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OPINIÃO ECONÔMICA
Se Getúlio Vargas soubesse...
BENJAMIN STEINBRUCH
Dias atrás li uma informação impressionante. Nos
anos 1990, em cada dez postos de
trabalho criados no Brasil, apenas um foi com carteira assinada.
Nas quatro décadas anteriores, a
realidade era muito diferente: em
cada dez novos postos, sete tinham registro em carteira.
Reina no mercado de trabalho
do país, insuflado pela crise econômica, o mais assustador salve-se-quem-puder em matéria de relações entre empregador e empregado. A velha CLT (Consolidação
das Leis do Trabalho), baixada
por decreto-lei de Getúlio Vargas
em 1º de janeiro de 1943 e ainda
em vigor, foi virtualmente revogada pelo mercado.
Empresas de todos os tamanhos, principalmente as pequenas, transformam postos assalariados, aos milhares, em contratos de pessoas jurídicas, os famosos PJ. Na prática, os empregados
continuam fazendo o mesmo trabalho, nos mesmos lugares e cumprindo os mesmos horários, mas
sem nenhum vínculo empregatício. Apenas apresentam, no fim
de cada mês, uma nota fiscal de
pessoa jurídica.
Tirando as grandes empresas
organizadas, é difícil encontrar
alguma que tenha a coragem de
atirar a primeira pedra nas que
adotam esse sistema aos olhos da
velha CLT. A abertura econômica
exige das empresas um tal grau
de competitividade que as obriga
a reduzir a estrutura e a enxugar
custos incessantemente. A contratação formal de mão-de-obra impõe custos elevadíssimos, que superam 100% do valor do salário
em muitos casos. Por isso, muitas
empresas têm medo de contratar
e pagam qualquer multa para demitir.
Essa situação a que são levadas
as empresas, uma verdadeira balbúrdia, reflete-se na Justiça do
Trabalho. Mais de 3 milhões de
ações trabalhistas ingressam na
Justiça anualmente e entopem os
tribunais. Algumas causas levam
até dez anos para serem decididas. Para o trabalhador, é um desastre, porque tem de esperar longos anos para receber aquilo a
que têm direito. Para o empregador, é uma agonia, porque precisa
arrastar durante todo esse tempo
a contabilização de passivos trabalhistas sem ter uma idéia razoável sobre o montante final da
ação.
Esse é o cenário no qual começa
a ser discutida no país a terceira
reforma do governo Lula, a trabalhista, que poderá ir ao Congresso em outubro. Não se deve
ter a ilusão de que a reforma trabalhista poderá criar empregos
em massa. A abertura de postos
de trabalho só ocorrerá com o
crescimento da economia. Mas a
reestruturação poderá, certamente, facilitar e estimular a volta da
formalização do trabalho, em decorrência da simplificação da legislação e da redução do custo da
contratação de mão-de-obra.
Felizmente, a reforma das leis
do trabalho será conduzida por
um governo de origem trabalhista. Dificilmente qualquer outro
teria condição de mexer nesse
amontoado de leis sem enfrentar
resistências intransponíveis da
classe trabalhadora, como já se
deu no passado.
O segredo dessa reforma, mais
até do que das duas anteriores, será a participação das várias partes envolvidas para a criação das
novas regras. Ninguém tem a fórmula mágica, mas obviamente a
virtude está no meio-termo. Não
se pode desregulamentar totalmente o mercado, porque isso
criaria uma confusão incontrolável nas relações do trabalho, em
prejuízo da parte mais fraca. Mas
também não se pode manter o
atual estado de engessamento legal, que empurra de maneira
cruel mais de 40 milhões de trabalhadores para a informalidade.
Benjamin Steinbruch, 50, empresário,
é presidente do conselho de administração da Companhia Siderúrgica Nacional.
E-mail - bvictoria@psi.com.br
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