São Paulo, domingo, 30 de abril de 2006

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ENERGIA

País começa a considerar seriamente o combustível como alternativa à gasolina, mas deve privilegiar produção local

Em busca de etanol, EUA olham para Brasil

LEILA SUWWAN
DE NOVA YORK

Quando a General Motors exibiu na semana passada seus novos carros flex-fuel nas ruas de Manhattan, boa parte das pessoas não devem ter entendido do que se tratava -não há na cidade de Nova York um posto que ofereça álcool combustível. No país "viciado em petróleo", palavras do presidente George W. Bush, muitos sequer ouviram falar do combustível E85, mistura de 85% etanol de milho e 15% gasolina.
Há cerca de 5 milhões de automóveis flex-fuel nos Estados Unidos, algo próximo a 2% da frota nacional. Em todo país, apenas 600 postos oferecem E85, boa parte em Illinois e Minnesotta. Mas, com o barril de petróleo flertando com a marca dos $75 e o galão da gasolina se aproximando dos $3, muitos estão levando mais a sério a meta lançada pelo governo de tornar o etanol americano competitivo e reduzir o consumo de gasolina em 30% até 2012.
Após o discurso de Bush sobre o estado da União em janeiro, muitos voltaram os olhos ao Brasil. "Os Estados Unidos são viciados em petróleo, que é geralmente importado de partes instáveis do mundo. A melhor forma de quebrar esse vício é por meio da tecnologia", afirmou Bush, apontando para combustíveis alternativos. Em seguida olhos se voltaram para a produção de etanol da cana de açúcar no Brasil e diversos editoriais questionaram a comparativa falta de vontade política dos EUA -sem comentar, porém, a tortuosa trajetória do programa de álcool iniciada nos anos 1970.
Na terça passada, Bush anunciou plano para conter a alta do petróleo e destacou a opção etanol. "O que é interessante e os americanos não percebem é que, com um pouco mais de gasto, nós podemos converter um automóvel regular em um chamado "flex fuel". E esse veículo "flex fuel" pode rodar com combustível feito 85% de etanol. Incrível, não?", disse. O que o presidente considera incrível é difícil de assimilar para a maioria dos americanos.
No setor automobilístico, a GM saiu na frente com o oferecimento dos FFVs (veículos flex fuel) com uma campanha nacional de popularização de um combustível praticamente desconhecido. Além da Ford, que também aumentou a produção, há carros flex-fuel da Daimler-Chrysler, Isuzu, Mazda, Mercedes, Mercury e Nissan.
Neste ano, a GM planeja fabricar 400 mil FFVs. Já a Ford, 250 mil, em cinco modelos. Ambas apóiam a opção flex-fuel com mote nacionalista: a redução da dependência externa de óleo.
No autoshow de Nova York na semana passada, a campanha da GM foi agressiva e se deparou com nova-iorquinos por hora surpresos, desconfiados ou frustrados com a proposta flex-fuel. Sob o lema "Pense verde, vá de amarelo", a GM exibiu o modelo GM Tahoe decorado como uma espiga de milho e um locutor rouco que explicava a proposta.

Produção interna
Segundo o representante da GM, o público se interessa pela proposta menos nociva ao ambiente e menos dependente do petróleo internacional, mas muitos sequer imaginavam que milho pudesse render um combustível.
Em dez minutos, foi necessário explicar três vezes aos curiosos que o tanque pode receber gasolina, etanol ou qualquer mistura dos dois. Um consumidor, Rene Richthofen, 60, olhava desconfiado: "Mas por que vou comprar um carro se o combustível não está disponível ainda?".
Partidários da popularização do etanol alardeiam a triplicação do número de bombas de etanol nos postos até o final do ano. Mas uma das grandes perguntas continua sendo a capacidade de suprir o mercado interno no formato atual. O etanol produzido hoje no país é insuficiente para abastecer a demanda atual.

Importação do Brasil
A possibilidade de aumentar as importações é desprezada. O programa americano é claro ao defender combustíveis alternativos produzidos no país.
As associações do setor rejeitam a hipótese de aumento da importação do álcool brasileiro ou a redução das tarifas impostas hoje.
"Primeiro, 7% do mercado interno de etanol (280 milhões de galões) podem ser importados sem impostos", disse Kristin Brekke, diretora da American Coalition for Ethanol.
"Segundo, relaxar a tarifa secundária seria subsidiar o etanol brasileiro, que já é pesadamente subsidiado. A tarifa serve para contra-balancear o crédito de 51 centavos por galão pago para quem realiza a mistura de etanol na gasolina", completou.
O Departamento de Energia do governo americano não quis comentar a possibilidade de remoção da barreira de 54 centavos por galão e afirmou que cabe ao Congresso qualquer modificação da regra, o que impactaria o incentivo oferecido à produção nacional.
Por enquanto, o governo financia a pesquisa de etanol e subsidia fabricantes e vendedores. A GM, por enquanto, oferece o flex-fuel sem custo adicional. Difícil saber se a moda vai pegar -um dos potenciais motoristas que visitava o estande no autoshow exemplifica a dificuldade: "O carro anda com óleo de oliva?!".


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