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Pesquisadores da FGV questionam política industrial
Para economistas, política setorial, além de ser mais suscetível a lobbies, funciona menos do que medidas para todas as empresas
Empresários dizem que o cenário traçado em estudo é o ideal, mas que indústria do país ainda precisa de apoio estratégico do governo
CRISTIANE BARBIERI
DA REPORTAGEM LOCAL
Bastou que o ministro das
Comunicações, Hélio Costa,
chegasse à NAB, maior feira para empresas de televisão do
mundo, há duas semanas, em
Las Vegas, para ser rodeado por
todos os lados. Donos de emissoras de televisão -em sua
maioria políticos- queriam saber duas coisas: quando sairiam
as linhas de financiamento para a digitalização dos canais e o
que aconteceria com a publicidade oficial, caso seja mesmo
criada a TV estatal.
"O lobby para que o BNDES
financie a digitalização tem sido pesadíssimo", diz o presidente de uma empresa da área,
que estava em Las Vegas. "Será
o mesmo com relação à TV estatal, já que 30% da receita das
emissoras vem do governo."
São fatos como esse que levaram um grupo de pesquisadores da FGV (Fundação Getulio
Vargas) a publicar, em março, o
estudo "Por que o Brasil não
Precisa de Política Industrial".
Assinado pelo ex-presidente da
Anatel (Agência Nacional de
Telecomunicações) Luiz
Schymura e pelos professores
Samuel Pessôa, Mauricio Canêdo-Pinheiro e Pedro Ferreira, o ensaio afirma, entre outras
coisas, que ao adotar políticas
industriais o governo fica mais
sujeito a pressões de grupos organizados.
"A política industrial setorial, além de ser mais passível a
lobbies, tem resultados menos
efetivos do que se forem priorizadas iniciativas que beneficiem a todas as empresas", afirma Schymura. Ele cita, entre
elas, as reformas estruturais, a
melhoria no marco regulatório
e o fortalecimento das agências
reguladoras.
"É evidente que esse cenário
seria o ideal", afirma José Ermírio de Moraes Neto, vice-presidente do conselho do grupo Votorantim. "Mas, no estágio em que estamos, a indústria
precisa do apoio estratégico do
governo."
A opinião é unânime entre os
empresários. "No país que tem
as mais altas taxas de juros do
mundo, informalidade e burocracias gigantescas, a indústrias precisa, sim, de apoio pontual do governo", diz Paulo
Skaf, presidente da Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo).
Debate
Segundo os pesquisadores,
no entanto, a proposta é colocar mais elementos técnicos no
debate. No trabalho, são detalhados diversos casos de políticas industriais que não funcionaram. Os exemplos mais eficientes, segundo eles, são os de
Coréia do Sul, Japão e Taiwan.
Nesses países, a política industrial implantada foi efetiva
porque aconteceu simultaneamente à política fiscal e ao ajuste fiscal austeros, ao controle
da inflação, ao incentivo à educação e a investimentos em infra-estrutura. "Com exceção do
controle de inflação, o Brasil
não tem tradição em ser bem-sucedido em nenhuma dessas
áreas", diz Schymura, indicado
à Anatel no governo FHC.
Há quem pense diferente, e
não só entre o empresariado.
"Todos os países do mundo
praticam políticas industriais e
em muitos casos são bem-sucedidos, mesmo sem as condições
ideais", afirma David Kupfer,
coordenador do grupo de indústria do Instituto de Economia da UFRJ (Universidade
Federal do Rio de Janeiro).
Segundo ele, falar em necessidade do fim da política industrial é uma falsa questão. "Política industrial não tem de ser
horizontal ou vertical porque é
híbrida", afirma Kupfer. "Até
mesmo na política monetária
do Banco Central há política industrial."
Os pesquisadores da FGV,
entretanto, dizem que se trata
da necessidade de priorizar entre as alternativas para otimizar investimentos e geração de
empregos.
Erros do PAC
Para eles, o PAC (Programa
de Aceleração do Crescimento)
tem acertos no que diz respeito
a preocupações com infra-estrutura e crédito, por exemplo.
Porém erra ao priorizar áreas
específicas, como já fazia a política industrial publicada pelo
governo em 2003.
À época, ganharam benefícios as áreas de software, fármacos, microeletrônica e bens
de capital.
Segundo os pesquisadores da
FGV, o foco em tecnologia e
fármacos estaria errado, já que
o Brasil não teria vantagem
comparativa a outros países.
Além disso, sem prazo para terminar ou metas a serem atingidas pelas empresas, acabariam
reduzindo a competitividade.
"Esses setores foram escolhidos porque estão presentes
transversalmente em todas as
áreas da economia", afirma
Alessandro Teixeira, presidente do ABDI (Agência Brasileira
de Desenvolvimento Industrial), ligada ao Ministério do
Desenvolvimento. "Ao incentivá-los, estimulamos a economia como um todo e pensamos
o país no longo prazo."
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