São Paulo, segunda-feira, 29 de setembro de 2008

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Mundo respira e EUA pagam, afirma analista

DANIEL BERGAMASCO
DE NOVA YORK

O pacote quase trilionário de resgate do mercado financeiro americano tem seus prós e contras para os Estados Unidos, mas é um ótimo negócio para o resto do mundo, diz o especialista em investimentos Karl Sauvant, que foi diretor da Divisão de Investimentos da Unctad (Conferência da ONU sobre Comércio e Desenvolvimento) e hoje é diretor-executivo do Programa de Investimento Estrangeiro da Universidade de Columbia, em Nova York.
Para Sauvant, os possíveis efeitos negativos do pacote se concentrarão especialmente nas fronteiras americanas, já que conseqüências como aumento do déficit orçamentário e desvalorização do dólar podem significar vantagem para outros países, enquanto a não-intervenção federal na crise trava o mercado financeiro internacional. "O pacote é necessário e duro para os EUA, mas o mundo sai ganhando", diz ele. Abaixo, trechos da entrevista.

 
FOLHA - Qual a perspectiva para a economia mundial com a aprovação do pacote?
KARL SAUVANT - De ganho, certamente. A aprovação ou a não-aprovação teria prós e contras. A diferença é que, com o socorro, o mundo respira e a parte difícil fica muito mais concentrada nos Estados Unidos. Por outro lado, sem que nada seja feito, o mundo todo paga junto.

FOLHA - Que implicações negativas o pacote traria para a economia americana?
SAUVANT - Bem, você não lança um pacote de US$ 700 bilhões sem que haja prejuízo. Os EUA deverão aumentar seu déficit, que já é problemático e que já pesa na desvalorização do dólar, que gera uma série de problemas que tem deixado os americanos muito insatisfeitos [para compensar o fato de gastar mais do que arrecada, o governo emite mais títulos no mercado para se capitalizar, o que enfraquece o dólar e faz subir preços de produtos importados que são chave para a economia, como a gasolina].
Por outro lado, o dólar fraco também traz vantagens, como estimular as exportações americanas, o que é um vetor positivo para a criação de empregos, um dos principais problemas do país atualmente. Mas o efeito mais importante do pacote é estabilizar o sistema financeiro de todo o mundo. Sem alguma medida firme e urgente, todo o mundo pagaria junto.

FOLHA - O senhor, então, aprova o pacote?
SAUVANT - Sim, ele é muito necessário, o governo tem de fazer alguma coisa. Mas ainda acho que falta um socorro mais direto aos cidadãos que não conseguem pagar seus empréstimos imobiliários, um dinheiro com o qual eles possam contar para não perder suas casas.

FOLHA - Há alguns meses, o senhor declarou que o momento de crise se transformava em uma boa oportunidade para investidores estrangeiros, que poderiam aproveitar o câmbio e a desvalorização das empresas americanas para fazer aquisições no país. Isso continua valendo em um contexto de agravamento da crise?
SAUVANT - Sim, continua. A oportunidade para aquisições é boa. As empresas brasileiras, mesmo os bancos, que querem crescer nos EUA pagarão muito menos por empresas aqui, mas é claro que, no caso do setor financeiro, o temor aumentou nas últimas semanas. Mas o fenômeno de entrada de empresas estrangeiras nos EUA é notório, você vê sempre no noticiário, como a venda de um dos símbolos de Nova York, o edifício Chrysler [para o fundo Abu Dhabi Investment Council, dos Emirados Árabes Unidos, por US$ 800 milhões]. Isso mexe com [a auto-estima] do país, mas os americanos já começam a perceber que se trata de uma realidade.


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