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Cliente tem de ser ouvido, dizem especialistas
Na opinião de advogados, Receita e Polícia Federal têm obrigação de investigar compradores de mercadorias da Cisco
Para ex-secretário da Receita, um das partes mais difíceis da
investigação é reunir provas
materiais de que os clientes
podem estar envolvidos
DA REPORTAGEM LOCAL
É obrigação da Receita Federal e da Polícia Federal ouvir os
clientes da Cisco, empresa que
é o principal alvo da Operação
Persona. A opinião é de tributaristas, advogados e especialistas em comércio exterior consultados pela Folha.
"É preciso verificar o preço
real que as empresas [clientes
da Cisco] pagaram pelos produtos. Se o preço for efetivamente igual ou menor do que o
preço cobrado no mercado
norte-americano, a questão ultrapassa o delito da sonegação
e do contrabando e passa a ser
de receptação [de material ilícito]", afirma o advogado Paulo
Bonadies, do escritório Annoni
Bonadies Alvim Coelho & Kömel Jr. Advogados.
A questão é polêmica para
Douglas Yamashita, advogado
tributarista do escritório Miguel Silva & Yamashita Advogados. "Em tese, quem adquire
mercadoria com isenção ou redução de Imposto de Importação é, do ponto de vista tributário, solidariamente responsável. Do ponto de vista penal,
entretanto, exige-se comprovação de que a compradora era
cúmplice. Mas, se o esquema
[investigado na Operação Persona] era oculto, como o cliente poderia saber?", questiona.
Para o ex-secretário da Receita Federal Everardo Maciel,
um das partes mais difíceis da
investigação é reunir provas
materiais de que os clientes podem estar envolvidos. "É preciso encontrar provas materiais,
como troca de correspondências e negociações que revelem
a tentativa de camuflar a importação por meio da Mude
[distribuidora da Cisco]."
Se a investigação constatar
que havia vinculação entre as
empresas -as clientes da Cisco, a Cisco e sua distribuidora,
a Mude-, "as empresas podem, sim, ser qualificadas como contribuintes solidários".
Impacto
O ex-secretário da Receita
Federal afirma ter ficado "surpreso" com o envolvimento da
Cisco no suposto esquema de
sonegação fiscal investigado na
Operação Persona.
"Tudo parece inverossímil
pelo porte da empresa. Ao mesmo tempo, as pessoas da Receita que participam da operação
são muito sérias", afirma.
A participação da Cisco no
caso é tão "surpreendente" que,
segundo ele, as ações da companhia no exterior não sofreram impacto com as notícias de
seu envolvimento em suposto
esquema de fraude fiscal. "Parece até que os donos das ações
não acreditaram [na suposta
fraude]."
Na última semana, as ações
da Cisco nos EUA se valorizaram. Na última sexta-feira, subiram 2,31% na Nasdaq.
Argentina
Segundo Maciel, sempre
"surpreende" ver grandes multinacionais envolvidas em escândalos. "Um dos últimos de
que me lembro ocorreu com a
IBM na Argentina, durante o
governo Menen [Carlos Menem, de 1989 a 1999]. Ele informatizou os serviços da Receita
Federal argentina, quem assumiu foi a IBM. Foi um escândalo de tal porte que modificou o
"business" da empresa, como
pode acontecer com a Cisco, caso se comprove que realmente
houve irregularidades", diz.
No escândalo da Argentina,
que estourou em 1994, a IBM
teria pago US$ 37 milhões em
propinas para conseguir a exclusividade de informatizar as
525 agências do Banco Nación
no país. Os diretores do banco
foram acusados pela Justiça de
ter dirigido a licitação a favor da
empresa IBM.
(CLAUDIA ROLLI E FÁTIMA FERNANDES)
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