São Paulo, sexta-feira, 30 de outubro de 2009

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VINICIUS TORRES FREIRE

O PIB estatal dos Estados Unidos


Economia americana ainda produz no nível de 2007, mas se recupera com gasto público e crédito estatizado

ATÉ O dia 1º dezembro, os americanos que não foram proprietários de imóveis nos últimos três anos poderão comprar a casa própria com 10% de desconto, cortesia paga pelo governo (o desconto máximo é de US$ 8.000, ou cerca de R$ 13.800). Já foi beneficiado cerca de 1,4 milhão de contribuintes, com gasto de uns US$ 9 bilhões, segundo dados da Receita Federal americana; o programa tem caixa de US$ 13,6 bilhões. A taxa de juros do financiamento do imóvel, por 30 anos, é menor que 5% anuais, morramos de inveja. A taxa é baixa porque, entre outros motivos, o governo refinancia a dívida, grosso modo. Isto é, o governo compra títulos lastreados no pagamento de prestações imobiliárias; em suma, refinancia dívidas e oferece crédito para um mercado que ficou seco depois do colapso do crédito imobiliário.
Na verdade, nem é o governo que refinancia a casa própria. No fim das contas, é o banco central dos Estados Unidos, o Fed, que pretende aplicar até US$ 1,25 trilhão no mercado de crédito imobiliário, programa que vai até março de 2010 (já comprou quase US$ 900 bilhões em créditos imobiliários). US$ 1,25 trilhão equivale a mais ou menos 90% do PIB brasileiro. O Fed se tornou o grande banco comercial americano, chegando mesmo "a descontar duplicatas", na expressão colorida de Maria da Conceição Tavares.
Mas o crédito bancário privado ainda encolhe. O desemprego continua a crescer. Deve chegar a 10% em dezembro. Era de 7,6% em janeiro, quando Barack Obama tomou posse. Parece que foi na década passada.
E nós com isso? As observações vêm a propósito do "fim da recessão" nos Estados Unidos, que cresceram ao ritmo anualizado de 3,5% no terceiro trimestre de 2009.
Melhor crescer do que encolher, decerto. Em junho, a economia encolhera 3,8% em relação ao mesmo mês do ano anterior (isto é, em relação ao segundo trimestre de 2008), uma recessão horrível. Agora, o terceiro trimestre de 2009 foi 2,3% menor que o de 2008 (quando o crescimento sobre 2007 havia sido zero).
Acabou a crise? Quase todo comentarista econômico americano razoável observa, aliviado, que o resultado divulgado ontem foi bom, mas emenda, logo a seguir, um "mas". O que será da economia quando acabarem os estímulos estatais? Programas como o do desconto na compra da casa própria estão acabando. O da compra de carros subsidiada pelo governo acabou em agosto (o governo dava uns US$ 4.500 para quem trocasse sua lata velha por um carro novo e "eficiente" em termos de energia). Cerca de 47% do crescimento do PIB do trimestre deveu-se ao setor automobilístico.
Estímulos fiscais (gastos do governo) decerto não evaporam da economia assim que são encerrados. Continuam a incrementar o produto, com efeito cadente. Alguns dos melhores analistas econômicos americanos acreditam que o vácuo será sentido no primeiro trimestre de 2010. Mas se trata apenas de um chute informado. É muito difícil saber o que será do investimento ("na produção"). Na dúvida, o lobby nos Estados Unidos pela prorrogação dos subsídios ao consumo é tão forte quanto o lobby do imposto menor para tanquinho & linha branca e outros do gênero, no Brasil.

vinit@uol.com.br


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