São Paulo, sábado, 29 de abril de 2006

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INTEGRAÇÃO

Idealizador do projeto que ligaria Venezuela, Brasil e Argentina, porém, diz que preço do gás compensaria investimentos

Especialistas vêem entrave em supergasoduto

PEDRO SOARES
DA SUCURSAL DO RIO

Apesar dos desafios técnicos e políticos, o projeto do gasoduto Venezuela-Brasil-Argentina é viável, já que o gás chegará a Buenos Aires a no máximo US$ 30 o barril equivalente ao do petróleo, cifra competitiva até mesmo com os cenários mais otimistas traçados para o preço futuro do petróleo, avalia Ildo Sauer, diretor de Gás e Energia da Petrobras.
Idealizador do projeto, Sauer disse, em entrevista à Folha, que o maior desafio será o "político", e não o técnico, embora existam dificuldades como cruzar o maciço das Guianas e o rio Amazonas.
Já especialistas ouvidos pela Folha apontam ao menos três entraves: a viabilidade econômica do projeto, os problemas ambientais e a dificuldade atual em precisar as reservas de gás da Venezuela.
Além disso, dizem, o gasoduto criará uma forte dependência do Brasil (ainda maior do que com a Bolívia) e da Argentina em relação à Venezuela.
Sauer nega, no entanto, que o governo boliviano rejeite o projeto, que tem como principal avalista político o presidente da Venezuela, Hugo Chávez, aliado do presidente Evo Morales. Anteontem, o vice-ministro de Hidrocarbonetos da Bolívia, Julio Gómez, disse que o projeto do gasoduto gigante "é uma maluquice" que não "tem nem pé nem cabeça".
Sauer disse que apresentou a idéia ao vice-presidente da Bolívia, Alvaro García Linera, que se mostrou favorável ao projeto, que também conta com a aprovação do presidente Evo Morales.
Com mais de 7.000 km de extensão, o gasoduto terá capacidade para transportar 1 milhão de barris equivalentes/dia de gás, consumindo US$ 23 bilhões em investimentos.
A idéia é abastecer com gás venezuelano os mercados de Brasil, Argentina, Uruguai e, numa segunda fase, Chile (que já está conectado à rede argentina de dutos) e Paraguai, além de interligar Peru e Bolívia à rede sul-americana de gasodutos.
Para Sauer, a grande vantagem do gasoduto é a "interiorização" do gás, o que promoverá o desenvolvimento de novos eixos econômicos no Brasil. Citou como exemplos pólos de mineração e siderurgia no Pará e no Amapá, o desenvolvimento da agroindústria no Centro-Oeste e o avanço da geração de energia termelétrica no Nordeste, cuja capacidade de abastecimento chega ao limite.
Se a opção fosse comprimir o gás e transportá-lo por navios na modalidade de GNL (Gás Natural Liquefeito), o insumo chegaria ao litoral, onde já existe o acesso ao gás natural, avalia. Sauer afirma que o tamanho do projeto do gasoduto traz um "ganho de escala" que permite preços competitivos. Além disso, o gasoduto, diz, trará "independência" entre fornecedores e compradores, já que um produtor não dependerá de só um único mercado e vice-versa.
O secretário de Estado de Energia, Petróleo e Indústria Naval do Rio, Wagner Victer, discorda. Diz que haverá uma "forte relação de dependência". "O projeto, além de ser inviável, um sonho, criará uma fragilidade maior do que com a Bolívia", disse.
Para ele, a integração energética deve ocorrer por meio de plantas de GNL, o que reduz o "risco político", já que o gás pode ser importado de outras fontes em caso de instabilidade na Venezuela.
Victer disse ainda que o preço do gás, "mesmo que saísse a US$ 1 da Venezuela", não chegaria a Buenos Aires com preço competitivo, "a menos que o Brasil subsidiasse o gás fornecido à Argentina". Outro erro do projeto, afirma, foi alijar a Bolívia.
Para o especialista Adriano Pires, do CBIE (Centro Brasileiro de Infra-Estrutura), a maior dúvida é quanto ao tamanho das reservas da Venezuela. "Ninguém sabe quanto gás existe lá. Não é possível fazer um gasoduto com investimentos de US$ 23 bilhões sem essa informação. Nenhuma estatística da Venezuela é confiável."


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