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MERCADO
Bancos temem que o governo não honre pagamento e diminuem compra de papéis; fuga provoca falta de dólar
Estrangeiro foge de título público do Brasil
ÉRICA FRAGA
DA REPORTAGEM LOCAL
O temor de que o Brasil tivesse
problemas para pagar sua dívida
reduziu o apetite de bancos estrangeiros pelos lucrativos títulos
públicos do país em 2002.
Isso se refletiu em uma participação bem menor dessas instituições nos leilões de papéis da dívida pública, feitos pelo Tesouro
Nacional e pelo Banco Central.
No segundo semestre de 2002,
até novembro, os bancos de fora
levaram 33% do total de títulos
leiloados. Esse valor representa
uma queda de 21% em relação ao
mesmo período no ano passado,
quando as instituições estrangeiras haviam abocanhado 42% do
total de títulos emitidos.
"Crise argentina e problemas
domésticos brasileiros, como as
incertezas associadas às eleições,
somados a uma retração global de
investimentos levaram os bancos
estrangeiros a reduzir bastante a
exposição à América Latina", diz
Joaquim Kokudai, diretor de tesouraria do Lloyds TSB.
Segundo Alberto Borges Matias,
sócio da ABM Consulting, dúvidas em relação à capacidade do
governo de renovar sua dívida foram as principais responsáveis
pela fuga de investidores de ativos
brasileiros.
Nacionais
Se a participação dos bancos estrangeiros nos leilões de títulos
públicos caiu neste ano, a das instituições nacionais aumentou. No
segundo semestre deste ano, até
novembro passado, os bancos
brasileiros haviam comprado
67% dos papéis públicos ofertados. No mesmo período do ano
passado, esse percentual havia sido menor: 58%.
Isso não quer dizer, no entanto,
que a demanda de bancos nacionais por títulos públicos aumentou. Ao contrário, tanto as instituições brasileiras como as estrangeiras compraram um volume menor de títulos em 2002 do
que no ano passado.
A demanda menor acabou forçando uma redução na quantidade de títulos da dívida pública que
foram rolados. No total, o governo conseguiu vender R$ 55,2 bilhões entre julho e novembro deste ano-uma queda de 49% em
relação ao mesmo período em
2001.
Como o volume de títulos comprados pelos bancos estrangeiros
no segundo semestre caiu bem
mais (60%) do que a quantidade
adquirida pelas instituições nacionais (recuo de 41%), a participação relativa das últimas nos leilões acabou aumentando.
Segundo um alto funcionário
do Tesouro Nacional, a maior retração de estrangeiros tem duas
explicações principais. Em primeiro lugar, essas instituições
têm maior preferência por títulos
corrigidos pelo câmbio. Como o
governo reduziu a oferta desses
papéis para evitar maior desvalorização do real, os bancos de fora
se afastaram mais dos leilões.
Além disso, é comum que os investidores estrangeiros fiquem
mais ressabiados em épocas de
crise que os nacionais.
Essa retração de demanda por
títulos públicos foi parte de um
movimento maior de fuga de investidores de fora do Brasil, que
vem tendo sérias consequências
para a economia.
Menos recursos externos aplicados em ativos brasileiros significaram uma oferta menor de dólares no mercado interno e provocaram uma forte desvalorização
do real. O pior resultado disso
tem sido uma disparada nos preços, como não se via desde 1995.
Outra ameaça para a inflação
vem do brutal aumento de recursos que estão sendo rolados no
chamado mercado "overnight"
(que remunera as aplicações com
taxas de juros diárias), que saltou
de R$ 6 bilhões em maio passado
para cerca de R$ 60 bilhões hoje.
Esse aumento também é consequência da menor demanda de
investidores por títulos públicos.
Com medo de um possível calote
da dívida, as instituições financeiras recorreram às aplicações diárias. O risco disso é que esses recursos que giram todo o dia no
mercado acabem destinados ao
consumo. O que aumentaria ainda mais as pressões inflacionárias.
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