São Paulo, domingo, 30 de janeiro de 2005

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LEÃO GULOSO

Emergentes concorrentes como México e China ganham preferência de matrizes por causa da simplicidade tributária

Imposto faz múltis perderem investimento

DA REPORTAGEM LOCAL

Em toda a América Latina, o departamento tributário brasileiro da gigante do setor farmacêutico Merck Sharp & Dohme (MSD) é, proporcionalmente, o que tem o maior número de funcionários e custos de operação.
Ironicamente, a MSD do Brasil, com 932 funcionários, é também uma das plantas da companhia com um dos maiores níveis de ociosidade no mundo, na faixa de 60%. Boa parte disso, por causa dos impostos no Brasil.
Segundo João Sanchez, diretor da MSD, no passado a empresa fazia planos de transformar a unidade brasileira de Campinas (SP) em uma produtora mundial de determinados tipos de medicamento e fazer da companhia uma base exportadora.
""Na competição com países como México e Cingapura, não conseguimos", afirma Sanchez. ""Hoje, é mais barato trazer o medicamento pronto de fora do que fabricá-lo aqui. Há outros custos envolvidos, mas os impostos são determinantes."
Em uma lista de 11 países, a MSD coloca o Brasil em primeiro lugar como o local onde os custos alheios à produção mais interferem no preço. Os impostos, afirma Sanchez, têm peso específico ""alto" nessa balança.
Um produto com preço de fábrica de US$ 1 é vendido no Brasil a US$ 2,08. No México, a US$ 1,44. Na Argentina, a US$ 1,76.
Rui Hirschheimer, presidente para a América Latina da multinacional sueca Eletrolux, afirma que, além de ter um departamento jurídico próprio, a empresa gasta ""quantias imensas" com ""horas extras" de escritórios de advocacia para cuidar da ""situação de caos" tributário.

"Perda de tempo"
""É uma perda de tempo imensa quando deveríamos estar nos preocupando com crescimento, produtividade e eficiência para competir", diz Hirschheimer, que comanda 4.500 funcionários e fatura R$ 1,5 bilhão ao ano no país.
""Obviamente isso tem um peso forte nas decisões de investimento da nossa matriz", afirma.
Alguns dos escritórios mais conceituados da área tributária, como o Pinheiro Neto Advogados, chegam a cobrar R$ 300 a hora de empresas para ajudá-las a entender ""o emaranhado" da legislação em mudança contínua.
""Há uma ansiedade enorme dos empresários em saber o que está acontecendo para não serem pegos de surpresa", afirma Ricardo Becker, sócio do Pinheiro Neto.
Além da ""terceirização branca" para as empresas que a Receita fez nas áreas de fiscalização e controle, Becker afirma que vem ocorrendo também uma ""diminuição substancial" na confecção de ""normativos interpretativos" pelo fisco, que ajudariam a padronizar o entendimento das leis.

"Caos tributário"
Para o empresário Armando Monteiro Neto, presidente da CNI (Confederação Nacional da Indústria), ""é o pior possível" o ambiente tributário no qual as empresas brasileiras estão inseridas hoje.
""No setor industrial, com os juros e o caos tributário, só sobrevive e cresce hoje quem comanda oligopólios, aproveita-se da guerra fiscal dos Estados para pagar menos impostos ou sonega", afirma Monteiro Neto.
Segundo o advogado tributarista Ives Gandra da Silva Martins, enquanto outros países emergentes têm cargas tributárias na faixa de 20% do PIB, o Brasil ""arrecada como país desenvolvido [acima de 30% do PIB] sem fazer qualquer tipo de justiça social".
""Conseguimos complicar tudo de forma monumental. E, para cada nova complicação, editamos novas normas e procedimentos", afirma o tributarista.
Silva Martins afirma que, ""desesperadas", algumas empresas têm sido procuradas por advogados ""oportunistas" que oferecem soluções pouco ortodoxas para se livrar do peso dos tributos.
""É a institucionalização do "conto do vigário" tributário", afirma.
(FERNANDO CANZIAN)

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