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JOSÉ MÁRCIO CAMARGO
De onde menos se espera...
Há sintomas de excesso de
demanda sobre a oferta em
vários setores, e são maiores
entre os bens comerciáveis
TAXA SELIC a 12% ao ano e taxa
de inflação de 3,5% ao ano.
Esse é o cenário hoje. O comportamento futuro da taxa de inflação depende das decisões que foram
tomadas nos últimos seis meses e
das que serão tomadas a partir de
agora. A pergunta é se existem pressões inflacionárias latentes decorrentes do descompasso entre oferta
e procura que possam interromper
o processo de queda das taxas de juros.
Em princípio, em uma economia
com superávits em conta corrente,
um excesso de demanda em bens
comerciáveis levaria a um crescimento das importações, sem pressões inflacionárias relevantes. No
entanto, aumentar as importações
não é fácil. Para que maiores importações possam ser disponibilizadas
sem gerar pressões inflacionárias,
um amplo conjunto de condições
precisa ser cumprido. Em especial,
que a infra-estrutura de portos, distribuição e transportes tenha algum
grau de subutilização e que exista
disponibilidade de mercadorias no
mercado internacional a preços
constantes. E essas condições não
estão hoje presentes no Brasil. Portanto, as decisões quanto à taxa de
juros deverão levar em consideração
o descompasso entre oferta e procura dos dois tipos de bens.
Para os bens comerciáveis, dois
indicadores podem ser utilizados
para avaliar as condições de oferta e
demanda: o grau de utilização da capacidade produtiva do setor industrial e um indicador de aceleração
inflacionária desses bens. Quanto
maior a complementaridade entre
as importações e a produção interna, mais estável deve ser o grau de
utilização da capacidade produtiva.
Dado o preço internacional dos bens
e a taxa de câmbio, variações de demanda seriam acompanhadas por
variações das importações. Mas o
grau de utilização da capacidade
produtiva na indústria está crescendo sistematicamente desde meados
de 2006, estando próximo ao nível
mais alto desde 2004, o que indica
que as importações não estão sendo
capazes de cobrir a diferença entre
oferta e demanda internas.
O segundo indicador é a evolução
da porcentagem dos bens comerciáveis que está apresentando aceleração da taxa de inflação, avaliada em
termos anuais. Um índice de aceleração inflacionária.
Se esse índice aumenta, temos um
indicador de que cada vez mais bens
comerciáveis estão com excesso de
demanda, o que é um indicador antecedente de aumento da taxa de inflação no futuro. E, desde maio de
2006, o índice de aceleração inflacionária dos bens comerciáveis passou de 33% para 55%. Ou seja, 55%
dos produtos comerciáveis que
compõem o IPCA (Índice de Preços
ao Consumidor Amplo, usado como
balizador das metas de inflação pelo
Banco Central) apresentam uma taxa de inflação, em 12 meses, maior a
cada mês.
Quanto aos preços dos setor não
comerciável, não existe um indicador de grau de utilização da capacidade. Porém podemos utilizar o
mesmo índice de aceleração inflacionária dos serviços para antecipar
sinais de excesso de demanda. E, entre maio de 2005 e maio de 2007, esse índice para os serviços passou de
55% para 38%, ou seja, em maio,
apenas 38% dos serviços que fazem
parte do IPCA mostravam sintomas
de excesso de demanda e essa porcentagem está em queda.
Esses resultados mostram que
existem sintomas de excesso de demanda em relação à oferta em vários
setores da economia brasileira e que
esse fato é maior entre os bens comerciáveis do que entre os não-comerciáveis. De onde menos se espera é que vem o perigo.
JOSÉ MÁRCIO CAMARGO, 59, é professor do Departamento de Economia da PUC-Rio e sócio da Tendências Consultoria Integrada. Excepcionalmente, não é publicado o artigo de LUIZ CARLOS MENDONÇA DE BARROS, que escreve nesta coluna, às sextas-feiras.
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