São Paulo, quinta-feira, 30 de junho de 2005

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INFRA-ESTRUTURA

Banco oficial faz exigências à companhia, mas na prática poderá se tornar sócio com 30% de participação

BNDES acerta socorro de R$ 727 mi à Light

JANAINA LAGE
DA FOLHA ONLINE, NO RIO

PEDRO SOARES
DA SUCURSAL DO RIO

A Light obteve ontem um financiamento de R$ 727 milhões com o BNDES no apagar das luzes do programa de capitalização das distribuidoras de energia elétrica, criado em 2003. O BNDES, por sua vez, exigiu um esforço mais rigoroso da companhia para liberar recursos no âmbito do programa, que se encerra hoje.
Na prática, o banco poderá se tornar sócio da distribuidora com uma participação de até 30% do capital. O BNDES vai subscrever debêntures conversíveis em ações no valor do financiamento.
O prazo de pagamento do empréstimo é de dez anos, com quatro anos de carência. A remuneração do banco ficou em TJLP (Taxa de Juros de Longo Prazo), atualmente em 9,75%, mais 4% ao ano, com a condição de que a companhia liste suas ações no Novo Mercado em até 42 meses. Se não fizer isso, o juro sobe para TJLP mais 12% ao ano.
O banco estabeleceu dois critérios para se tornar acionista: a recuperação das perdas operacionais e o aporte de capital. A cada R$ 1 que a EDF, controladora da Light, injetar na companhia serão convertidos R$ 2 em debêntures. Cada redução de um ponto percentual no índice de perdas operacionais (prejuízos com furto de energia) resultará na conversão de 15% das debêntures, o equivalente a cerca de R$ 100 milhões.
Atualmente, o índice de perdas é de 24%, e a Light quer baixá-lo em um ponto percentual a cada ano. Ontem, a EDF aprovou em assembléia de acionistas a conversão da dívida de US$ 400 milhões em capital da Light.
Segundo o acordo, o BNDES pode converter até 100% das debêntures, se avaliar a hipótese como vantajosa. No caso, passaria a deter cerca de 30% do capital. Se a empresa não melhorar suas práticas, o BNDES pode não converter as debêntures.
O banco também poderá intervir indiretamente caso a EDF resolva vender a Light. Se o comprador não estiver de acordo com as cláusulas previstas no contrato, o banco pode pedir o vencimento antecipado das debêntures.
O diretor financeiro da Light, Paulo Roberto Ribeiro Pinto, afirmou que a empresa buscará, no futuro, uma nova injeção de capital, que poderá vir de um novo sócio ou mesmo da EDF.
Segundo o diretor da área financeira do BNDES, Carlos Kawall, o banco procurou se cercar de garantias para participar de uma operação que envolve riscos. A princípio, as debêntures funcionarão como uma aplicação de renda fixa, com remuneração de TJLP mais 4% ao ano, independentemente da performance da empresa. As garantias são os recebíveis da companhia.
Para participar do programa, a Light negociou com bancos privados débitos no valor de R$ 1,7 bilhão, o acionista controlador (a EDF) converteu créditos em renda fixa em participação acionária de R$ 1,1 bilhão e o BNDES entrou com R$ 727 milhões, diz Kawall.
Parte dos recursos do BNDES irá para o caixa da empresa a fim de garantir boa operação e investimentos, mas uma parcela de R$ 350 milhões será destinada ao pagamento de uma dívida da Light com a Eletrobrás.
O desembolso será feito assim que os contratos com os credores forem assinados e que a EDF realize a conversão de um empréstimo à Light de R$ 400 milhões em capital. A previsão da Light é receber o dinheiro em dez dias.

Programa de capitalização
Inicialmente, o banco previa aplicar até R$ 3 bilhões em distribuidoras com o programa, mas o caixa das empresas melhorou e muitas delas desistiram do empréstimo, como Coelba, Celpe e Cosern.
Indagado se com as novas exigências feitas à Light o empréstimo poderia ser ainda considerado como parte do programa, o vice-presidente do BNDES, Demian Fiocca, afirmou que "a operação é muito próxima" do que a linha original previa. "O objeto de reestruturação financeira faz parte do programa, as condições centrais são as mesmas e o valor do empréstimo foi calculado de acordo com o programa", afirmou.
Entre as mudanças, o BNDES estabeleceu que não há mais limite para a conversão das debêntures em ações -antes, era de 50% do valor do financiamento.

Clareza
A decisão do BNDES de financiar a Light por meio de uma sociedade não foi o único socorro do tipo feito pelo banco. Em maio, ele se comprometeu a injetar R$ 1,14 bilhão na Brasil Ferrovias em troca de 49% das ações da empresa. O BNDES também é dono de 49% da Eletropaulo.
"É preciso rediscutir os padrões de financiamento do BNDES. O banco precisa informar com clareza quais são as suas prioridades, ou sempre vai ficar parecendo que é um hospital para socorrer empresas falidas e o setor privado", disse Fernando Sarti, da Universidade de Campinas.
Para o professor, em boa medida as ações do BNDES são resultado de privatizações desastradas ocorridas na década de 90. "Mas isso não justifica tudo. Não vejo nenhuma intervenção preventiva. É como se o governo se restringisse a administrar o caos", disse.


Colaborou Janaína Leite, da Reportagem Local


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