São Paulo, quarta-feira, 29 de março de 2006

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TROCA DE COMANDO

Presidente do BC torna-se "âncora" de estabilidade para mercado e tem embate com ministro amanhã no CMN

Mantega e Meirelles buscam "sintonia"

SHEILA D'AMORIM
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Inimigos de longa data no campo econômico, o novo ministro da Fazenda, Guido Mantega, e o presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, agora prometem trabalhar "sintonizados", nas palavras do próprio ministro.
Meirelles ficará no comando do BC e decidiu isso não com o novo ministro da Fazenda, mas diretamente com o presidente da República. Segundo a Folha apurou, apesar de ter sido alvo constante de críticas do novo ministro desde o início do governo, Meirelles não cogitou colocar o cargo à disposição.
A permanência do presidente do BC no cargo é vista por analistas do mercado financeiro como essencial para a redução de turbulências geradas pela queda do ministro Antonio Palocci, o que amplia a estatura de Meirelles dentro do governo.
Numa conversa rápida pelo telefone, ontem, Meirelles e Mantega apenas acertaram de "conversar com mais tranqüilidade" depois que o novo ministro cumprisse todo o ritual de posse.
Essa conversa deverá acontecer hoje. Antes, portanto, do primeiro confronto entre os dois, que já tem data e hora marcada: amanhã, às 15h, quando ocorrerá a reunião de março do CMN (Conselho Monetário Nacional).
O conselho, presidido pelo ministro da Fazenda e com a participação do presidente do BC e do ministro do Planejamento, Paulo Bernardo, definirá a nova TJLP, a taxa de juros de longo prazo que corrige os empréstimos para o setor produtivo realizados pelo BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social). A reunião será um importante termômetro da sintonia que prevalecerá na nova equipe econômica.
Mantega reclama que a TJLP deveria cair como forma de estimular os investimentos para aumentar a capacidade de produção do setor privado e afastar fantasmas de pressões inflacionárias cada vez que a economia ameaça crescer mais. Atualmente, a taxa está 9% ao ano. Apesar da fórmula criada para estabelecer a taxa levar em conta a inflação e o risco Brasil, ela permanece descolada desses indicadores, o que gera reclamações dos empresários e do próprio Mantega.
Na semana passada, durante seminário promovido pelo Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social (CDES), Mantega defendeu que a TJLP já deveria estar em 7% ao ano. Ontem, Mantega evitou falar em números. Mas disse que "a tendência é que a taxa (TJLP) seja reduzida".
Para o líder do governo no Senado, Aloizio Mercadante (PT-SP), que também é favorável a uma queda mais acelerada dos juros no país, essa é uma batalha que Mantega "terá que ganhar no CMN". Para isso, precisará convencer Meirelles ou Paulo Bernardo. Juntos, os dois formam maioria no CMN.
Durante entrevista coletiva concedida após a solenidade de posse, Mantega se esforçou em passar a impressão de que as divergências com Meirelles e os diretores do BC já foram superadas. "Não sou crítico da política econômica. Sou favorável ao regime de metas. Me manifestei sobre o zelo excessivo da equipe do Copom [Comitê de Política Monetária]", disse, garantindo que eles trabalharão em sintonia.
Mas ao ser questionado sobre quem teria de rever sua posição para que essa sintonia possa ser concretizada, o novo ministro lembrou que o Copom já está se "reparando" e argumentou que ao retomar a trajetória de queda dos juros, Meirelles e sua equipe "estão no caminho certo". Com isso, o novo ministro insinuou que o BC se aproximou mais das suas propostas.
Mais contido, Meirelles, que esteve presente na cerimônia, disse que havia cumprimentado Mantega pela sua nomeação e que a experiência que eles tiveram quando Mantega foi ministro do Planejamento foi "produtiva".
Na seqüência, Meirelles fez questão de enfatizar que conta com apoio do presidente Lula para ficar no cargo.
"Estive também com o presidente da República hoje [ontem]. Ele reafirmou mais uma vez a autonomia do BC e a nossa possibilidade, portanto, de cumprir a nossa missão e continuar fazendo o trabalho normalmente que tem sido feito até agora, fazer com que as inflações convirjam para as metas".
Nos bastidores do Palácio, tentou-se desvincular a figura do presidente do BC do Ministério da Fazenda. A argumentação é que, por ter status de ministro, Meirelles responde diretamente ao presidente da República. Mantega também ecoou esse discurso em sua entrevista coletiva. Disse que o presidente do BC é escolhido por Lula.
Entre os analistas do mercado financeiro, era Meirelles ontem quem chamado de "âncora" e "pilar" da estabilidade, apesar das promessas de continuismo de Mantega.


Colaborou Pedro Dias Leite, da Sucursal de Brasília


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