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JOSÉ ALEXANDRE SCHEINKMAN
O financiamento da universidade pública
O diplomado de uma faculdade pública poderia
pagar depois de formado parte
do custo da sua educação
O NÚMERO de universitários no
Brasil tem aumentado rapidamente, o que é uma boa
notícia. O setor privado tem sido responsável por grande parte dessa expansão, e hoje mais de 70% dos alunos de curso superior estudam em
escolas particulares, um índice semelhante ao do Chile e ainda inferior ao da Coréia ou do Japão, mas
entre os mais altos do mundo.
Apesar de terem uma participação
decrescente no ensino superior, as
universidades públicas ainda têm
um papel importante. Algumas das
melhores universidades no Brasil
são públicas, e os estabelecimentos
federais e estaduais têm um papel
dominante na condução da pesquisa
no país. Em todo o mundo, os governos subsidiam a educação universitária, e o Brasil não deve ser uma exceção.
O problema no nosso país é o nível
de subsídio existente e quem são os
beneficiados. O país gasta com cada
aluno do curso superior 11 vezes o
que gasta com um aluno do ensino
secundário. Esses dados não são
sempre exatamente comparáveis
entre países, mas é notável que no
Chile essa proporção seja de três para um e que a Coréia gaste com um
estudante do ensino superior praticamente a mesma quantia que gasta
em um aluno do curso secundário.
No Brasil, a maioria dos alunos nas
universidades públicas, principalmente nas faculdades que levam às
carreiras mais prestigiosas, provém
de famílias relativamente abastadas.
Uma manifestação desse fenômeno
é a alta fração de alunos nos melhores cursos de medicina que estudaram em escolas secundárias particulares. Mas mesmo aqueles que vieram de meios mais modestos ganham muito ao freqüentar a faculdade. Cada ano adicional de educação
superior aumenta o salário, na média, em 20%. Ainda que se leve em
conta que o estudante de faculdade
começa em geral a trabalhar mais
tarde, investir em educação superior
tem uma excelente taxa de retorno.
É verdade que alguns alunos não
têm recursos para pagar uma anuidade adequada, mas o diplomado de
uma faculdade pública poderia pagar depois de formado uma parte
dos custos da sua educação.
É certo que há casos em que um
ex-aluno ganha pouco. Mas isso pode ser resolvido fazendo do pagamento uma função da renda do diplomado. A Austrália, país que tem
adotado políticas inovadoras no setor público, faz exatamente isso.
Um aluno de faculdade pública na
Austrália é responsável por uma
anuidade que varia de acordo com o
curso. A mais baixa, 3.847 dólares
australianos (um dólar australiano
vale US$ 0,75), é para cursos que o
governo determinou como prioritários e que levam a carreiras pouco lucrativas, como a enfermagem. Estudantes de medicina pagam mais de o
dobro.
O aluno pode pagar a anuidade à
vista com desconto ou tomar um
empréstimo. Após a formatura, a
amortização é feita com o Imposto
de Renda. A cada ano, o ex-aluno deve amortizar uma porção da dívida
que equivale a uma proporção progressiva do seu rendimento. Se a
renda anual é inferior a 38.147 dólares australianos, nada é devido. Mas
da porção de renda que exceder
70.847 dólares o ex-aluno deve dedicar 8% para amortizar a sua dívida.
Um profissional que ganhe bem liquida a dívida em pouco tempo. Um
outro que ganhe menos demora
mais. Como não incidem juros sobre
a dívida, que é apenas corrigida pelo
índice de preços ao consumidor, é
mais vantajoso pagar mais devagar,
e, portanto, o ex-aluno que tiver menor renda receberá um subsídio
maior.
O programa funciona desde o final
da década de 80 e todos os pagamentos são usados para financiar as universidades públicas. Hoje, essa fonte
representa 16% do orçamento das
universidades públicas e é equivalente a 40% das contribuições do governo central. Quando foi proposto,
muitos temiam que os custos administrativos fossem excessivos, mas
na realidade totalizam menos de 3%
dos pagamentos anuais.
O Brasil precisa encontrar novas
fontes de financiamento para expandir e melhorar a educação em todos os níveis. Os alunos dos estabelecimentos de ensino superior privados já custeiam os seus estudos.
Os que se beneficiam da universidade pública devem começar a contribuir.
JOSÉ ALEXANDRE SCHEINKMAN , 58, professor de economia na Universidade Princeton (EUA), escreve quinzenalmente aos domingos nesta coluna.
@ - jose.scheinkman gmail.com
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