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OPINIÃO ECONÔMICA
A ineficácia da recessão
PAULO NOGUEIRA BATISTA JR.
Em face do aumento alarmante do desequilíbrio externo,
alguns economistas partiram
para a ignorância. Passaram a
recomendar a recessão como
método de ajustamento. A justificativa é mais ou menos a
seguinte: como não se pode, supostamente, alterar a política
cambial, a saída seria reduzir a
demanda por importações por
meio de uma contração do nível
de atividade.
O governo vem hesitando,
com razão, em seguir esse caminho. Os dados disponíveis não
indicam a existência de uma
conjuntura de aquecimento generalizado. Ao contrário. A julgar pelas estimativas mais recentes do IBGE, a economia como um todo atravessa um período de estagnação desde o último trimestre de 1996.
A série do PIB trimestral,
ajustado sazonalmente, indica
um crescimento de apenas 0,1%
no quarto trimestre do ano passado em comparação com o trimestre imediatamente anterior.
No primeiro trimestre deste
ano, o resultado foi ainda pior:
uma queda de 0,6% relativamente ao último trimestre de
1996.
É possível que o IBGE esteja
subestimando o nível de atividade da economia. Mas outras
fontes de dados de produção,
vendas e emprego também estão indicando, de forma geral,
estagnação ou crescimento lento desde fins do ano passado.
Eis aí o aspecto que mais impressiona: uma forte ampliação
dos déficits na balança comercial e na conta corrente do balanço de pagamentos em pleno
período de desaceleração do nível de atividade da economia! É
um quadro bastante diferente
daquele que prevaleceu entre
julho de 1994 e março de 1995,
quando o desequilíbrio das
contas externas podia ser atribuído, em parte, à forte expansão da demanda interna. Fica
cada vez mais evidente que o
que temos no Brasil é um problema de preços relativos, produzido por uma forte e persistente apreciação da taxa de
câmbio em termos reais.
Não há dúvida de que uma
recessão melhoraria os resultados da balança comercial e da
conta corrente do balanço de
pagamentos. A queda da demanda interna diminuiria as
importações e geraria excedentes exportáveis. Foi o que ocorreu, por exemplo, a partir do
segundo trimestre de 1995. A
economia entrou em recessão e
a balança comercial não demorou a acusar substancial recuperação.
Trata-se, contudo, de um método ineficaz de ajustamento.
Os seus efeitos são essencialmente temporários. O governo
não pode, evidentemente, manter a economia em recessão permanente. Quando o nível de
atividade se recupera, o problema do desequilíbrio externo
reaparece.
Uma recessão só produziria
efeitos permanentes se se pudesse contar com flexibilidade de
preços e salários nominais. Em
outras palavras: se a recessão
resultasse em redução dos preços e salários nominais, a taxa
de câmbio real poderia ser corrigida sem que se modificasse a
taxa de câmbio nominal.
Evidentemente, só um torcedor do Bonsucesso pode acreditar na viabilidade de um cenário desses. Como a maior parte
dos preços e salários é bastante
rígida no sentido descendente,
a recessão e o desemprego requeridos para produzir uma deflação adquirem proporções de
grande depressão.
Mesmo uma recessão moderada pode ser problemática, especialmente se produzida por elevação da taxa de juro ou restrições adicionais ao crédito. Em
primeiro lugar, porque pioraria
os já não tão brilhantes resultados fiscais. Em segundo, porque
tenderia a causar instabilidade
financeira, na medida em que
levasse a uma deterioração da
carteira de empréstimos dos
bancos. Finalmente, a recessão
tenderia a aumentar o desemprego e o subemprego e a produzir concentração adicional
da renda nacional.
Em suma, é uma ilusão acreditar que se possa ou deva corrigir o desequilíbrio externo
com medidas de caráter recessivo. Por esse caminho, o máximo
que se pode alcançar é uma recuperação transitória do equilíbrio externo à custa de um
agravamento dos desequilíbrios
internos.
Paulo Nogueira Batista Jr., 42, professor da
Fundação Getúlio Vargas e pesquisador-visitante do Instituto de Estudos Avançados da
Universidade de São Paulo, escreve às quintas-feiras nesta coluna.
E-mail: pnbjr@ibm.net
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