São Paulo, sexta-feira, 30 de maio de 2008

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

VINICIUS TORRES FREIRE

Fundo de quintal e outros fundos


Caso rocambolesco do fundo soberano dá pistas de que há fritura do ministro Mantega dentro do governo e do PT

NO FINAL da tarde de ontem, o fundo soberano do Ministério da Fazenda estava mais com a cara de um fundo doméstico, o que é uma contradição em termos, mas passemos. O fundo planejado pela Fazenda deveria usar dinheiro dos impostos arrecadados mas não gastos (superávit primário) a fim de adquirir dólares (ou mesmo emitir dívida pública a fim de financiar tal compra). Mas agora parece que o fundo não vai lidar com câmbio.
Ainda não deu para entender o que seria esse fundo soberano doméstico, por assim dizer. Será um "fundo fiscal", diziam parlamentares que falaram com o ministro Guido Mantega. O que vai ser feito com o dinheiro? Não deu para entender se vai para o fundo do quintal ou do Tesouro, para recompra e abatimento de dívida. Mas, se o dinheiro servir para abater dívida, acaba o fundo. Está difícil de entender.
Mas essa história toda dá a entender que decisões da Fazenda são agora explicitamente submetidas a um colegiado supraministerial, gente de fora e de dentro do governo. Em português mais claro, tem muita gente dando palpite decisivo na Fazenda. Inclusive gente que frita o ministro Guido Mantega. E a fritura não vem do Banco Central.

Fundinho do pocinho
O crescimento americano no primeiro trimestre foi revisado para cima, de 0,6% para 0,9% (isto é, a continuar nesse ritmo, o PIB dos EUA cresce 0,9% neste ano). Mas a economia se estagnou, descontada a contribuição do "setor externo" (exportações de bens e serviços menos importações). A demanda doméstica foi revisada para baixo, as exportações líquidas, para cima.
Ou seja, a economia ficou no azul graças ao dólar fraco e à resistência da economia do resto do mundo, "emergentes" em particular. O semestre de setembro de 2007 a março de 2008 registrou o pior resultado desde a recessãozica de 2001. Ainda assim, melhor do que o esperado em janeiro -melhor para os EUA e o mundo. Mas bancões ainda acham que no segundo trimestre o PIB entrou no vermelho.

Fundo dos cafundós
O CMN (Conselho Monetário Nacional) decidiu ontem que correspondentes bancários poderão receber dinheiro do exterior -e também fazer remessas. Correspondente bancário é, digamos, uma espécie de guichê de um banco "de verdade" em uma empresa de varejo, que presta alguns serviços bancários em geral a pessoas de renda pequena e/ou em lugares remotos. Isto é, varejistas em geral, casas de câmbio e agências de turismo poderão receber e enviar dólares. A decisão do CMN autoriza operações miúdas, de até US$ 3.000 por vez. Isso facilita, por exemplo, a vida de brasileiros que ganham o pão no exterior e mandam um dinheiro para casa. É utilidade pública.
Mas a medida tem toda a cara de que vai oferecer uma oportunidade de negócios para trambiqueiros cambiais. É mais difícil fiscalizar uma rede capilar e miúda (talvez não tão difícil como fiscalizar agentes de bancões que vez e outra a Polícia Federal prende em bairros ricos de São Paulo, mas vá lá). Mas já dá para suspeitar de um laranjal cambial pelos cafundós do país.

vinit@uol.com.br


Texto Anterior: Agências de classificação não poderão ajudar a elaborar títulos que irão avaliar
Próximo Texto: País colhe o que o povo plantou, diz Lula
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.