São Paulo, sexta-feira, 30 de agosto de 2002

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LUÍS NASSIF

Os desafios para o segundo turno

Especialista consistente, o analista político Rubens Figueiredo evita as simplificações e as conclusões taxativas sobre as pesquisas que, em geral, têm marcado a análise diária do tema. Concentrando-se na grande disputa do momento -para saber quem irá para o segundo turno com Lula-, a análise de Figueiredo mostra um jogo de xadrez complexo.
Ao contrário da eleição de Fernando Collor, as avaliações sobre o governo Fernando Henrique Cardoso não são tão negativas quanto do governo Sarney. Hoje há um contingente apreciável de eleitores considerando o governo ótimo ou bom, ou simplesmente razoável. Portanto ao mesmo tempo em que se quer mudanças -como em toda eleição-, também há um sentimento de não se provocar uma ruptura nos avanços obtidos nos últimos anos.
Até há pouco, Ciro Gomes sintetizava a bandeira da mudança com continuidade, por conta de sua presumível experiência como administrador, governador e ministro e membro do governo no início do Real.
Essa imagem foi abalada com o início do horário eleitoral, com a revelação de inconsistências nas declarações e explosões de temperamento que foram bem exploradas pelos adversários.
O desafio de Ciro consiste em responder aos ataques sem parecer destemperado. Não poderá ser muito passivo, para não se chocar com a imagem que já criou; nem explosivo, para não reforçar as críticas. Por outro lado, na medida em que Fernando Henrique Cardoso caia de cabeça na campanha de Serra, Ciro terá dificuldades em se apresentar como o candidato da consolidação do Real. Terá que aprofundar as críticas contra o governo, mas sem que passe a impressão de que provocará instabilidade no modelo econômico.
Trata-se de um trabalho de engenharia fina, que exigirá sensibilidade para avaliar o meio-termo adequado, e disciplina do candidato para se ater ao roteiro definido. E, aí, a frente ampla da candidatura Ciro não ajuda. De um lado, tem-se a banda pefelista de ACM e Jorge Bornhausen querendo que a campanha radicalize as críticas contra o governo. De outro, o lado de Tasso Jereissati, preocupado em não provocar um afastamento definitivo do PSDB, pois sua influência em um futuro governo Ciro dependerá da base peessedebista que conseguir atrair. Há um terceiro grupo, do senador Roberto Freire, recomendando uma postura light ao candidato. E a ex-tropa de choque de Collor, como Roberto Jefferson, ameaçando sair na porrada. Finalmente, tem-se uma equipe de marketing político sem a experiência de seus adversários e membros da família ocupando postos estratégicos na campanha.
Até agora, Ciro cresceu confiando exclusivamente na sua intuição política. Essa improvisação impediu a consolidação de um discurso mais consistente. Agora, Ciro sentiu que a intuição apenas não será suficiente para prosseguir a caminhada, mas a decisão correta terá que ser tomada em pleno burburinho da campanha, com entrevistas, comícios, pressão dos repórteres atrapalhando a concentração e a análise isenta.
Por seu lado, Serra terá o desafio de conciliar a imagem de consolidador do Real com a de crítico das mazelas da política econômica na gestão FHC. No debate da Bandeirantes, o tucano ainda não tinha conseguido encontrar a embocadura correta. Mas o impasse surgiu bem no início da campanha, dando tempo para aprimorar o discurso e consertar os desacertos iniciais de campanha.
Seja qual for o resultado, o fato é que a ampla cobertura dada pela mídia torna essas eleições um fato inédito na vida política do país. Há seis meses, os candidatos eram muito diferentes do que há três meses e do que são hoje em dia. Inconsistências foram exploradas, retóricas foram amainadas e parte-se para um desfecho eleitoral que, em que pese o natural esquentamento da disputa na reta final, tem tudo para ter um final civilizado.

E-mail - lnassif@uol.com.br


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