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RECEITA SECRETA
Alvo de críticas, cúpula do banco barra divulgação de estudos
BC adota autocensura e dificulta comunicação
SHEILA D'AMORIM
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
O mal-estar dentro do governo
com o Banco Central não se restringe ao conservadorismo na fixação da taxa de juros. A comunicação da instituição com o mercado financeiro é considerada ruim
e tem sido apontada dentro da
equipe econômica como uma das
causas do descompasso entre a
melhora nos indicadores da economia e os riscos embutidos nos
juros projetados para o futuro,
considerados demasiadamente
elevados. Isso, por sua vez, tem
reflexo no custo das negociações
dos títulos federais.
Essa insatisfação com o BC ficou clara nas críticas recentes do
secretário do Tesouro Nacional,
Joaquim Levy, à instituição e que
renderam o puxão de orelha público do ministro da Fazenda, Antonio Palocci Filho.
Apesar disso, nos bastidores do
governo muitos técnicos da Fazenda e do próprio BC fazem coro
ao secretário. Uma das formas de
medir a falta de espaço para debate com o BC, que é constantemente apontada nas críticas feitas à
cúpula da instituição, é analisar a
publicação de trabalhos acadêmicos de funcionários do banco.
Eles são considerados instrumentos importantes para aprofundar o debate de temas relevantes para a área econômica e também estimular o surgimento de
novas idéias que podem ser adotadas pelo governo. A quantidade
desses trabalhos divulgados em
2005 foi reduzida a, pelo menos,
um terço do que era em 2001.
A utilização desse canal como
forma de balizar o mercado e ajudar a dissipar dúvidas em relação
ao comportamento do BC foi instituída no segundo semestre de
2000, um ano após o BC adotar o
regime de metas de inflação, sistema que exige maior transparência
nas atitudes do governo no campo econômico. Até o encerramento daquele ano foram divulgados nove trabalhos, segundo levantamento feito a partir de relação do próprio BC.
Em 2001, o número de estudos
publicados pulou para 26, mantendo o mesmo ritmo no ano seguinte. Em 2003, primeiro ano do
governo Luiz Inácio Lula da Silva,
esse número começa a cair e vai
para 19, depois para 11 em 2004 e
chega a apenas 9 no ano passado.
A queda é acentuada a partir de
julho de 2003, coincidentemente
o período em que Afonso Beviláqua, apontado nos bastidores do
governo como o "engavetador"
dos estudos produzidos na instituição, assume o comando da diretoria de Política Econômica.
No primeiro semestre de 2003, a
relação de trabalhos para discussão soma 15 documentos. Nos
seis meses seguintes, cai para apenas quatro.
"Esses "papers" mostram o que o
BC está pensando e também ajudam a esclarecer pontos que somente a ata e os relatórios de inflação, de "spread" e juros e de estabilidade financeira não conseguem", defende Sérgio Werlang,
ex-diretor de Política Econômica
do BC. Werlang foi o responsável
pela instituição desse canal de comunicação, intensificado pelo seu
sucessor, Ilan Goldfajn.
"É uma forma de abrir espaço
para críticas e debates que levam a
aperfeiçoamentos", argumenta.
De acordo com ele, apesar de boa
parte dos estudos ser produzida
por técnicos dos bancos e não representar uma opinião formal da
maioria da instituição, o canal é
importante para que despontem
novas idéias.
"É uma maneira barata de o BC
ter consultores que estão avaliando modelos e ajudando a testá-los
e a pensar políticas econômicas",
diz Werlang.
"O BC tem um corpo técnico altamente qualificado para gerar
um bom debate", destaca Luiz
Fernando Figueiredo, ex-diretor
de Política Monetária. Ele diz que
esses trabalhos reforçam a capacidade de o BC coordenar as expectativas do mercado financeiro e
que permitem trocar idéias com
outros bancos centrais e acadêmicos de outros países.
Tensão
Nos últimos meses, a tensão
dentro do governo por causa de
"excesso de controle" desses estudos aumentou, o que elevou o
medo dos técnicos de tratarem do
tema. Segundo relato de funcionários que não querem se identificar, a cúpula do Banco Central
não só engaveta os estudos como
também censura temas que considera delicados. Um deles, motivo de divergência internamente, é
justamente a taxa de juros.
Trabalhos mostrando o impacto dos juros em segmentos da
economia ou mesmo tratando da
formação do custo do dinheiro no
país foram vetados. A brincadeira
nos corredores da sede do BC em
Brasília é que está mais fácil publicar trabalhos acadêmicos fora do
BC do que na instituição em que
trabalham.
A insatisfação com relação à divulgação desses textos, que são
importantes para o currículo dos
pesquisadores, gerou um debate
interno sobre a transferência da
responsabilidade pela divulgação
dos trabalhos acadêmicos da diretoria de Política Econômica para a universidade corporativa, a
Unibacen. Na verdade, um departamento que cuida especialmente
de cursos para formação dos servidores do BC e está na alçada da
Diretoria de Administração. O assunto, no entanto, não evoluiu.
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