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entrevista
Alimento ficará caro por dez anos, diz especialista
DO ENVIADO ESPECIAL A BERNA
Mesmo com os esforços
para aumentar a produção e
o suprimento, os preços dos
alimentos devem continuar
altos por pelo menos dez
anos, segundo o sueco Lennart Bäge, presidente do Fida (Fundo Internacional para o Desenvolvimento Agrícola), agência da ONU criada
no fim dos anos 70 em resposta às crises alimentares
da década na África.
Na semana passada, o Fida
anunciou a concessão de
US$ 200 milhões a agricultores pobres. Para Bäge, a chave para uma solução de longo
prazo para a crise é dar condições aos países em desenvolvimento de recuperar a
capacidade de produção.
Em entrevista à Folha, ele
destacou as vantagens do álcool brasileiro sobre os biocombustíveis de grãos e disse que esta era uma crise anunciada.
(MN)
FOLHA - A crise vai ser longa?
LENNART BÄGE - É o que os especialistas dizem. Mesmo
que haja uma resposta em
termos de suprimento, se
olharmos todos os fatores,
como energia cara, mudanças climáticas, reservas em
baixa e demanda crescente,
tudo leva a crer que os preços
vão continuar altos, embora
devam cair um pouco. É impossível determinar, mas os
preços devem ficar altos por
até dez anos, talvez mais.
FOLHA - Qual o fator que teve
mais impacto na escalada de preços dos alimentos?
BÄGE - O abandono de investimento em agricultura e
as mudanças climáticas.
Quando a comida era barata
e abundante, havia problemas com a produção como
dumping e subsídios. Houve
negligência com o investimento de longo prazo na
agricultura, o que levou a
queda na produtividade dos
países em desenvolvimento.
A produtividade aumentava
de 3% a 4% ao ano para os
grãos básicos -hoje está entre 1% e 2%.
FOLHA - Que papel tiveram os
subsídios dos países ricos a seus
agricultores na queda de produtividade dos pobres?
BÄGE - Tiveram um sério
impacto. Subsídios nos países desenvolvidos significam
que muitos produtos entram
no mercado internacional e
achatam os preços, deixando
pouco incentivo para agricultores dos países em desenvolvimento.
FOLHA - E os biocombustíveis?
BÄGE - Temos que fazer dois
tipos de análise. Sobre a eficiência energética e o impacto na crise. Alguns biocombustíveis são muito eficientes e não competem diretamente com os alimentos. Os
especialistas dizem que o álcool brasileiro é muito mais
eficiente e tem muito menos
impacto na produção de alimentos que outros. Não devemos condenar os biocombustíveis de forma generalizada. Os feitos de grãos como
o milho geralmente são menos eficientes e competem
com os alimentos.
FOLHA - O diretor-geral da FAO,
Jacques Diouf, disse que esta era
uma crise anunciada. Por que a
ONU não agiu antes?
BÄGE - A ONU vem agindo.
A FAO e eu advertimos que
falta investimento em agricultura há muitos anos. Mas
só quando há uma crise clara
há reação política. O mais
importante é não apenas nos
concentrarmos na ajuda alimentar urgente mas investirmos em medidas de médio
e longo prazo, focar na recuperação da agricultura.
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