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ARTIGO
Avanço do setor financeiro é ameaça para estabilidade
ANDREW GLYN
DO "FINANCIAL TIMES"
Adam Smith descreveu o dinheiro como "a grande roda da
circulação". Na medida em que
facilita a expansão econômica, o
sistema financeiro desempenha
seu papel na elevação dos padrões
de vida. Os bancos sempre receberam seu quinhão por exercer
essas funções. Nas últimas décadas, porém, o quinhão deles vem
crescendo de maneira dramática.
Nos anos 1950 e 1960 as companhias financeiras americanas receberam entre 10% e 15% dos lucros das empresas; hoje, porém,
ficam com 30% a 40% do total. Se
forem incluídos os lucros das atividades financeiras das empresas
industriais e comerciais, o setor financeiro, nesse sentido mais amplo, dentro em breve poderá ser
responsável pela maior parte dos
lucros de empresas nos EUA.
Essa tendência de o setor financeiro crescer muito mais rapidamente do que a economia "real"
também se evidencia no Reino
Unido e em outros países. O que
está sendo dado em troca da absorção de uma parcela crescente
dos recursos da sociedade, especialmente dos trabalhadores altamente qualificados?
Consumo
Nos últimos tempos os consumidores americanos vêm fortalecendo a expansão da economia
mundial, e a crescimento do crédito a consumidores e de hipotecas vem desempenhando papel
decisivo na elevação do consumo
americano a tal ponto que as famílias já deixaram de poupar.
Mas aquilo que o setor financeiro
dá, ele também pode tirar. O crédito ao consumidor pode afastar
as recessões, quando a concessão
de crédito permite aos consumidores continuar a gastar, mesmo
quando o crescimento de sua renda se desacelera. Mas também pode agravar as recessões, se os consumidores forem forçados a saldar suas dívidas num momento
de baixa, como mostraram os
exemplos de países como a Suécia
e o Reino Unido no início dos
anos 1990.
Supõe-se que um sistema financeiro sofisticado incentive o acúmulo de capital. Os investimentos
reais maciços em telecomunicações feitos durante o boom da Internet parecem constituir ótimo
exemplo disso. Entretanto, até
2002, menos da metade da capacidade dos EUA em telecomunicações estava sendo utilizada.
Estoque de capital
Depois da queda, o crescimento
do estoque de capital nos EUA sofreu uma redução mais marcante
do que em qualquer recessão desde a 2ª Guerra Mundial. Desde
2000, em todos os países que integram a Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento
Econômico, o estoque de capital
mal vem conseguindo crescer 2%
ao ano. É um índice que não chega à metade daquele registrado
nos anos 1960, quando o setor financeiro era contido por restrições fortes, e inferior ao da década
de 1970, época em que as condições macroeconômicas eram turbulentas.
A City de Londres ocupa uma
posição especial no Reino Unido.
O setor dos serviços financeiros
freqüentemente é alardeado como fator chave na balança de pagamentos, ajudando a preencher
a brecha deixada pelo enfraquecimento do setor manufatureiro.
Na realidade, porém, essa contribuição é modesta. Em 2005, os ganhos no exterior com o fornecimento de serviços de seguros,
bancários e outros financeiros
chegaram a cerca de 21 bilhões de
libras (US$38 bilhões), apenas um
décimo dos ganhos obtidos com a
exportação de bens.
Deixando todos esses temores
de lado, a última década teve o
crescimento de produção menos
volátil de qualquer década desde
1950. Será que isso refuta o argumento segundo o qual a ascensão
do setor financeiro encerra a
ameaça de instabilidade econômica maior? Tal conclusão seria
demasiado complacente. As próprias condições econômicas estáveis incentivam a tomada de riscos maiores. A inovação financeira pode ter engrossado o elástico
financeiro, mas este vem sendo
esticado cada vez mais. Quem pode ter a certeza de que em algum
momento ele não vai se partir?
Andrew Glyn leciona economia na Universidade Oxford
Tradução de Clara Allain
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