São Paulo, terça-feira, 30 de abril de 2002

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País pode usar híper para tentar controlar as finanças públicas

DE BUENOS AIRES

DA REPORTAGEM LOCAL

Se o governo argentino não conseguir fechar um acordo de socorro com o FMI (Fundo Monetário Internacional), poderá optar por uma política monetária expansiva, o que abrirá as portas para a volta da hiperinflação. Sem crédito externo ou interno, o governo pode encontrar no ""imposto inflacionário", resultante da aceleração da inflação, a forma de equilibrar as contas públicas.
Como cerca da metade da massa tributária da Argentina é composta pelo IVA (Imposto sobre Valor Agregado, que incide sobre quase todos os produtos), o aumento da inflação se reflete em crescimento da arrecadação. Produtos mais caros podem significar uma quantidade maior de impostos nos cofres do governo, considerando-se que a queda na demanda já é muito grande.
O Banco Central já emitiu cerca de 95% dos 3,5 bilhões de pesos previstos no Orçamento deste ano. ""A questão é saber qual será a política do BC quando atingir o teto de emissão permitida, o que está para acontecer. Sem o FMI, a possibilidade de voltar à política monetária expansiva é grande", afirma Dardo Ferrer, economista da Fundação Mercado.
Se a média de 10% de inflação prevista para abril se mantiver nos próximos meses, as possibilidades de se entrar em um processo que leve à hiperinflação estão dadas. Para Ferrer, o governo não vai conseguir evitar por muito tempo os reajustes nas tarifas públicas e nos salários, que potencializarão a inflação.
"Não vejo a hiperinflação na esquina. Mas se Lavagna insistir, como parece que vai, nos mesmos erros de Lenicov, vamos acabar dando de cara com ela", diz o economista Eduardo Cúria, ex-secretário do governo Menem (1989-1999), que menciona na lista de erros a retomada do plano Bonex.
Da mesma forma, ainda que admita que uma hiperinflação possa ser usada para equilibrar as contas públicas, Cúria não deixa de ver a situação como limite. Ele comenta com ironia. ""A saída pela hiperinflação é fabulosa: um imposto ao qual o resto dos agentes econômicos não têm capacidade de alcançar. Só tem um problema: não leva em conta as pessoas, que vão ser de novo castigadas", diz.
O economista Orlando Ferreres, outro ex-funcionário do governo -foi vice-ministro da Economia de Raúl Alfonsín (1983-1989)- aponta que a partir de agosto ""o imposto inflacionário" vai permitir ao Estado obter melhora nos níveis de arrecadação. Ferreres calcula que a inflação acumulada de 2002 será de 120% contra os 40% admitidos pelo governo.
Mas não deixa de advertir sobre as sérias debilidades que a gestão Duhalde precisa administrar: o primeiro ponto é que, mesmo que consiga um acordo com o FMI, na melhor da hipóteses, ele não vai superar os US$ 8 bilhões (as estimativas em média são de que chegue ao número de US$ 5 bilhões). Em segundo lugar, o governo já precisou emprestar 5,6 bilhões de pesos para os bancos, por meio de linhas de redesconto (e não recebeu boa parte desse dinheiro).
Por fim, mesmo com a chamada "Lei Tampão", que limita às instâncias superiores o poder de liberar recursos retidos no curralzinho (restrição a saques bancários), o governo ainda seguirá acompanhando a sangria no sistema financeiro. Somados, esses fatores atiçam mais a tentação de o Estado emitir moeda, o que potencializa mais e mais inflação. (FABRICIO VIEIRA e JOSÉ ALAN DIAS)

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