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VINICIUS TORRES FREIRE
A nova conjuntura do Ipea
Sob nova direção, instituto federal de pesquisa muda todo sistema de análise, projeções e estudos macroeconômicos
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O IPEA está de mudança. Pelo
andar da carruagem, vai habitar um lugar bem diferente
e inusual na paisagem homogênea
do debate econômico brasileiro.
O Ipea, instituto federal de pesquisa econômica, é mais conhecido
por seus boletins de conjuntura e
pelos cerca de 80 textos que publica
anualmente, pesquisas que tratam
de ambiente a finanças, de inovação
a turismo. De lá surgiram estudos
que influenciaram muito da discussão da última década e meia sobre
desigualdade e reformas previdenciária e tributária, por exemplo.
Nos periódicos do instituto, vão
aparecer as primeiras mudanças da
nova direção, a cargo de Marcio
Pochmann, presidente do Ipea, e de
João Sicsú, diretor de estudos macroeconômicos, ambos de esquerda.
O "Boletim de Conjuntura" trimestral deixa de existir -a "Carta
Ipea" toma seu lugar. O "Boletim"
era uma avaliação padrão da conjuntura, com sugestões genéricas de
política econômica (que agora serão
abandonadas). Não diferia muito do
trabalho de consultorias privadas e
bancos. A nova "Carta" será curta,
cerca de meia dúzia de páginas que
tratarão de PIB, inflação, câmbio, juros e transações correntes. Sairá nas
semanas de divulgação do PIB.
Os números das novas projeções
serão divulgados em "faixas" -em
vez de uma estimativa de alta do PIB
de, digamos, 4,2%, vai se publicar
que o PIB cresceria entre 3,5% e
4,5%. Trata-se, diz-se no Ipea, de um
modo de indicar o quão limitados
são tais estimativas e os dados nas
quais se baseiam. Mensalmente, será divulgado um indicador antecedente de produção industrial, 20
dias antes da pesquisa do IBGE.
O periódico de maior peso será o
"Observatório do Desenvolvimento", que sairia em abril e outubro. A
publicação vai tratar também dos
temas do antigo "Boletim de Conjuntura", mas sob nova perspectiva:
o que indicadores recentes podem
dizer sobre mudanças de estrutura
econômica, sobre conjunturas semelhantes no passado e em outros
países? História e contextos teriam
muito mais peso do que modelagens
do curto prazo. A avaliação do sistema financeiro e dos preços de seus
ativos ganharia mais ênfase, assim
como a tentativa de detalhar ritmo e
forma do investimento dito produtivo feito por governo, estatais e setor
privado em instalações industriais,
inovação, infra-estrutura, construções residenciais e comerciais.
Ao contrário da inflação, investimento e capacidade produtiva são
patinhos feios no Brasil. Os dados
são parcos e a ignorância é grande.
As já precárias projeções de crescimento potencial tornam-se assim
ainda mais díspares, simplórias e erradas. O Ipea quer publicar um livro
de estudos teóricos sobre o tema,
"Produto Potencial e Estratégias de
Crescimento", em abril de 2008.
O "Observatório" pretende ainda
tratar das mudanças de regulação
que afetam o investimento e de medidas oficiais de planejamento. Enfim, a cada edição, um pesquisador
de fora do Ipea discutiria temas
"cruciais" do desenvolvimento.
A recorrência de termos como
"história", "longo prazo", "arranjos
institucionais" e "mudanças de estrutura" nas novas idéias do Ipea sugere a influência de idéias francesas, de Michel Aglietta e da escola da regulação, para citar apenas um exemplo, bastante, porém, para marcar uma diferença em relação à economia padrão, "ortodoxa", "neoclássica" ou o palavrão simplificador que se queira utilizar. Mas a nova direção diz que a diversidade de linhas
de pensamento, pesquisa e de tipos de pesquisadores (querem contratar historiadores, demógrafos e geógrafos) vai crescer, não diminuir.
vinit@uol.com.br
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