São Paulo, domingo, 29 de março de 2009

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ROGER AGNELLI

Não há tempo a perder


Cabe ao governo reduzir a burocracia e incentivar os investimentos para que a economia se movimente


NOS ÚLTIMOS 40 dias, em minhas viagens pelo mundo, tenho conversado com clientes, banqueiros e representantes de governos. Participei de reuniões com grandes executivos de empresas norte-americanas, europeias, asiáticas e brasileiras, e a visão de todos acerca do momento ainda é turva. Os governos estão fazendo planos de estímulo econômico, mas os efeitos positivos não são imediatos: os pacotes têm um tempo de maturação até que os resultados apareçam. A verdade é que o mundo não estava preparado para essa turbulência nem para elaborar planos de ajustes tão ambiciosos e tão abrangentes.
Nos Estados Unidos, há críticas ao presidente Barack Obama por ter tomado posse sem propor um plano de combate à crise. As medidas apresentadas por seu governo nas últimas semanas, apesar de ousadas, ainda geram desconfiança quanto aos riscos. A economia real continua a apresentar prejuízos, resultado da retração da demanda, que atinge todas as cadeias produtivas. As empresas sentem agora os efeitos do forte abalo na economia, até então limitado ao setor financeiro.
Assistimos no Brasil a um retrato do que acontece no mundo. A economia real se movimenta com dificuldades. Exportadores brasileiros enfrentam problemas de crédito, e os importadores lutam contra custos de carta de crédito e contra obstáculos para obter capital de giro. Com isso, alguns países correm risco de não poder pagar por nossos produtos. A bola de neve cresce. Venho defendendo a tese de que a sociedade brasileira precisa criar estratégias para acelerar os resultados no combate à crise. Não basta o anúncio de pacotes ou de planos econômicos. É preciso efetividade. Não se pode levar muito tempo entre o anúncio e o início das operações.
Para que nossa economia se movimente, é necessária a realização de investimentos. Embora os governos tenham dinheiro para tal, a burocracia é um obstáculo para a aprovação dos projetos. Para vencê-lo, o Brasil precisaria rever algumas legislações, como as que regulam processos de licenciamento ambiental e de licitações (lei nº 8.666).
Criadas há anos, muitas de suas regras não mais se justificam. Definir prazos para a aprovação de processos, capacitar funcionários públicos e usar a tecnologia para promover mais leilões pela internet seriam medidas acertadas para dar agilidade às contratações públicas, sem prejuízo do rigor e da transparência, desobstruindo-se, assim, os caminhos dos investimentos. Senão, corremos o risco de ver emperradas concorrências e licitações importantes para o Brasil por conta de batalhas intermináveis, que envolvem recursos ao Judiciário, ao Ministério Público e até ao Tribunal de Contas da União.
É necessário que o executivo -nas esferas federal, estadual e municipal- e o setor produtivo se fortaleçam para que se efetivem os projetos. As empresas já estão revendo processos e fazendo os devidos ajustes. Cabe ao governo reduzir a burocracia e incentivar os investimentos. Assim, podemos ganhar velocidade para enfrentar a turbulência e garantir a sobrevivência diante do impacto da crise econômico-financeira global. Precisamos trabalhar muito para fazer o que tem de ser feito.

ROGER AGNELLI, 49, economista e diretor-presidente da Vale, escreve neste espaço a cada quatro semanas.


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