|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
VINICIUS TORRES FREIRE
Investimento desaba nos EUA
Consumidor gasta como nos anos bons, mas ruína dos imóveis puxa gastos com capital para nível preocupante
|
O QUE FARIA uma autoridade
econômica brazuka num
país em que a inflação escapulisse da meta, o gasto dos consumidores estivesse acima do PIB, o
desemprego beirasse mínimas históricas e a moeda embicasse na desvalorização? Se os investimentos
despencassem na direção do zero?
Pior, se houvesse crise feia em um
setor financeiro, com algum risco de
se tornar "crise sistêmica"?
Essa economia é a dos Estados Unidos, tal como aparece no balanço das contas nacionais deles, divulgado na sexta-feira e nalguns outros
poucos indicadores. Pois é.
Retratos ou "instantâneos", como
se dizia antigamente de fotografias,
podem falsificar caracteres e personalidades. Mas não deixa de ser estranho esse sorriso de Mona Lisa
pregado na face de olhos arregalados
de "O Grito" do balanço econômico
americano, para recorrer a duas telas "pop". Para divagar menos, vide
ao lado o gráfico sobre despesas dos
consumidores individuais, taxa de
investimento produtivo e PIB.
Neste início de 2007, a economia
americana cresceu ao ritmo trimestral anualizado de 1,3%, abaixo do
previsto pelo mercado (1,9%). O
mercado não tugiu, mas mugiu. A
Bolsa de Nova York continuou a extrapolar sua alegria, a prestar atenção só em empresas que divulgam
bons lucros, desprezando a média
medíocre do trimestre. Pode ser que
o mercado espere a revisão do PIB,
que foi enorme no trimestre final de
2006. Pode ser só euforia mesmo.
A alta do PIB teria sido ainda de
2,9% (contra 3,35% de 2006 e 3,2%
de 2005) nos últimos 12 meses (isto
é, se os dados são apresentados do
modo como o fazemos no Brasil, não
à moda americana, do PIB trimestral anualizado). O gasto dos consumidores cresceu 3,2%, ainda forte.
Mas o investimento (em máquinas,
equipamentos, instalações, residências) caiu para 1,2%. Nos três últimos anos, 2006, 05 e 04 foi de 4,2%, 5,4% e 9,8%, respectivamente.
O desastre do investimento está
mais concentrado na construção de
casas: -9,8%. A despesa com equipamentos e software ainda vai bem, a
4,3%, embora a média dos últimos
três anos tenha sido de 7,5%.
Resumo da ópera: o consumidor
americano está na mesma balada
desde 2004. Bancou parte de seus
gastos graças a muito emprego e riqueza imobiliária. O americano pode abrir contas lastreadas no valor
da sua casa e sacar empréstimos,
com cheque ou cartão, como se
abrisse linha de crédito. Com a crise
imobiliária, tal canal deve se fechar.
Quando o crescimento do PIB
caiu para 0,8% (2001) e 1,6% (2002),
o investimento regrediu. Os gastos
dos consumidores ficaram ainda em
torno de 2,5%. É preciso ouvir ainda
mais um ato da ópera, mas, se a ruína imobiliária continuar a dizimar
outros investimentos, a tendência é
bem menos rósea que a do cenário
"goldilocks", cachinhos dourados,
um PIB "morno", de uns 2,5%.
vinit@uol.com.br
Texto Anterior: Avanço da cana concentra a produção nas grandes usinas Próximo Texto: Nova central sindical vai surgir em julho Índice
|