos militantes. Depois,
quando o governo se instalou, o
medo de políticas econômicas irresponsáveis.
Um ano depois da eleição, muita coisa se fez. A inflação, que
ameaçava voltar, foi controlada.
A taxa de câmbio estabilizou-se.
Os juros já baixaram bastante
(não o suficiente). As exportações
cresceram a ponto de levar o Banco Central a prever, pela primeira
vez desde 1992, um superávit na
conta corrente do balanço de pagamentos. As reformas tributária
e previdenciária, bem ou mal,
avançaram. O risco Brasil desabou e a confiança do mercado internacional em relação ao país foi
totalmente restabelecida.
Tudo isso foi muito bom, mas
acabou a fase em que o novo governo atuou para debelar medos
de atitudes irresponsáveis e para
provar sua confiabilidade ao país
e ao mercado externo. Agora, deve começar a fase da coragem para enfrentar problemas fundamentais que emperram o país, como a estagnação da economia,
responsável pela falta de emprego
e pela baixa renda.
No histórico discurso na madrugada da avenida Paulista, Lula lembrou que sua mãe, que
"nasceu e morreu analfabeta",
sempre lhe ensinou que "um homem não pode perder o direito de
andar de cabeça erguida e olhar
nos olhos das pessoas". Ele está
cumprindo o conselho da mãe.
Tem sido correto, transparente e
admirado no país e no exterior.
Mas, para seguir adiante, terá de
passar à segunda fase do governo.
Fome Zero é programa de estadista, mas é paliativo. A fome se cura
para sempre com medidas obstinadas em favor do desenvolvimento.
Desde que Lula tomou posse, a
economia tem andado de lado. O
desemprego aumentou seguidamente e passou de 10,5% em dezembro para 13% em agosto, segundo o IBGE. Desemprego se
combate com crescimento contínuo da economia e isso exige
ações corajosas de redução de juros, de formulação de política industrial e creditícia para incentivar a empresa nacional e o consumo e de políticas públicas para a
criação de emprego em grande escala.
A austeridade fiscal do governo,
nessa primeira fase, mereceu elogios. Governos populistas e gastadores levam à falência do Estado
e à calamidade pública. Não é necessário manter nos próximos
anos o nível de superávit realizado no atual exercício. Com a redução dos juros, que alivia o encargo da dívida pública, é possível
fazer um superávit menor e destinar mais recursos para obras de
reconstrução da infra-estrutura
arruinada, para a saúde, o saneamento, a moradia e a educação e
para outras iniciativas que atuem
diretamente na construção do
bem-estar da população.
Lula cumpriu a primeira parte
de sua missão e conquistou a confiança de todos. Cabe, agora, enfrentar a segunda parte, para tentar realizar aquilo que prometeu
ao encerrar seu discurso na Paulista, exatamente um ano atrás:
fazer o brasileiro voltar a sorrir.
Benjamin Steinbruch, 50, empresário,
é presidente do conselho de administração da Companhia Siderúrgica Nacional.
E-mail - bvictoria@psi.com.br
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