São Paulo, terça-feira, 30 de setembro de 2008

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Base governista se revolta, e pacote cai

228 deputados votam "não" ao pacote, 95 democratas e 133 republicanos; Fed dobra para US$ 620 bi dinheiro para BCs

Bush se diz "frustrado", e democratas e republicanos culpam uns aos outros; expectativa é que plano seja discutido amanhã no Senado


SÉRGIO DÁVILA
DE WASHINGTON

"Não."
Por 228 votos com essa opção, ante 205 que votaram "sim" e um que não votou, a Câmara dos Representantes (deputados) dos EUA rejeitou pacote proposto pelo governo Bush que prevê a maior operação-resgate do mercado financeiro da história do país, com socorro de até US$ 700 bilhões.
A decisão jogou mercados do mundo inteiro para baixo, num dia dramático, em que as Bolsas caíam a cada "não" que era computado no Capitólio.
O índice industrial Dow Jones teve a pior queda em pontos de sua história em um dia, com perda de 777,68 pontos. O Federal Reserve, o BC dos EUA, anunciou que estava dobrando o volume de dinheiro disponível para nove BCs -de Europa, Austrália, Canadá e Japão- para US$ 620 bilhões e triplicando o destinado a empréstimos de curto prazo para instituições financeiras, para US$ 225 bilhões, numa tentativa de destravar o mercado de crédito.
A rejeição partiu principalmente da base governista, o que surpreendeu o republicano George W. Bush, que se disse "desapontado". Sua equipe econômica defende que o pacote é necessário para livrar o país de uma recessão profunda e havia cedido a exigências de ambos os lados, que levaram uma proposta original de 2,5 páginas que previa poderes irrestritos ao secretário do Tesouro crescer para uma medida de 100 páginas com várias salvaguardas e itens como limitação de ganhos de executivos.
Surpresos também ficaram os líderes do Partido Democrata, maioria no Congresso, que haviam anunciado no fim da tarde de domingo que chegaram a um acordo quanto ao plano. Dos 435 votos da Câmara, 140 democratas e 65 republicanos votaram a favor do plano, ante respectivamente 95 e 133 que votaram contra. Eram necessários 218 para a aprovação.
A resistência veio de um paradoxo. Republicanos conservadores temiam que o voto a favor da maior intervenção governamental da história dos EUA os deixaria mal com seus eleitores -uma nova Câmara e um terço do Senado são escolhidos no dia 4 de novembro.
Já democratas progressistas receavam alienar seus eleitores ao autorizar o que muitos analistas chamam de um pacote que só beneficia a Wall Street.
"O governo passou meses dizendo que os fundamentos da economia estavam sólidos e de repente apareceu com um pacote que pede 5% do PIB em dinheiro, a ser entregue num saco marrom, em notas pequenas", disse à Folha Simon Johnson, ex-economista-chefe do FMI, hoje no MIT. "Os políticos se revoltaram com isso."
Até a conclusão desta edição, ainda não estava claro quando a medida voltaria a votação e se seria a mesma ou sofreria modificações. Lideranças falavam em discussões amanhã, no Senado, e nova tentativa na quinta, na Câmara, que entrou em recesso pelo Ano Novo judaico. Se aprovada na Câmara, tem ainda de passar pelo Senado.
Tão logo o resultado se revelou, democratas e republicanos passaram a culpar uns aos outros. Ao final do dia, no entanto, parecia haver novo consenso entre as lideranças de que era preciso voltar a votar o quanto antes.
"Estou desapontado com a votação do plano de resgate econômico no Congresso", disse Bush. "Fizemos um plano que era grande porque nós temos um problema grande. Vou falar com minha equipe econômica e trabalhar com líderes do Congresso para ir adiante. Nossa estratégia continua sendo lidar com essa situação econômica. E vamos trabalhar para desenvolver uma estratégia que nos permita ir adiante."
Na seqüência, o secretário do Tesouro, Henry Paulson, disse que os instrumentos à disposição do governo "eram significativamente insuficientes" e repetiu várias vezes que era preciso "fazer algo" e "rápido". Mesmo tom adotou a presidente do Congresso, Nancy Pelosi. "A medida fracassou, mas a crise não passou", disse. "Temos de continuar a trabalhar de forma bipartidária."
Os dois candidatos à sucessão de Bush também se manifestaram. O democrata Barack Obama disse que era importante "que o público americano e os mercados mantenham a calma" e que uma de suas mensagens para o Congresso era: "Resolvam isso, democratas e republicanos". Já a campanha do republicano John McCain, que havia passada a manhã reivindicando a autoria do acordo do pacote de domingo para seu candidato, foi obrigada a recuar depois do fracasso da votação.


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