São Paulo, domingo, 28 de outubro de 2007

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VINICIUS TORRES FREIRE

A nova conjuntura do Ipea


Sob nova direção, instituto federal de pesquisa muda todo sistema de análise, projeções e estudos macroeconômicos

O IPEA está de mudança. Pelo andar da carruagem, vai habitar um lugar bem diferente e inusual na paisagem homogênea do debate econômico brasileiro.
O Ipea, instituto federal de pesquisa econômica, é mais conhecido por seus boletins de conjuntura e pelos cerca de 80 textos que publica anualmente, pesquisas que tratam de ambiente a finanças, de inovação a turismo. De lá surgiram estudos que influenciaram muito da discussão da última década e meia sobre desigualdade e reformas previdenciária e tributária, por exemplo.
Nos periódicos do instituto, vão aparecer as primeiras mudanças da nova direção, a cargo de Marcio Pochmann, presidente do Ipea, e de João Sicsú, diretor de estudos macroeconômicos, ambos de esquerda.
O "Boletim de Conjuntura" trimestral deixa de existir -a "Carta Ipea" toma seu lugar. O "Boletim" era uma avaliação padrão da conjuntura, com sugestões genéricas de política econômica (que agora serão abandonadas). Não diferia muito do trabalho de consultorias privadas e bancos. A nova "Carta" será curta, cerca de meia dúzia de páginas que tratarão de PIB, inflação, câmbio, juros e transações correntes. Sairá nas semanas de divulgação do PIB.
Os números das novas projeções serão divulgados em "faixas" -em vez de uma estimativa de alta do PIB de, digamos, 4,2%, vai se publicar que o PIB cresceria entre 3,5% e 4,5%. Trata-se, diz-se no Ipea, de um modo de indicar o quão limitados são tais estimativas e os dados nas quais se baseiam. Mensalmente, será divulgado um indicador antecedente de produção industrial, 20 dias antes da pesquisa do IBGE.
O periódico de maior peso será o "Observatório do Desenvolvimento", que sairia em abril e outubro. A publicação vai tratar também dos temas do antigo "Boletim de Conjuntura", mas sob nova perspectiva: o que indicadores recentes podem dizer sobre mudanças de estrutura econômica, sobre conjunturas semelhantes no passado e em outros países? História e contextos teriam muito mais peso do que modelagens do curto prazo. A avaliação do sistema financeiro e dos preços de seus ativos ganharia mais ênfase, assim como a tentativa de detalhar ritmo e forma do investimento dito produtivo feito por governo, estatais e setor privado em instalações industriais, inovação, infra-estrutura, construções residenciais e comerciais.
Ao contrário da inflação, investimento e capacidade produtiva são patinhos feios no Brasil. Os dados são parcos e a ignorância é grande.
As já precárias projeções de crescimento potencial tornam-se assim ainda mais díspares, simplórias e erradas. O Ipea quer publicar um livro de estudos teóricos sobre o tema, "Produto Potencial e Estratégias de Crescimento", em abril de 2008. O "Observatório" pretende ainda tratar das mudanças de regulação que afetam o investimento e de medidas oficiais de planejamento. Enfim, a cada edição, um pesquisador de fora do Ipea discutiria temas "cruciais" do desenvolvimento.
A recorrência de termos como "história", "longo prazo", "arranjos institucionais" e "mudanças de estrutura" nas novas idéias do Ipea sugere a influência de idéias francesas, de Michel Aglietta e da escola da regulação, para citar apenas um exemplo, bastante, porém, para marcar uma diferença em relação à economia padrão, "ortodoxa", "neoclássica" ou o palavrão simplificador que se queira utilizar. Mas a nova direção diz que a diversidade de linhas de pensamento, pesquisa e de tipos de pesquisadores (querem contratar historiadores, demógrafos e geógrafos) vai crescer, não diminuir.

vinit@uol.com.br


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